<ins style="display:inline-table;border:none;height:90px;margin:0;padding:0;width:728px"><ins style="display:block;border:none;height:90px;margin:0;padding:0;width:728px" id="aswift_0_anchor"></ins></ins>

 



<div class="post-content">

<p style="text-align:justify">Suzana Herculano-Houzel</p><p style="text-align:justify">Vamos fazer as devidas ressalvas 
primeiro, antes que a polícia de plantão venha me dizer que estou 
fazendo um desserviço à ciência brasileira. É claro que gostaria de ver 
mais jovens se tornarem cientistas, e quero contribuir para isso. Mas 
decidi que faz parte do meu trabalho de divulgação científica tornar 
público e notório como é se tornar cientista no Brasil.</p>
<p style="text-align:justify">Meus objetivos aqui são promover a 
conscientização das pessoas sobre a realidade da carreira de um 
cientista e, quem sabe, gerar com isso um certo espanto e revolta; e 
contribuir para que a escolha dos jovens por uma carreira em pesquisa 
seja consciente, apesar de tudo o que vem a seguir. Mas, sobretudo, o 
que eu gostaria é de gerar indignação suficiente para fazer a carreira 
de cientista (1) passar a existir de fato, e (2) ser valorizada.</p>
<p style="text-align:justify">Feitas as ressalvas, vamos então à minha campanha de anti-propaganda sobre a ciência no Brasil!</p>
<p style="text-align:justify">Você que é jovem e está considerando se tornar pesquisador: você sabia que…</p>
<p style="text-align:justify">- durante a faculdade, seus estágios de 
iniciação científica serão remunerados em apenas 400 reais – isso mesmo,
 menos do que um salário mínimo? Este é o valor atual definido pelo 
CNPq. E isso é SE você conseguir bolsa de iniciação científica, porque a
 Faperj, por exemplo, atualmente limita a sua concessão a UMA bolsa por 
pesquisador, e o CNPq-PIBIC a duas bolsas. Em um laboratório de tamanho 
médio, isso já não será suficiente para garantir bolsas a todos os 
estagiários – o que significa que é vexaminosamente comum termos 
estagiários trabalhando de graça;</p>
<p style="text-align:justify">- quando terminar a faculdade, a não ser
 que consiga emprego na indústria ou em empresas privadas, para fazer 
pesquisa você precisará concorrer a bolsas de R$ 1.350 para fazer 
mestrado? Enquanto isso, seus colegas formados em administração, 
engenharia, advocacia já estarão entrando para o mercado de trabalho, 
ganhando salários iniciais (com todos os direitos trabalhistas) de 3 a 7
 mil reais reais ou mais. Ah, eu mencionei que, embora se espere que 
você trabalhe 40 horas por semana em dedicação exclusiva durante o 
mestrado, você não terá qualquer direito trabalhista? Isto porque o seu 
trabalho ainda não é considerado, ahn, trabalho…</p>
<p style="text-align:justify">- …é mais fácil conseguir bolsa do 
Ciência Sem Fronteiras para fazer GRADUAÇÃO no estrangeiro do que 
conseguir uma bolsa de pós-graduação no país? É isso mesmo: exportamos 
nossos alunos de graduação, mas não temos bolsas suficientes para 
mantê-los na pós-graduação no país.</p>
<p style="text-align:justify">- quando você terminar o mestrado, a não
 ser que consiga emprego como pesquisador em empresas privadas (que são 
pouquíssimos), você terá necessariamente que fazer um doutorado? A razão
 é que o cargo de “pesquisador” em nosso país é quase inexistente; 
somente institutos de pesquisa como o INCA ou a Fiocruz oferecem emprego
 (através de concurso público) para pesquisadores (e muitas vezes exigem
 doutorado). Todas as demais possibilidades de emprego para um 
pesquisador são como “professor universitário” – e este cargo, também 
somente acessível por concurso público, é hoje essencialmente restrito a
 quem já tem título de Doutor.</p>
<p style="text-align:justify">- então, com 3 anos de formado, você 
terá que concorrer a bolsas de R$ 2.000 mensais para fazer doutorado? 
Isso, vou repetir: seus colegas já estarão no mercado de trabalho, 
ganhando salários reais, tendo seu trabalho chamado de “trabalho”, com 
direito a férias e 13o salário – e, com sorte, você terá assinado um 
papel aceitando receber DOIS mil reais por mês pelos próximos 4 anos. E 
fique muito contente de ter uma bolsa: como dizem nossos detratores, 
você deveria ficar “muito feliz de estar sendo pago para estudar”. 
Exceto que você não estará “estudando”; você estará trabalhando, gerando
 conhecimento, e contribuindo para as universidades publicarem os 
artigos científicos que lhes servem como base de avaliação no cenário 
mundial.</p>
<p style="text-align:justify">- que, durante todos esses anos de 
pós-graduação, para receber uma bolsa você NÃO poderá ter qualquer outra
 fonte de renda? Sim, você pode ter outro emprego e fazer pós-graduação 
sem receber bolsa – mas é pouco provável que consiga terminar a 
pós-graduação assim. Para receber uma bolsa, você será obrigado a 
assinar uma declaração humilhante de que não tem qualquer outra fonte de
 renda. Bom, mais ou menos; a Capes há um ano decidiu aceitar acúmulo de
 bolsa com “emprego de verdade” SE for na mesma área da sua 
pós-graduação. Adivinha qual é a chance de você ter esse “emprego de 
verdade”? Pois é.</p>
<p style="text-align:justify">- agora, com o diploma de Doutor em 
mãos, você terá ganhado o direito de competir por vagas para… Professor.
 Isso mesmo: não de “pesquisador”, mas de “professor”. Isso porque as 
