<!doctype html public "-//w3c//dtd html 4.0 transitional//en">
<html>
Caro Eduardo:
<p>Acho que você não entendeu a minha defesa acerca de metodologias
para a ginástica mental e intelectual com base no logicismo (vide
Frege e Russel).
<br>Trocando em miúdos, estive e estou sempre a querer dizer que
quem domina mecanismos e técnicas de grande nível de complexidade,
enfrentará sem dificuldades sistemas com menores graus de complexidade.
A grande questão é: a recíproca não é
verdadeira.
<br>Dou simples exemplos a seguir.
<br>Quem domina a mecânica de um automóvel, entenderá,
compreenderá e analisará facilmente a mecânica de uma
bicicleta.
<br>Ao afirmar isso, não sou fordcentrista.
<br>Quem domina a linguagem e a construção da Fuga nº
24 de Bach, entenderá, compreenderá e analisará facilmente
o contraponto de uma lamentação fúnebre das Ilhas
Salomon.
<br>Ao afirmar isso, não sou etnocentrista.
<br>Abraço,
<br>Jorge Antunes
<br> 
<br> 
<br> 
<p>eduardo luedy wrote:
<blockquote TYPE=CITE>Prezado Jorge Antunes e demais colegas,
<p>Não haverá nas considerações do nosso colega
Antunes
<br>premissas deveras etnocentricas? [Na verdade, a gente
<br>desenvolve esse jeito meio eufemistico, mas no fundo,
<br>o que eu quero dizer mesmo é que acho de um
<br>etnocentrismo atroz afirmar o que o Antunes afirmou]
<br>Refiro-me ao trecho "Os estudantes que chegam, com
<br>paciência e muito trabalho, até ao contraponto florido
<br>a dois coros, acabam por entender e dominar
<br>complexidade que abarca qualquer construção musical
<br>com menor nivel de complexidade".
<br>Quer dizer então que através do domínio dos
<br>procedimentos composicionais desenvolvidos no ocidente
<br>poderemos compreender qualquer música?
<br>E, mais: quer dizer que a compreensão musical
<br>resume-se à compreensão de sua estruturação
formal?
<br>Etnomusicólogos, não deveria ser aqui que vocês
<br>entraríam para afirmar o contrário?
<br>Admiro a erudição do Jorge Antunes (relativamente à
<br>esta tradição ocidental), assim como admiro seu
<br>compromisso ético-político, mas discordo um bocado
<br>dele  se ele defende de verdade este formalismo e se a
<br>sua presmissa é a de que através do ocidente podemos
<br>compreender qualquer música.
<p>Abraços a todos,
<p>Eduardo Luedy
<p>--- Jorge Antunes <antunes@unb.br> wrote:
<p>> Caro Rogério:
<br>>
<br>> Seus valiosos dez centavos enriquecem o debate.
<br>> Os estudantes que chegam, com paciência e muito
<br>> trabalho, até ao contraponto florido a dois coros,
<br>> acabam por entender e dominar complexidade que
<br>> abarca qualquer construção musical com menor nivel
<br>> de complexidade.
<br>> A polirrítmia da música afro-brasileira é
<br>> sub-conjunto da complexidade maior englobada pelo
<br>> contraponto a que me referi.
<br>> O domínio e a prática do contraponto, a que me
<br>> refiro, inclui as polirritmias mais complexas. A
<br>> polirritmia afro-brasileira, a que você chama de
<br>> complexa, agrupa a simultaneidade de ritmos em que o
<br>> tempo é dividido em razões simples, em múltiplos
de
<br>> dois e três. Não existem quiálteras de sete ou
nove
<br>> na rítmica afro-brasileira.
<br>> Quem chega a praticar o contraponto florido a oito
<br>> vozes, com porritmias complexas, estará pronto para
<br>> entender qualquer sub-grupo desse total complexo:
<br>> desde os motetos de Perotin, em que até os textos
<br>> poéticos são contrapontados; as experimentações
dos
<br>> Gabrieli; a polirritmia afro-brasileira; a
<br>> polirritimia das músicas folclóricas
<br>> latino-americanas; os contrastes polirrítmicos e
<br>> fonéticos de John Cage (Dissertação sobre Nada,
para
<br>> 4 locutores); passando pelo microcontraponto
<br>> imbricado das texturas ligetianas; até o contraponto
<br>> das vozes de mixagem da música eletroacústica, desde
<br>> o Estudo nº 1 de Stockhausen, até as Fabulae de
<br>> Bayle.
