<br clear="all"><div><div>Artigo muito bom para professores visitantes na UFRJ, UERJ, UFF, Uni-Rio etc. que querem morar sem pagar muito caro em bairros com serviços de Zona Sul, doméstica que mora ao lado, e pesquisa de campo na sala.<br>
<br><h1>Os novos favelados: Ph.D’s na favela</h1>
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                                                <p style="text-align:center"><a href="http://www.anf.org.br/wp-content/uploads/2013/04/rocinha1.jpg"><img class="aligncenter size-medium wp-image-12799" alt="rocinha1" src="http://www.anf.org.br/wp-content/uploads/2013/04/rocinha1-300x199.jpg" height="199" width="300"></a></p>

<p><strong>Paulo Baía*</strong><br>
<strong> Giovanna Barreto*</strong></p>
<p style="text-align:justify">Nos últimos cinco anos todo o território
 da região metropolitana do Rio de Janeiro vem passando por um acelerado
 processo de valorização simbólica, material e geopolítica. Ao contrário
 do que se possa pensar, esse movimento não é consequência dos grandes 
eventos dos próximos anos 2014 e 2016, cotidianamente estampados no 
jornal. Mas é, sobretudo, a sua causa.</p>
<p style="text-align:justify">Essa supervalorização está contida em um
 processo de mundialização do capital financeiro especulativo associado a
 uma política nacional que estimulou o crédito e o consumo para todas as
 faixas da população brasileira. Estamos imersos – quase náufragos – em 
uma sociedade de valores invertidos, onde a palavra cidadania, nascida 
do latim civitas – que quer dizer cidade – perdeu sua significância de 
direitos e deveres de todo e qualquer cidadão por seu novo significado: o
 poder de poder consumir. Dessa nova estrutura social emerge um novo 
tipo de dinâmica populacional que é retratada no censo demográfico de 
2010 pelo IBGE como um processo migratório de natureza diferenciado. O 
grande Rio deixa de ser um dos principais polos de atração das 
populações da região norte e nordeste e passa a ser polo de atração de 
muitos grupos da classe média internacional e da classe média das 
cidades do interior do estado do Rio de Janeiro e de outros estados. O 
Rio de Janeiro, “cidade maravilhosa” e patrimônio Cultural da 
Humanidade, mas que, contraditoriamente, de fato a poucos pertence se 
transformou em polo de atração para ricos e classe média abastada. E, ao
 contrário do que se possa pensar, esse novo tipo de ocupação não se 
restringe a áreas hoje ocupadas pela nossa moderna nobreza social, mas 
se dá em todas as suas paisagens, incluindo as favelas. Através de uma 
política estrategicamente formulada que associa segurança pública, ordem
 pública e controle territorial, a ideia das favelas como um lugar de 
perigo é substituída por territórios pacificados militarmente, onde a 
lógica da pacificação militar exerce um controle social direto sobre os 
moradores tradicionais da favela.<br>
<br>
Os moradores tradicionais passam a viver vários tipos de pressões; 
neste artigo vamos detalhar apenas dois. Em primeiro lugar, os moradores
 são estimulados ao consumo através de crédito facilitado, ao mesmo 
tempo em que recebem algum tipo de renda através de ações afirmativas do
 governo (como, por exemplo, o programa Bolsa Família). Essa renda gera 
possibilidade de consumo. Em segundo lugar, uma pressão mais violenta e 
mais cruel, já que no lugar das suas moradias o custo de vida tem um 
aumento muito superior a suas capacidades de geração de renda: nos 
espaços pacificados militarmente ou mesmo nas favelas não pacificadas, 
mas sob o controle militar das milícias ou de facções criminosas, o 
custo de eletricidade, de comida, de bens e serviços aumentou muito. 
Este aumento faz com que o morador amplie a sua capacidade de 
endividamento, chegando a um ponto em que se torna prisioneiro das 
cadeias de credores formais (bancos, financeiras) ou informais 
(vendedores de porta, agiota, amigos). Contudo, esses moradores 
tradicionais da favela têm um bem que se valorizou muito, que é a sua 
própria casa. Mesmo em condições muito precárias, há um valor 
imobiliário real agregado associado ao valor da especulação imobiliária 
que existe, em larga escala, também nas favelas. O que temos observado é
 que a chamada nova classe média surge nas favelas e fora das favelas e 
faz um processo de migração de uma favela para outra, comprando casas de
 pessoas muito endividadas que vendem os seus barracos por valores entre
 15 a 40 mil reais, dependendo da localidade, e vão se localizar na 
periferia das periferias. A este processo os urbanistas e os cientistas 
sociais e demógrafos que opõe resistência ao modelo chamam de expulsão 
branca. Os movimentos sociais nas favelas, contrários a este movimento, 
usam a denominação remoção branca, enquanto que os dirigentes políticos,
 as elites empresariais e os seus tecnocratas chamam este processo de 
renovação populacional. O fato é que estamos assistindo a um processo de
 “limpeza”, “higienização” das favelas dos favelados que estão sendo 
substituídos por moradores das novas classes médias e das velhas classes
 médias. Quando falamos em classe média, não ficamos prisioneiros do 
simplismo dos economistas, que somente avaliam os padrões de consumo. 