universidades públicas, onde a boa ciência é feita no país, somente 
contratam “professores”. Ou seja: com MUITA sorte, você será contratado,
 no mínimo SETE anos após a graduação, para fazer algo que você NUNCA 
fez: dar aulas. Seu salário inicial líquido (seu primeiro salário de 
verdade!) será algo em torno de 5 mil reais – mas não se engane, seu 
“vencimento básico”, aquele que o governo usará para talvez um dia pagar
 sua aposentadoria, será de não muito mais do que 2 mil reais…</p>
<p style="text-align:justify">- é mais provável, no entanto, que você 
NÃO consiga emprego imediatamente, uma vez doutor, e tenha que ingressar
 no limbo dos pós-doutorandos? Um “pós-doutor” é exatamente isso que o 
nome indica: alguém que já é doutor, mas ainda não tem emprego. É um 
limbo criado pelo sistema para manter interessados os cada vez mais 
numerosos recém-doutores que não encontram emprego nem como 
pesquisadores, nem como professores. Pela mesma tabela do CNPq, um 
recém-doutor recebe uma bolsa de R$ 3.700 mensais, livres de impostos. 
Ou seja: lembra daquele salário inicial dos seus colegas recém-formados?
 Um aspirante a cientista finalmente conquista o direito a um valor 
semelhante… SETE anos após a graduação. Ah, claro: ainda sem qualquer 
direito trabalhista, pois você “não trabalha”. Permita-me fazer as 
contas para você: a esta altura, você esta perto de completar 30 anos de
 idade, e oficialmente… “nunca trabalhou”;</p>
<p style="text-align:justify">- A esta altura, você já será para todos
 os fins práticos um Cientista – mas ainda não terá direito de pedir 
auxílio às agências de fomento para fazer pesquisa? Para gerenciar um 
auxílio-pesquisa é preciso ter vínculo empregatício com uma instituição 
de pesquisa – e isso, tirando os pouquíssimos cargos de Pesquisador de 
fato na Fiocruz, INCA, IMPA etc, você só consegue se virar… professor 
universitário;</p>
<p style="text-align:justify">- SE você conseguir ser aprovado em 
concurso para professor universitário E for fazer pesquisa de fato, você
 não inicialmente ganhará NEM UM CENTAVO A MAIS por isso? Você terá a 
mesma carga horária de aulas a cumprir, aulas por preparar e atualizar 
todos os semestres, mas o trabalho de pesquisa, com o qual você tanto 
sonhou, é… por sua conta. Se você resolver não fazer pesquisa e apenas 
der aulas, como você foi oficialmente contratado para fazer, está tudo 
bem. Talvez seus colegas torçam o nariz para você, porque esqueceram que
 também o emprego deles é apenas como professores, e não pesquisadores, 
mas você estará rigorosamente correto se só fizer seu trabalho de 
professor.</p>
<p style="text-align:justify">- Apesar disso tudo, sua progressão na 
carreira universitária será dependente do seu trabalho de pesquisa? Você
 leu corretamente: você foi contratado como PROFESSOR, mas sua avaliação
 funcional será feita de acordo com as suas atividades como PESQUISADOR…</p>
<p style="text-align:justify">- SE você tiver produtividade 
suficiente, em alguns anos você poderá concorrer a uma bolsa de 
Pesquisador do CNPq, que complementa seu salário em R$ 1.000 por mês. E 
isso é todo o incentivo financeiro que você receberá para fazer 
pesquisa.</p>
<p style="text-align:justify">Já desistiu? Pelo bem da ciência 
brasileira, espero que… sim. Esta é minha campanha de anti-propaganda em
 prol da melhoria da ciência no meu querido país: torço para que você 
tenha ficado indignado a ponto de considerar fazer outra coisa da sua 
vida. Precisamos de uma crise, e um desinteresse súbito da parte de 
nossos jovens seria muito, muito, muito eloquente.</p>
<p style="text-align:justify">Mas sei que a gente escolhe ser 
cientista assim mesmo, apesar de tudo isso. Quando eu entrei para a 
Biologia, em 1989, a situação era ainda pior. A ciência no país persiste
 graças a esses jovens idealistas, que querem contribuir para o 
progresso da nação apesar de serem mal-tratados e desvalorizados, e que 
topam embarcar em uma “carreira” que não lhes dará condições financeiras
 para terem uma vida independente antes dos TRINTA anos de idade – e 
olhe lá…</p>
<p style="text-align:justify">________________________________________________________________________</p>
<p style="text-align:justify">Artigo escrito por Suzana Herculano-Houzel, autora do blog <a title="A Neurocientista de Plantão" href="http://www.suzanaherculanohouzel.com" target="_blank">“A Neurocientista de Plantão</a>“, que gentilmente autorizou a publicação deste texto (que aliás, possui uma continuação: “<a title="Você quer mesmo ser cientista? Parte 2: uma proposta prática" href="http://www.suzanaherculanohouzel.com/journal/2012/10/15/voce-quer-mesmo-ser-cientista-parte-2-uma-proposta-pratica.html" target="_blank">Você quer mesmo ser cientista? Parte 2: uma proposta prática</a>“)</p>

</div><a href="http://www.posgraduando.com/blog/voce-quer-mesmo-ser-cientista">http://www.posgraduando.com/blog/voce-quer-mesmo-ser-cientista</a><br clear="all"><br>-- <br><div>carlos palombini<br></div><a href="http://ufmg.academia.edu/CarlosPalombini" target="_blank">ufmg.academia.edu/CarlosPalombini</a><br>
<a href="http://proibidao.org" target="_blank">proibidao.org</a><br><div></div><div></div><div></div><div></div><div></div><div></div><div></div><div></div><div></div>
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