[ANPPOM-Lista] prêmio funarte de composição clássica (sic) 2016: finalistas

Camila Zerbinatti camiladuze em gmail.com
Qua Nov 9 10:39:27 BRST 2016


Cara Eliana,

Pois é, e não é a primeira vez. O que é chocante é que isto siga
acontecendo em pleno século XXI, em plenos 2016/2017, na véspera da já
terceira década deste século, depois de tantas e históricas transformações
sociais com relação à (in)equidade de gêneros, inclusive nas artes e
inclusive no(s) mundo(s) da(s) música(s). Há um escandaloso e inegável
~~descompasso~~ (e cujas consequências estão muuuuuito longe de serem
interessantes, relevantes, éticos, inovadores, transformadores ou sequer
inteligentes do ponto de vista da diversidade e da representatividade) não
apenas nos resultados deste tipo de seleção, mas, também, ou muito mais,
nas lógicas e sistemas dominantes que estão por trás dos resultados,
objetiva ou subjetivamente, consciente ou inconscientemente, perpetuando-se
e perpetuando-se *ad infinitum, *em uma estagnação quase sintomática e
quase patológica, ao mesmo tempo, como aliás, em geral, funcionam,
calculadamente, os sistemas de opressão, exclusão e dominação.


Olhando ao redor, neste mesmo ano de 2016, choca ver que, por exemplo,
no(s) mundo(s) da(s) Arte(s) no nosso próprio *Brasil,* aqui no* Sul *do
mundo:

- *a Flip (Festa Literária de Paraty) 2016* teve presença significativa de
mulheres escritoras em sua programação, após anos de crescimento
quantitativo da presença de mulheres no evento, aliás, num objetivo clara e
declaradamente sustentado pela organização do evento:
http://brasil.elpais.com/brasil/2016/05/03/cultura/1462242705_287264.html ;
embora a vergonhosa ausência de mulheres negras da programação oficial
tenha sido obviamente questionada:
http://blogueirasnegras.org/2016/07/01/na-flip-das-mulheres-tambem-nao-fomos-convidadas/


*- na 24a Bienal Internacional do Livro em São Paulo*, no segundo semestre
de 2016, também se preocupou com a representatividade e protagonismos das
mulheres escritoras em sua programação, promovendo não só os trabalhos
destas artistas mas também importantes debates sobre as condições das
mulheres escritoras:
http://brasileiros.com.br/2016/08/o-protagonismo-da-mulher-na-bienal-livro/


*- na 32a Bienal de São Paulo,* outro gigante e importantíssimo evento
artístico no Brasil, as mulheres não só foram representadas em maioria
dentre os/as artistas selecionados/as como esta foi inclusive uma
preocupação proposital da organização da própria Bienal, antenada não só
com o tempo, com o contexto social e histórico mas também com séculos (ou
milênios) de invisibilização das mulheres nas Artes: *"A organização diz
que a presença feminina – 47 nomes ao todo – é proposital. (...) Em
entrevista ao "Bom Dia São Paulo", o curador da mostra, o alemão Jochen
Volz, afirmou: "Artistas homens são muito mais representados do que
artistas mulheres."*
http://g1.globo.com/pop-arte/noticia/2016/09/32-bienal-de-sp-abre-nesta-quarta-mulheres-sao-maioria-dos-artistas.html


E, nesta pequena mas representativa lista, estamos falando apenas de
grandes e reconhecidos eventos das artes no Brasil, que se situam dentro
dos Cânones artísticos, sem falarmos de outros ainda mais revolucionários
como por exemplo a *FLUPP (Festa Literária das Periferias*,
https://www.facebook.com/FluppRJ/?notif_t=page_invite_accepted&notif_id=1478652322195967),
e o* Festival Música Estranha - Encontro Nacional de Música Exploratória* (
https://www.facebook.com/events/788968557817235/), que, neste ano, abriu
uma chamada de criação de música-visual em parceria com a *Rede Sonora*
especificamente para *Mulheres Criadoras *(
http://www.sonora.me/2016/10/07/convocatoria-criacao-musical-visual-mulheres-criadoras/),
chamada esta que, ora vejam só, recebeu mais de 60 propostas (64) em um
curtíssimo período de abertura do edital (
http://www.sonora.me/2016/11/04/805/).


