[ANPPOM-L] Resenhas

carlos palombini palombini em terra.com.br
Qua Dez 12 10:41:08 BRST 2007


Olá, Carlos

O grupo de publicações Leonardo, da International Society for the Arts, 
Sciences and Technology, incluindo os periódicos _Leonardo_, _Leonardo 
Music Journal_ (MIT Press) e o _Leonardo Electronic Almanac_ tem um 
setor online chamado Leonardo Digital Reviews, do qual participei por 
alguns anos (de 1998 a 2001). A ISAST recebe, em sua sede em São 
Francisco, livros, CDs, endereços de sites etc para resenha. Este 
material fica a disposição de um painel  especializado de resenhistas. A 
lista de material recebido é atualizada todos os meses e repassada aos 
membros do painel. Cada membro pode solicitar qualquer item da lista, 
que lhe é então enviado por correio pela ISAST, o solicitante assumindo 
o compromisso de, em um mês, enviar uma resenha do item solicitado. O 
colaborador que não enviar pelo menos um trabalho por ano é removido do 
painel. O endereço do site é

<http://www.leonardo.info/ldr.html>.

Uma parte substancial de minhas publicações e a quase totalidade de 
minhas publicações recentes tem sido de resenhas. Se não tenho me 
dedicado mais a este trabalho é porque sinto uma dificuldade enorme --- 
e um desejo enorme também --- de apresentar em forma acabada o resultado 
de uma ruminação mais prolongada sobre um tema original, que se exprime, 
naturalmente, em formato de muitas páginas. A maioria de nós, no Brasil, 
sofre este problema de dificuldade de concentração. Somos normalmente 
solicitados a fazer tantas coisas e vivemos em situações tão instáveis, 
apesar de nossa "estabilidade no emprego"! Minha predileção por resenhas 
acaba expressando não só meu gosto pelas formas curtas como também minha 
dificuldade de concentração.

Comecei a ler um trabalho muito interessante, embora não tão recente 
assim, que resulta de uma tentativa de aproximação da musicologia 
francesa (que, pelo pouco que conheço, não me parece muito aventurosa) 
com a história cultural. O livro é de 2001 e se chama _La Vie musicale 
sous Vichy_ (Paris: Complexe, org. Myriam Chimènes). Ele se insere no 
contexto de uma revisão crítica da memória da Ocupação, revisão esta 
iniciada com o _Vichy France_ de Robert Paxton em 1972, e que culmina no 
_Syndrome de Vichy_, de Henry Rousso (1987), por muitos anos diretor do 
Institut d'histoire du temps présent, do CNRS. O IHTP é um dos 
co-editores da obra e, não por coincidência, Rousso assina o prefácio do 
livro. Ainda estou no começo da leitura, mas minha primeira impressão é 
que os resultados desta abordagem, por mais estimulantes que sejam, são 
ainda um pouco decepcionantes se comparados aos de história cultural 
propriamente dita e mesmo aos de história da cultura. A orientação é 
mais que uma tendência francesa. A ambiciosa e recente _Oxford History 
of Western Music_, de Richard Taruskin (Oxford: OUP, 2005), em seis 
volumes, dois dos quais dedicados ao século XX, também se insere, de 
acordo com as resenhas no website da Amazon, no contexto de uma história 
das idéias. A História de Taruskin começa com o surgimento da notação 
ocidental, cuja propagação ele apresenta como resultante da aliança 
política entre Roma, representada pelo Papa Estevão II, e os Francos, 
representados por Pepino, o Breve, contra os Lombardos, e da fundação da 
dinastia Carolíngea. O prefácio de Taruskin é muito revelador no balanço 
(conservador) entre os avanços das musicologias mais radicais e o 
imperativo de escrever o que ele apresenta (sintomaticamente) como 
talvez a última história da música ocidental.

São, ambos, objetos interessantes para resenha, como é interessante 
também é a recente produção sobre Maysa: depois de um livro na série 
Grandes Nomes do Espírio Santo, em 2004, surgiram duas biografias em 
2007. Não é curioso que duas das vozes mais originais da música popular, 
a de Mário Reis e a de Maysa Monjardim (com o devido respeito a 
Clementina de Jesus, Carmen Miranda e Orlando SIlva), sejam de cantores 
oriundos de famílias tradicionalmente ricas?

Um abraço,
Carlos

Carlos Sandroni escreveu:
> Olá a todos,
>
> Por ocasião do encontro de editores de periódicos de música, me 
> permito contribuir com uma reflexão que diz respeito a estes, e a 
> todos nós.
> É sobre a nossa injustificável timidez na produção de resenhas! Nossos 
> periódicos de música ainda publicam um número demasiado pequeno de 
> resenhas, em comparação com
> periódicos de música internacionais; tb em comparação com periódicos 
> científicos brasieliros de outras áreas; e finalmente, em comparação 
> com o crescimento, nos últimos anos, da produção bibliográfica 
> nacional na área de música. Para não falar do papel das resenhas em 
> nos ajudar a estar atualizados em relação à bibliografia internacional...
> Salvo engano, nenhum periódico de música brasileiro mantém uma seção 
> de "Bibliografia recente", o que também seria de grande ajuda.
> E já ia me esquecendo que resenhas são também de discos, DVDs, sites 
> internet...
> Para reverter este quadro de lacunas, sugiro um esforço conjunto dos 
> periódicos e dos PPGMs, pois os estudantes de pós precisam mesmo 
> escrever resenhas como parte de seu treinamento... Fica a sugestão.
>

-- 
carlos palombini (dr p)
professor adjunto de musicologia
universidade federal de minas gerais
<cpalombini em gmail.com>

"'That government is best which governs not at all'; and when men are prepared for it, that will be the kind of government which they will have" (Henry David Thoreau, 1849)




Mais detalhes sobre a lista de discussão Anppom-L