[ANPPOM-L] A Itália quer Battisti. mas esconde Troccoli

Carlos Palombini cpalombini em gmail.com
Dom Jan 16 23:44:04 BRST 2011


Já que o caso continua em discussão, forneço o link para a carta dos quatro
professores italianos nas universidades de Montpellier, Lille III e Amiens
III.

http://www.observatoriodapolitica.org.br/detalhes_publicacao.aspx?cod=99#undefined

O link abaixo é para uma análise da forma como a FSP e o ESP têm apresentado
o caso.

http://ousarlutar.blogspot.com/2011/01/o-caso-battisti-e-os-pecados-da.html

Finalmente, a carta aberta ao ex-presidente do Brasil, assinada por
Bernard-Henri Lévy.

http://laregledujeu.org/2009/12/06/561/lettre-ouverte-au-president-lula-sur-le-cas-battisti/

carlos √
___

A carta abaixo é de 4 professores universitários italianos radicados na
França.



“Caso” Battisti: eis por que estamos com Lula


Somos um certo número de italianos residentes no exterior, onde trabalhamos
no ensino e na pesquisa, estupefatos com a postura da mídia e da “opinião
pública” do nosso país diante do “caso” Cesare Battisti. A jornalista Anais
Ginori, em *La Reppublica* de 2 de janeiro, parece por exemplo estigmatizar
o “júbilo dos intelectuais franceses” (arbitrariamente identificados com
Bernard-Henri Lévy e Fred Vargas) diante da recusa de extraditar Battisti,
decidida pela presidente brasileiro Lula da Silva. Quanto à força de
oposição ao atual governo Berlusconi, estamos particularmente surpresos ao
apreender como alguns parlamentares do PD se recordam repentinamente de sua
matriz ideológica, apelando inesperadamente ao presidente Lula enquanto
“homem de esquerda”, com o único propósito de questionar seu gesto de
precaução em relação aos direitos de um preso.

Contrariamente ao que se tem escrito e dito, nós acreditamos que a decisão
de competência do presidente brasileiro não é resultado de um juízo
superficial e apressado sobre nosso país, mas resultado de uma avaliação
aprofundada e pertinente da situação política e judiciária italiana. O
Brasil é o último de uma longa lista de países, após Grécia, Suíça, França,
Grã Bretanha, Canadá, Argentina, Nicarágua, que se recusaram a colaborar com
a justiça italiana. Será um acaso? Na verdade, a fúria do governo italiano
em pedir a extradição de Battisti se configura hoje mais como a vontade de
exorcizar um inimigo vencido (quase uma obsessão de eliminar), do que como
uma sóbria, autêntica exigência de justiça. Surpreendente, em particular,
uma tal perseverança “justiceira” da parte de um executivo tragicamente
incapaz de lançar luz sobre a carnificina dos anos sessenta e setenta,
unanimimente considerada pelos historiadores como a “mãe” de todo o
terrorismo. Recordemos como em seu favor o “zero responsáveis” sobre o
atentado da Praça Fontana em Milão e da Praça de Loggia em Brescia tem sido
permanentemente consagrado, respectivamente pela Suprema Corte em 3 de maio
de 2005 e, mais recentemente, pela Corte de Inquérito em 16 de novembro de
2010. Ou uma magistratura severa que garante a imparcialidade do Estado,
como sugerido recentemente por Alberto Asor Rosa[1] em uma de suas
freqüentes colunas no*Manifesto*! Uma tal diferença de tratamento em
investigar a responsabilidade, que não tem como não saltar aos olhos da
opinião pública internacional, não é apenas o efeito de uma permanência
endêmica, na Itália, de uma classe corrupta no governo ou mesmo
para-fascista (de Alemanno, ex-membro de esquadra fascista, prefeito de
Roma, ao insolente ex-MSI [2] La Russa, Ministro da Defesa). Não, essa tara
originária é antes de tudo fruto da política de emergência que tem sido o
leitmotiv da política italiana do pós-guerra e na qual a esquerda se deixa
seduzir, até a morte rápida como uma fatalidade, quando não tranqüilamente
acomodada, por uma consolidada incapacidade de propor uma alternativa global
a uma ordem capitalista tardia.