64 propostas. Então, aí nos perguntamos, se dentre* 46* projetos
selecionados na chamada para anônimos/as da Bienal de Música da Funarte *apenas
uma mulher* foi bravísssimamente selecionada, e, se dentre os/as *15
*compositorEs
que aos/às quais foram comissionadas obras, *"selecionados por uma comissão
eleitoral de dez intérpretes, de notório saber"*, *consta apenas,
novamente, uma única mulher*, num país que hoje conta com uma longa lista
de mulheres compositoras reconhecidas, das mais diversas faixas etárias,
trajetórias, e estilos/ vertentes composicionais, como compreendermos esta
representatividade quase nula das mulheres na Bienal de Música da Funarte,
em plenos 2016/2017, em pleno fim da já segunda década do século XXI, sem
passar pela perspectiva de gênero, dos feminismos, do sexismo e do machismo
predominantes na história da música? E nos perguntamos, que ~notório saber~
é este que segue perpetuando um olhar histórico e socialmente acrítico para
a e na música, o mesmo olhar propagado há séculos, num mundo que é muitas
coisas, mas não o mesmo dos séculos XVII, XVIII e XIX, o mesmo olhar que
perpetua e repete sistemas de sub (ou praticamente nula) representatividade
de gênero na música? O que entendemos por notório saber quando o que
consideramos notório saber reproduz, acrítica e tão normativamente, *ad
infinitum*, *permanentemente*, *inalteradamente*, sistemas e lógicas de
opressão, exclusão e discriminação de gênero na música?


Neste momento compreendemos porque a discussão sobre as relações de Gênero
foram um pontos importantes e reconhecidos do *Festival de Darmstadt* deste
*2016* (
http://www.internationales-musikinstitut.de/news-oben/207-news-ferienkurse2016/2451-grid.html),
que promoveu neste ano o *GRID - Gender Relations in Darmstadt*, uma série
de discussões e pesquisas no mínimo tão constrangedoras quanto reveladoras
e transformadoras sobre a representatividade e a presença de mulheres no
Festival (https://griddarmstadt.wordpress.com/).


Compreendemos também, aí, porque até mesmo os festivais mais *mainstream*
do *Norte* do mundo como o *Lucerne Festival* (Suíça) e o *Aspen Music
Festival and School* (Eua), *no mesmíssimo ano de 2016,* estão colocando
como prioridade e pauta principal (ou uma das pautas principais) de suas
programações mulheres e as questões das mulheres e de gênero na música,
escolhendo mulheres compositoras como as compositoras residentes, como *Kaija
Saariaho* (
https://www.aspenmusicfestival.com/events/performers/kaija-saariaho/ e
http://www.aspentimes.com/entertainment/activities-events/composer-kaija-saariaho-on-stage-and-in-the-classroom-in-aspen/
) e *Olga Neuwirth *  (
https://www.lucernefestival.ch/en/program/summer-festival-2016/composer-in-residence),
além de discutir a presença das mulheres regentes, intérpretes,
instrumentista e compositoras na música como um todo (
https://www.lucernefestival.ch/en/program/summer-festival/primadonna e
https://www.lucernefestival.ch/en/program/women-of-the-berlin-philharmonic/104
).


Compreendemos também porque mulheres do *Sul* do mundo, brasileiras,
principalmente, dos mais diversos estilos e vertentes musicais, se
engajaram com tanta força, dedicação e mesmo sem qualquer patrocínio, na
realização do *Sonora - Ciclo Internacional de Compositoras*, no mesmo ano
de 2016, em mais de 24 cidades e 6 países (
https://www.facebook.com/sonora.compositoras/?fref=ts e
https://www.facebook.com/sonorafemalesongwriters/?fref=ts).