<br>> Abraço,
<br>> Jorge Antunes
<br>>
<br>>
<br>>
<br>>
<br>>
<br>> Rogerio Budasz wrote:
<br>>
<br>> > Colegas,
<br>> >
<br>> > A Universidade já existia antes do "contraponto
<br>> clássico tonal" e vai continuar a existir depois
<br>> dele. O contraponto funciona muito bem como
<br>> ferramenta de composição e análise da música
da
<br>> Europa e de suas colônias. Aliás, eu diria até
que
<br>> nesses casos é indispensável. Mas se, no âmbito
da
<br>> universidade, eu desejo entender a complexidade
<br>> polirrítmica da música afro-brasileira, talvez eu
<br>> devesse começar pelo tambor de onça mesmo, como
<br>> ponto de partida para explorar esse universo.
<br>> >
<br>> > Não se trata de sugerir a inclusão dessa
<br>> disciplina no currículo, de querer que a
<br>> universidade ensine a tocar tambor de onça, porque
<br>> vai ensinar mal, mesmo porque nunca vai conseguir
<br>> replicar todo o contexto envolvido na interpretação.
<br>> Além disso há a questão do poder, já
colocada antes
<br>> na lista. Se o tambor de onça vira instrumento da
<br>> elite, é bem provável que ele seja substituído
na
<br>> origem por outra coisa. Entretanto, devem haver
<br>> meios para valorizar a arte do tocador de tambor de
<br>> onça (metaforicamente falando, prá ficar no exemplo
<br>> citado) e aprender com ele, mesmo dentro da
<br>> universidade.
<br>> >
<br>> > De qualquer forma, e sem conseguir fugir da
<br>> contradição, é bom não esquecer que a
polifonia
<br>> ocidentental (e a partir dela a disciplina que
<br>> chamamos "contraponto") se desenvolveu a partir de
<br>> práticas populares, como a heterofonia, sendo
<br>> incorporada e transformada na música das elites (ver
<br>> Hoppin, Judkin, etc). Exemplos assim temos aos
<br>> montes. Se um dia as estruturas polirrítmicas da
<br>> música africana virarem disciplina nas nossas
<br>> academias (se é que já não o são em algumas),
é
<br>> porque estarão sendo úteis para nós de alguma
forma.
<br>> Se algum dia o "contraponto clássico tonal" deixar
<br>> de ser disciplina acadêmica ou for relegado a uma
<br>> posição periférica (e isso vai ocorrer, cedo
ou
<br>> tarde, como ocorreu com o isorritmo, o baixo
<br>> cifrado, e tantas técnicas que pareciam eternas em
<br>> suas épocas), é porque já não nos serve.
<br>> >
<br>> > meus dez centavos
<br>> >
<br>> > Rogério
<br>> >
<br>> > Jorge Antunes <antunes@unb.br> wrote:
<br>> >
<br>> >       Oi, Hugo:Não façamos
confusão com as metas
<br>> gerais da civilização brasileira, com palavras de
<br>> ordem e com os chavões.
<br>> >      Diversidade cultural é panorama
de meta e
<br>> prática, como um todo, para a vida e para as
<br>> políticas culturais governamentais.
<br>> >      A Universidade não é
instituição que deva
<br>> cobrir, na totalidade, a pesquisa e a formação
<br>> brasileira.
<br>> >      Além dela, existem outras
instituições que
<br>> garantem a completude da formação
<br>> profissional-cultural: as escolas de samba, os
<br>> grupos folclóricos, os grupos de hip-hop, os clubes
<br>> do choro, as escolas de rock, as gafieiras, os
<br>> bailes funk, as festas rave, etc, etc.
<br>> >      Cada macaco em seu galho. A Universidade
não
<br>> deve ter a ousadia tresloucada de pretender ensinar
<br>> a um brincante de bumba-meu-boi a tocar tambor-onça.
<br>> >      O estudo do contraponto clássico
não
<br>> contempla apenas uma vertente musical como você
<br>> pensa. O microcontraponto que Ligeti e outros usaram
<br>> e usam na construção de tramas e texturas, não
pode
<br>> ser realizado e analisado por quem não estudou
<br>> contraponto clássico tonal. Essa técnica escolástica
<br>> contempla todas as vertentes musicais e abre a mente
<br>> para o enfrentamento com todas as situações
<br>> complexas do cotidiano.