Remetemos as novas e as velhas classes médias à aquisição não apenas da 
capacidade de consumo, mas, sobretudo à aquisição de novos valores 
societais vinculados à ascensão social, ao consumo e ao prestígio. Como 
exemplo, citamos dois professores doutores, titulares da UFRJ, com 
propriedades no bairro de Ipanema, na Zona Sul do Rio de Janeiro, que 
compraram e reformaram casas na favela do Vidigal, e lá estão morando. 
Isso representa para eles uma diminuição muito grande dos seus custos 
sociais e financeiros, ao mesmo tempo em que moram em uma região 
pacificada militarmente, o que para eles não afeta suas subjetividades. 
Além da diminuição de custos, tiveram oportunidade de alugar os seus 
apartamentos supervalorizados em Ipanema por valores superiores a 5 mil 
reais, para famílias de executivos estrangeiros que estão trabalhando na
 cidade do Rio de Janeiro. Longe de pensar que dois doutores morando no 
Vidigal possam contribuir para o aumento da consciência cívica e 
educação dos antigos moradores favelados do morro, esses dois novos 
moradores representam a um só tempo um símbolo e um sinal da remoção 
branca e da “limpeza” populacional silenciosa promovida pela dinâmica do
 mercado capitalista.</p>
<p style="text-align:justify"> Os governos não falam mais hoje em 
remoção de favelas, a não ser pontualmente em regiões da Zona Oeste em 
função de obras de infraestrutura, mas há um estímulo do mercado para 
que as novas e as velhas classes médias ocupem as favelas como 
consumidores e como moradores, o que já começamos a enxergar em quase 
todas as favelas da Zona Sul do Rio de Janeiro, da Tijuca e do Complexo 
do Alemão. A dinâmica é a dinâmica capitalista de valorizar a 
propriedade e a liberdade de compra. Esses valores são assegurados por 
um território pacificado militarmente. Contudo, não somos de todo 
pessimistas. Os valores de mercado também foram introjetados nas 
subjetividades dos antigos favelados, que ainda sem clareza, mas com 
maior consciência, tornam-se empreendedores de si mesmo. A expressão 
“vou me virar” para ter algum ganho na vida passa a ter outro 
significado de natureza sociológica quando é agregado à ideia de 
empreendedorismo. Este, por sua vez, é facilitado por várias atividades 
hoje presentes nestes territórios, através de agências empresariais como
 SESI, SENAI, SENAC e SEBRAE ou órgãos governamentais específicos de 
capacitação para o empreendedorismo e de crédito. Os movimentos sociais 
deixam de ter um caráter de reivindicação por direitos de cidadania e 
passam a ter como eixo demandar serviços de capacitação para empreender e
 assim tornarem-se geradores de sua própria renda e consumidores dentro 
do mercado global do grande Rio, associados a valores típicos de uma 
classe média sofisticada. Podemos citar como exemplo o projeto Favela 
Orgânica, em que centenas de favelados são capacitados a reciclar o seu 
lixo alimentar para melhorar a qualidade de vida e gerar possibilidades 
de negócio. A isso está atrelada a ideia de sustentabilidade, que não 
exclui a desigualdade social e sua hierarquização perversa, mas introduz
 de maneira muito consistente o espírito do capitalismo de acumular 
capital e gerar renda e lucros para quem participa dele. Esses são os 
novos valores civilizatórios emergentes nas favelas do Rio de Janeiro, 
sustentados por um discurso quase único de todas as mídias, exceção 
feita às mídias alternativas em que os favelados falam por si mesmo – 
como este jornal ou esta agência.</p>
<p style="text-align:justify">Na maioria das favelas pacificadas vemos
 o surgimento de hospedarias, casas de show e restaurantes num circuito 
que cada vez mais atrai o público rico brasileiro e estrangeiro, em 
busca da diversão de boa qualidade.</p>
<p style="text-align:justify">Nunca a expressão de Lícia do Prado 
Valladares “passa-se uma casa” esteve tão presente como hoje, entretanto
 de forma muito diferente da de quando Lícia escreveu sua tese de 
doutorado.</p>
<p>*-Os autores são militantes sociais, Sociólogos e professores.</p>
<a href="http://www.anf.org.br/os-novos-favelados-ph-ds-na-favela/">http://www.anf.org.br/os-novos-favelados-ph-ds-na-favela/</a><br><br>carlos palombini<br></div><a href="http://www.researcherid.com/rid/F-7345-2011" target="_blank">ufmg.academia.edu/CarlosPalombini</a><br>
<span>"Ici je ne tiens à charmer personne." (Paul Valéry)</span><br><div></div><div></div><div></div></div>
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