O que vemos é que, tristemente, no(s) mundo(s) da(s) chamada(s) música(s)
clássica, erudita, contemporânea ou Nova - ou como quiserem chamar- no
Brasil, apesar de todo o contexto social, apesar do momento histórico e
presente que vivemos, apesar de décadas de reflexões e mais reflexões da
chamada nova musicologia, da etnomusicologia, da filosofia, da antropologia
e da sociologia da música, seguimos observando uma dificuldade quase
jurássica, em termos históricos, não apenas de promover espaços mais
representativos do pontos de vista de gênero na música, e também do ponto
de vista étnico-racial, regional e de classe, como seguimos observando o
que a filósofa *Judith Butler* chama de "resistência em perder privilégios"
(
http://www.zeit.de/kultur/2016-10/judith-butler-donald-trump-populism-interview),
porque, sim, a manutenção de ambientes, sistemas e espaços majoritariamente
masculinos na música significa, na prática e na teoria, um inegável e
gritante privilégio para todo o qualquer homem na música, além de uma
aberrante desigualdade desprovida de lógica ou sentido em 2016 e no século
XXI.



Lamentável.
Lamentável e muito antiquado, para dizer o mínimo.



Abraços,
Camila.




Em 8 de novembro de 2016 14:08, <ms.eliana em usp.br> escreveu:

> Corrigindo...
> Parece que foram duas, em duas etapas do processo. Marisa Rezende e
> Patricia de Carli.
> De todo modo é uma parcela ínfima das compositoras atuantes...
> Abraços
> Eliana Monteiro da Silva
>
> ----- ms eliana <ms.eliana em usp.br> escreveu:
> > Caras e caros colegas,
> > Infelizmente apenas uma mulher foi contemplada para a próxima Bienal.
> > Alguém tem informação de quantas enviaram propostas? Seria interessante
> saber se o espaço é pouco atraente às compositoras ou se elas realmente não
> passam no crivo da comissão...
> > Abraços
> > Eliana Monteiro da Silva
> >
> > ----- Carlos Palombini <cpalombini em gmail.com> escreveu:
> > > A Fundação Nacional de Artes – Funarte divulgou, no dia 8 de novembro,
> a
> > > lista de projetos selecionados para o Prêmio Funarte de Composição
> Clássica
> > > 2016. O prazo para interpor recurso ao Centro da Música é de dois dias
> > > úteis a partir da divugação do resultado, ou seja, até o dia 10 de
> > > novembro. Os pedidos devem ser enviados para o endereço eletrônico:
> > > classicos.funarte em gmail.com.
> > >
> > >
> > > *Nota de esclarecimento: *Concluída a análise dos projetos
> identificados
> > > apenas por números, os membros da Comissão, repetindo procedimento
> adotado
> > > em Comissão análoga anterior, decidiram que das dez obras previstas no
> > > Edital para a categoria “seis a dez instrumentos”, apenas sete mereciam
> > > aprovação. O valor correspondente aos três prêmios suprimidos foi
> > > transferido para a categoria “um a dois instrumentos”, que passou de
> > > dezesseis para vinte obras.
> > >
> > > Acesse aqui a lista de selecionados
> > > <http://www.funarte.gov.br/wp-content/uploads/2016/08/Pr%C3%
> AAmio-Composi%C3%A7%C3%A3o-Cl%C3%A1ssica_selecionados.pdf>
> > > http://www.funarte.gov.br/wp-content/uploads/2016/08/Pr%C3%
> AAmio-Composi%C3%A7%C3%A3o-Cl%C3%A1ssica_selecionados.pdf
> > >
> > > --
> > > carlos palombini, ph.d. (dunelm)
> > > professor de musicologia ufmg
> > > professor colaborador ppgm-unirio
> > > ufmg.academia.edu/CarlosPalombini <http://goo.gl/KMV98I>
> > > ________________________________________
> > > anppom-l em listas.unicamp.br
> > > Lista de Discussão dos Associados da ANPPOM - Associação Nacional de
> Pesquisa e Pós-Graduação em Música
> > > https://www.listas.unicamp.br/mailman/listinfo/anppom-l
> > >
> > > Conforme deliberado na Assembleia Geral realizada em 24 de agosto de
> 2016, das 17 às 19 horas, no Auditório da Fundação de Apoio e
> Desenvolvimento da Educação, Ciência e Tecnologia de Minas Gerais, B.
> Horizonte – Não são veiculadas nesta lista mensagens contendo ANEXOS.
> >
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> 2016, das 17 às 19 horas, no Auditório da Fundação de Apoio e
> Desenvolvimento da Educação, Ciência e Tecnologia de Minas Gerais, B.
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