[ANPPOM-Lista] Posição de docentes quanto às politicas de cotas

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Qua Dez 26 15:26:25 BRST 2012


 

 

O editorial desta data (26/12/2012) OESP, especificamente “Cotas nas
universidades paulistas”, cita posição de colegiados e de ‘vários docentes’
das universidades estaduais paulistas de uma maneira que me causou
estranhamento.  

 

Cito excerto: “.../ Historicamente, os órgãos colegiados da USP, Unicamp e
Unesp sempre foram contrários à adoção de políticas de cotas nos
vestibulares, alegando que elas distorcem os resultados dos exames,
comprometem o princípio de mérito e colocam em salas de aula alunos
despreparados.  Vários docentes receberam com reservas esse programa de
inclusão social. Serão decisivas as reuniões das congregações das faculdades
mais importantes, como as de Medicina, Direito e Engenharia. /...”

 

Sou membro de vários colegiados em minha universidade, em vários niveis, e
tenho claro em minha memória que em todas as oportunidades em que ocorreu a
discussão a respeito de cotas para ingresso na universidade, o principal
motivo de questionamento era o de estar implementando um procedimento para
remediar um problema sem sanar sua causa. ‘Colocar alunos despreparados em
salas de aula’ é uma das consequências disso, mas não algo a ser observado e
tratado em si e de forma restrita, senão visto num contexto amplo diante de
uma situação complexa. 

 

‘Comprometer o princípio de mérito’ e ‘distorcer os resultados do exame de
vestibular’ são alegações que podem até ter ocorrido, mas são irrelevantes
em relação ao eixo de pensamento, uma vez que o cerne da questão, sempre bem
aceito por todos, era ‘buscar uma solução para combater uma desigualdade e
uma injustiça’. 

 

Em todos os debates foi unânime a aprovação de que uma educação fortalecida
pela revitalização das escolas públicas nos níveis fundamental e médio teria
um impacto marcante e decisivo sobre essa exclusão que se busca combater.
Sempre perguntamos onde está o compromisso do estado (em nível federal,
estadual e municipal) que deveria cumprir as metas estabelecidas quanto ao
percentual orçamentário dedicado à educação. Se fossem de fato cumpridos, de
forma responsável e eficiente, a desigualdade não estaria na situação em que
se encontra atualmente.

 

O que os colegiados e os membros da comunidade acadêmica desejam, não é que
a prova seletiva que elaboram seja aplicada exibindo sua elegância e a
consistência de seus métodos. O que zelamos sempre em nosso método de
trabalho é que antes de adotar e aplicar um procedimento, este deve ser
suficiente e consistentemente testado e validado. Em políticas públicas esse
rigor seria uma prevenção para que, com o tempo, grandes soluções anunciadas
com alarde não se revelem ineficientes, senão inócuas.

 

Se temos alunos na sala de aula com dois níveis de preparação distintos,
isso poderia até ser trabalhado. Temos condições e potencial criativo para
encontrar soluções. Mas não queremos sair precipitadamente empurrando o
caminhão, antes de ter certeza de que o motor dele de fato não pode
funcionar, ou que pelo menos o freio de mão seja solto. Queremos que, antes
disso, as obrigações do estado (Federação, Estado e Município) sejam
cumpridas. No costume dos índios, o cacique era o primeiro a se levantar e a
realizar a tarefa árdua que ninguém queria fazer. Depois dele, todos se
erguiam e se punham a trabalhar.  

 

Por outro lado, como docente e pesquisador, nunca ousaria dizer que uma área
do conhecimento pudesse ser mais importante do que outra. Simplesmente
porque o universo, com sua estrutura e seus fenômenos, segue seu curso
normal, independentemente da taxonomia que os homens inventaram para vê- lo,
entendê-lo e explicá-lo, da mesma forma como aves, mamíferos, anfíbios,
insetos, plantas e demais formas de vida seguem vivendo, se reproduzindo e
evoluindo à revelia das frequentes e rápidas variações das classificações
que lhes aplicam. 

 

José Augusto Mannis (docente Instituto de Artes, Depto. de Música, Unicamp)

 

 

 

 

 

_____________________________________

 

Prof. Dr. José Augusto Mannis

Universidade Estadual de Campinas - Unicamp

Instituto de Artes

Depto. de Música

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+55 (19) 8116-3160 

RID: B-9522-2012

ORCID: 0000-0002-9484-5674

 

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