[ANPPOM-L] Professor do IE-Unicamp sobre a invasão da USP

carlos palombini palombini em terra.com.br
Ter Jun 19 15:50:39 BRT 2007


Estudantes lutam em defesa da universidade pública
Escrito por Plínio de Arruda Sampaio Jr.
15-Jun-2007

A ocupação da reitoria da USP em repúdio ao ataque do governo de São Paulo à
autonomia universitária e contra a progressiva degradação da qualidade do
ensino surpreendeu pela ousadia e determinação dos estudantes que a
lideraram. Lançando mão da "desobediência civil" como arma de pressão
política, a ocupação conseguiu em poucos dias o que parecia impossível,
depois de meses de tratativas e negociações infrutíferas.

O efeito arrebatador da ocupação sobre a consciência cívica da pacata
comunidade universitária levou o governo estadual a recuar em suas intenções
intervencionistas e forçou a reitora a acatar boa parte das demandas dos
estudantes. Não se conseguiu tudo que se pretendia. A necessária unidade
entre pesquisa e ensino, ameaçada pelas pressões das "empresas" interessadas
em usufruir os polpudos recursos da Fapesp, permanece no limbo. Mesmo assim,
as vitórias do movimento estudantil foram consideráveis.

Muito além das demandas específicas que detonaram o movimento, a ocupação da
USP pôs a nu a crise da universidade brasileira. Tal como está, a
universidade brasileira desagrada a todos.

Para os neoliberais, a universidade pública é um "luxo caro" que precisa
justificar sua existência. Para tanto propõem subordiná-la às exigências do
mercado. Por essa razão, ela vem sendo submetida a repetidas rodadas de
ajustes fiscais e reformas liberalizantes.

Para quem imagina que a universidade pública é um patrimônio estratégico do
povo brasileiro, sua capacidade de produzir conhecimento para o Brasil deve
ser resgatada. Para tanto, ela precisa desesperadamente de recursos para
sobreviver e, mais importante, carece de um projeto nacional que lhe dê
sentido.

Ao colocar na agenda política nacional a defesa da Universidade Pública e a
democratização de suas estruturas de poder, a ocupação da USP ganhou uma
dimensão que extrapolou suas intenções iniciais, transformando-se numa
espécie de bastião da luta em defesa da universidade pública, uma luta que
tem uma história que se confunde com a própria afirmação do Brasil como
sociedade nacional.

Para reprimir o despertar do movimento estudantil, as forças da ordem
procuram caracterizar a ocupação da reitoria como um fenômeno artificial,
dirigido por partidos de esquerda que manipulam a boa fé e a ingenuidade dos
estudantes. É uma forma estúpida de ocultar a realidade.

Os estudantes que tomaram para si a responsabilidade que faltou a muitos são
o produto de seu tempo: frustrados com o progressivo sucateamento das
universidades públicas; indignados com o horizonte negativo que se lhes
antepõe como futuro; profundamente descrentes na democracia do "mensalão" e
das "navalhas"; desconfiados até mesmo em relação aos partidos de esquerda,
que julgam conservadores e politiqueiros.

Goste-se ou não, o movimento é conduzido por estudantes generosos, dispostos
ao sacrifício por uma causa coletiva, com muita coragem e pouca bagagem
política, cansados da crise permanente da sociedade em que vivem e com muita
pressa para resolver os graves problemas do Brasil. O forte eco de suas
ações sobre o conjunto dos estudantes revela a grande efervescência e a
enorme frustração latente nos universitários brasileiros.

Os estudantes que ocupam a reitoria da USP despertaram para a política. Logo
aprenderão as duras lições da luta de classes numa sociedade intolerante com
todo movimento que lança mão do conflito como forma legítima de conquista de
direitos coletivos. Para os donos do poder, o conflito só é permitido, e com
grande liberalidade, para a defesa do status quo.

É dever de todas as forças políticas comprometidas com a democracia evitar
por todos os meios que os estudantes que se levantaram para defender a
universidade pública sejam postos no pelourinho. Defender os estudantes que
ocupam a reitoria da USP contra qualquer tipo de punição é defender a
desobediência civil como forma legítima de luta quando todas as outras
simplesmente não dão mais resultado.

Plínio de Arruda Sampaio Jr. é professor do Instituto de Economia da
Universidade Estadual de Campinas (IE/UNICAMP).



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