<br>> >      Abraço,
<br>> >      Jorge Antunes
<br>> >
<br>> >
<br>> >       Hugo Leonardo Ribeiro wrote:
<br>> >
<br>> >     > Caro Jorge,Gosto de pensar o estudo do
<br>> contraponto exatamente como essa metáfora do xadrez,
<br>> como um exercício de lógica e domínio de conteúdo.
<br>> Porém, onde fica a diversidade cultural num
<br>> currículo que só contempla uma vertente musical? Ou
<br>> devemos deixar a diversidade cultural somente no
<br>> discurso? Ou isso não deve ser sequer discutido?
<br>> Talvez em outra lista?Quando disse nós, eu me
<br>> referia aos professores universitários responsáveis
<br>> pela eleição dos conhecimentos válidos a serem
<br>> ensinados na universidade,  àqueles responsáveis
<br>> pela construção desse currículo linear que faz
com
<br>> que todos sejam obrigados a cursar as mesmas
<br>> disciplinas (com um mínimo de flexibilidade),
<br>> àqueles que decidem quem pode ser um educador
<br>> musical ou não.Ou vocês realmente acham que um
<br>> professor de instrumento, composição ou harmonia não
<br>> é um educador musical?Hugo Ribeirop.s.1 Meu laptop
<br>> encontrou uma rede sem fio descriptografada... Estou
<br>> de volta à civilização :)p.s.2 Jussamara Souza
bem
<br>> lembrou que nas décadas de 1960 e 70 a Educação
<br>> Musical estava uito próxima dos compositores (vide
<br>> as oficinas de música, Schaffer, Cage, Grupo de
<br>> Compositores da Bahia..). O que houve de lá pra cá?
<br>> Porquê desse distanciamento tão nocivo para ambas as
<br>> áreas?
<br>> >     > Em 10/10/07, Jorge Antunes <antunes@unb.br>
<br>> escreveu:
<br>> >     >
<br>> >     >       Caro
Eduardo:Não vejo nada de
<br>> problemático no que se refere a uma acertada decisão
<br>> sobre o que deve servir para as futuras gerações.
<br>> >     >      A nação
ideal será aquela formada de
<br>> cidadãos de grande capacidade intelectual e crítica,
<br>> capazes de dominar as complexidades.
<br>> >     >      Um povo
que só compreende sistemas
<br>> simples e banais, com baixo nível de complexidade,
<br>> será um povo consumidor de produtos, estruturas,
<br>> discursos, ideologias e tecnologias importadas. Será
<br>> um povo submisso aos donos do mundo, meros
<br>> consumidores de máquinas, sistemas e saberes
<br>> importados.
<br>> >     >      O sucateamento
da Universidade e a
<br>> prática que considera a educação como mercadoria,
<br>> iniciadas com o advento do neoliberalismo, visam
<br>> exatamente isso: formar um povo que não terá
<br>> condições de criar saberes novos, porque o ponto
<br>> máximo a ser alcançado será o status de técnico,
<br>> apertador de botões (botões de tecnologias
<br>> importadas do primeiro mundo).
<br>> >     >      É
por isso que eu discordo daqueles que
<br>> são contra o estudo de Contraponto nos cursos de
<br>> música. O bom músico, seja qual for a área de
<br>> atuação profissional, deve adquirir formação
em que
<br>> se trabalhe o Contraponto a 2, 3, 4, 5 e 8 vozes,
<br>> nas claves. Acho que, por isso mesmo, todos deveriam
<br>> aprender a jogar xadrez.
<br>> >     >      Abraço,
<br>> >     >      Jorge Antunes
<br>> >     >
<br>> >
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<br>> >      Lista de discussões ANPPOM
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<br>> > Prof. Dr. Rogério Budasz
<br>> > Departamento de Artes
<br>> > Universidade Federal do Paraná
<br>> > rogeriobudasz@yahoo.com
<br>> > budasz@ufpr.br
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<br><a href="http://www.artes.ufpr.br/departamento/docentes/rogeriob.htm">http://www.artes.ufpr.br/departamento/docentes/rogeriob.htm</a>
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