Essa “emergência” prolongada foi a base da participação de setores inteiros
do Estado nas atrocidades criminais que ensangüentaram o passado recente da
história nacional, impedindo a emancipação social e debilitando
antropologicamente, molecularmente, a cotidianidade. Fato altamente
significativo, a classe política atualmente no comando na Itália é herdeira
direta desses poderes um dia ocultos (“Piano solo”, “Gládio”, “P2” [3]), mas
agora definitivamente desembaraçada e bem decidida a ocupar o terreno
político e midiático, para defender seu próprio interesse vital ameaçado:
aquele de uma vida reduzida a uma pura, absurda axiomática empresarial. A
“anomalia italiana” não é senão o resultado dessa sistemática subordinação
dos órgãos garantidores do direito à “exceção” do comando político e ao seu
diktat selvagem sobre a consciência. Basta pensar que um dos mais altos
postos da república, abaixo apenas do Presidente Giorgio Napolitano, é hoje
confiado a um “magnata” da mídia cuja “acumulação primitiva”, no curso dos
anos sessenta e setenta, tem sido caracterizada por aqueles que a definiram
eufemisticamente como “ilegalmente comprovada”.


Portanto, acreditamos que o forte envolvimento do Estado italiano na guerra
civil “guerreada” que teve lugar na Itália nos anos setenta, paralelamente
ao conflito (não somente e nem sempre “frio”) encenado pelos dois blocos
internacionais opostos e parcialmente especulares, torna impossível desatar
o nó histórico emerso com o “caso” Battisti no quadro das instituições e das
leis atualmente vigentes na Itália. Somente uma medida que reconheça a
enorme responsabilidade do Estado na degeneração do embate político entre os
anos sessenta e oitenta, e não a grotesca exibição de orgulho nacional a que
estamos assistindo nesses dias, pode permitir à Itália sair do “déficit” de
credibilidade internacional que danifica fatalmente sua imagem. Enquanto tal
medida não se concretizar, justiça não poderá ser feita e o pedido de
extradição de ex-terroristas aparecerá fatalmente como atalhos vexatórios,
quando não como tentativas mentirosas de reescrever a história


Saverio ANSALDI – Università di Montpellier III


Carlo ARCURI – Università di Amiens


Giorgio PASSERONE – Università di Lille III


Luca SALZA – Università di Lille III.

Notas


[1] Alberto Asor Rosa é um intelectual conhecido na esquerda italiana desde
os anos sessenta. No final dos anos setenta, como quadro do Partido
Comunista Italiano, defendia posições teóricas que buscavam se contrapor ao
protagonismo nas lutas sociais dos sujeitos do qual Cesare Battisti fazia
parte. Vide sua teoria da “primeira” e “segunda sociedade”. (N. do T.)


[2] Partido formado no pós-guerra por aderentes do fascismo. Foi na prática
o partido fascista italiano até sua dissolução na Aliança Nacional em 1995.
(N. do T.).


[3] Gladio era o nome de uma operação clandestina da OTAN no pós-guerra, com
objetivos anti-comunistas. Entre suas ações estavam atentados com chamada
“bandeira trocada”. P2 era uma loja maçônica, envolvida com a Operação
Gladio, com a máfia e em escândalos financeiros. O ‘Piano solo’ foi um plano
no qual a Gladio esteve envolvida e que conseguiu tirar do governo italiano
os ministros socialistas, em 1964. (N. do T.).
2011/1/15 Marcus S. Wolff <m_swolff em hotmail.com>

>  ....e dá para separar a arte, a cultura e a música da vida e do contexto
> em que foram produzidas?! o prof Antunes está certo até porque a política
> também é uma arte! rs
>
>
-- 
Carlos Palombini
cpalombini em gmail.com
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