[ANPPOM-Lista] RES: Posição de docentes quanto às politicas de cotas

jamannis em uol.com.br jamannis em uol.com.br
Sex Dez 28 12:00:23 BRST 2012


Caro Alexandre,

 

Você expôs um claro exemplo de como está empurrando um veículo encalhado com
o freio de mão acionado.

 

Se o condutor pudesse, de sua cabine (refrigerada), pelo menos soltar o
freio de mão, aqueles que estão sob o sol e com os pés no chão, teriam mais
eficiência para seu esforço.

 

Mannis

 

 

De: Ale Fenerich [mailto:fenerich em gmail.com] 
Enviada em: quinta-feira, 27 de dezembro de 2012 12:49
Para: jamannis em uol.com.br
Cc: ANPPOM
Assunto: Re: [ANPPOM-Lista] Posição de docentes quanto às politicas de cotas

 

Caro Mannis e demais colegas,


Gostaria de expor minha pobre análise a este respeito de modo bem direto,
sem a elegância de sua mensagem mas de forma explícita.

No trabalho que temos desenvolvido na Federal de Juiz de Fora, o sistema de
cotas traz desafios muito grandes para os docentes. De fato temos classes
cujos alunos possuem diversos níveis de maturidade musical. Isso faz com que
tenhamos que elaborar estratégias diversas para tentar sanar essa
desigualdade, muitas vezes profunda. Há alunos, por exemplo, com
dificuldades imensas em assuntos muito básicos, da educação fundamental.
Como professores de música, nossa obrigação é tentar contornar estes
problemas, e nem sempre é fácil, pois estas lacunas se refletem no modo como
aprendem.

Entretanto, em comparação com a minha própria formação, realizada na Unicamp
nos anos 90, temos hoje uma estrutura social mais horizontal, na qual há
menos competição entre os alunos e mais colaboração entre eles,
principalmente entre os cotistas. Há também uma distância entre os alunos
"profissionais" de música e aqueles que tiveram menos recursos de formação,
a qual temos que tentar equilibrar. Esta distância passa por uma arrogância
de alguns alunos mais maduros musicalmente (e talvez menos maduros enquanto
cidadãos), os quais desprezam os demais e, consequentemente, acabam por
desprezar o curso e os esforços de aprendizado geral. 

Enfim, são notas sobre um panorama geral, nas quais observo mais valores
positivos que negativos. São o preço de uma democratização do ensino
superior realizada talvez de forma um pouco canhesca no Brasil, mas que
talvez tenha resultados positivos em 10, 15 anos. Assim espero.

Colegas de federais, alguma opinião a respeito?

Um abraço!

 

Em 26 de dezembro de 2012 15:26, <jamannis em uol.com.br> escreveu:

 

 

O editorial desta data (26/12/2012) OESP, especificamente “Cotas nas
universidades paulistas”, cita posição de colegiados e de ‘vários docentes’
das universidades estaduais paulistas de uma maneira que me causou
estranhamento.  

 

Cito excerto: “.../ Historicamente, os órgãos colegiados da USP, Unicamp e
Unesp sempre foram contrários à adoção de políticas de cotas nos
vestibulares, alegando que elas distorcem os resultados dos exames,
comprometem o princípio de mérito e colocam em salas de aula alunos
despreparados.  Vários docentes receberam com reservas esse programa de
inclusão social. Serão decisivas as reuniões das congregações das faculdades
mais importantes, como as de Medicina, Direito e Engenharia. /...”

 

Sou membro de vários colegiados em minha universidade, em vários niveis, e
tenho claro em minha memória que em todas as oportunidades em que ocorreu a
discussão a respeito de cotas para ingresso na universidade, o principal
motivo de questionamento era o de estar implementando um procedimento para
remediar um problema sem sanar sua causa. ‘Colocar alunos despreparados em
salas de aula’ é uma das consequências disso, mas não algo a ser observado e
tratado em si e de forma restrita, senão visto num contexto amplo diante de
uma situação complexa. 

 

‘Comprometer o princípio de mérito’ e ‘distorcer os resultados do exame de
vestibular’ são alegações que podem até ter ocorrido, mas são irrelevantes
em relação ao eixo de pensamento, uma vez que o cerne da questão, sempre bem
aceito por todos, era ‘buscar uma solução para combater uma desigualdade e
uma injustiça’. 

 

Em todos os debates foi unânime a aprovação de que uma educação fortalecida
pela revitalização das escolas públicas nos níveis fundamental e médio teria
um impacto marcante e decisivo sobre essa exclusão que se busca combater.
Sempre perguntamos onde está o compromisso do estado (em nível federal,
estadual e municipal) que deveria cumprir as metas estabelecidas quanto ao
percentual orçamentário dedicado à educação. Se fossem de fato cumpridos, de
forma responsável e eficiente, a desigualdade não estaria na situação em que
se encontra atualmente.

 

O que os colegiados e os membros da comunidade acadêmica desejam, não é que
a prova seletiva que elaboram seja aplicada exibindo sua elegância e a
consistência de seus métodos. O que zelamos sempre em nosso método de
trabalho é que antes de adotar e aplicar um procedimento, este deve ser
suficiente e consistentemente testado e validado. Em políticas públicas esse
rigor seria uma prevenção para que, com o tempo, grandes soluções anunciadas
com alarde não se revelem ineficientes, senão inócuas.

 

Se temos alunos na sala de aula com dois níveis de preparação distintos,
isso poderia até ser trabalhado. Temos condições e potencial criativo para
encontrar soluções. Mas não queremos sair precipitadamente empurrando o
caminhão, antes de ter certeza de que o motor dele de fato não pode
funcionar, ou que pelo menos o freio de mão seja solto. Queremos que, antes
disso, as obrigações do estado (Federação, Estado e Município) sejam
cumpridas. No costume dos índios, o cacique era o primeiro a se levantar e a
realizar a tarefa árdua que ninguém queria fazer. Depois dele, todos se
erguiam e se punham a trabalhar.  

 

Por outro lado, como docente e pesquisador, nunca ousaria dizer que uma área
do conhecimento pudesse ser mais importante do que outra. Simplesmente
porque o universo, com sua estrutura e seus fenômenos, segue seu curso
normal, independentemente da taxonomia que os homens inventaram para vê- lo,
entendê-lo e explicá-lo, da mesma forma como aves, mamíferos, anfíbios,
insetos, plantas e demais formas de vida seguem vivendo, se reproduzindo e
evoluindo à revelia das frequentes e rápidas variações das classificações
que lhes aplicam. 

 

José Augusto Mannis (docente Instituto de Artes, Depto. de Música, Unicamp)

 

 

 

 

 

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