[ANPPOM-Lista] RES: Polarização das áreas do conhecimento na Universidade

jamannis em uol.com.br jamannis em uol.com.br
Sex Dez 28 12:55:06 BRST 2012


Prezado Daniel Cerqueira,

 

Não tive a pretensão de desejar que a comunidade acadêmica ou a sociedade tivessem mais apreço pelo fazer musical desalinhado da industria cultural de massa, o que implicaria numa mudança de escuta e de analise do que estão ouvindo.

 

Mesmo se me espanta muito o nível de desinformação de algumas elites superiores universitárias... 

 

(Se fizéssemos uma avaliação do conhecimento musical de nossa administração superior universitária e mesmo da administração superior cultural (secretarias, ministério, agências, órgão de fomento...) me pergunto quanto poderiam distinguir um excerto musical Barroco de um Romântico, ou dizer o que sabem sobre um Xote ou uma Guarânia. )

 

... o que busquei focar não era isso.

 

 

Mas sobretudo, como os campos do saber se entrelaçam e a estrutura da totalidade se permeia entre as áreas que (desde Aristóteles) se consolidaram e que neste momento estejam estranguladas de tanto esticadas, retorcidas e deformadas. 

 

Um dos aspectos dessa estrutura comunicante entre campos do saber é o da criatividade como heurística aplicada. Nas unidades universitárias, a área de Artes trabalha intensamente a criatividade de forma sistemática. Temos desenvolvido métodos, estratégias, procedimentos através de uma infinidade de abordagens para ter algum domínio sobre o processo para se chegar ao Achado (Eureka).

 

Se sabemos exercitar, treinar e educar a invenção de artistas, poderíamos também aplicar isso para físicos, médicos, engenheiros e advogados. 

 

Esse potencial ainda não foi percebido pela comunidade acadêmica, que acaba se lembrando de seu instituto de artes para demandas do entretenimento, por exemplo quando precisa de uma agrupação musical para uma inauguração ou uma comemoração ou ir a um espetáculo para relaxar a cabeça após um dia intenso de trabalho.

 

A maneira e a sistemática que adotamos para resolver problemas criativos são solução para muitas buscas das outras áreas.

 

Mas para que isto apareça e aconteça, é necessário, antes de tudo, que nós possamos acreditar em nós mesmos e termos a coragem e a determinação de bancar nossa posição e acreditarmos em nosso taco.

 

Abraços

 

Mannis

 

 

 

 

 

 

 

De: anppom-l-bounces em iar.unicamp.br [mailto:anppom-l-bounces em iar.unicamp.br] Em nome de Daniel Lemos
Enviada em: quinta-feira, 27 de dezembro de 2012 14:47
Para: anppom-l em iar.unicamp.br
Assunto: [ANPPOM-Lista] Polarização das áreas do conhecimento na Universidade

 



Caros colegas,

O prof. José Mannis tocou em outro assunto muito importante para discussão: a valorização de áreas do conhecimento específicas dentro da Universidade.

Já basta a supervalorização que a sociedade brasileira dá pra áreas como Medicina, Engenharia e Direito; a Universidade tem (ou deveria ter) o papel transformador de reforçar a importância de cada área e dar o exemplo à sociedade. Mas ao invés disso, vê-se que ela é na verdade uma mera reprodução das práticas que já existem.

As áreas de Artes então, estas são sempre o "patinho feio": só dão gastos e sua produção não visa à aplicação imediata em massa. Não existe nenhum tipo de incentivo à produção artística se ela não estiver vinculada ou adequada a projetos de pesquisa ou extensão (creio que deveria haver um tipo de projeto específico voltado à produção artística, legalmente institucionalizado). E fora da Universidade, a produção artística tem que se adequar aos padrões de mercado, com nossas geniais "Leis de Incentivo" (ou seja: os artistas não merecem uma política cultural digna; tem de viver de "incentivo" ou caridade das empresas). Se não houver resistência, daqui a 50 anos o país será feito de Micheis Teló e de "estudiosos acadêmicos da Música".

 Tem um ditado que um de nossos alunos criou, sabiamente: "a sociedade pensa que o músico é uma prostituta: tem que viver para dar prazer aos outros".



Daniel Cerqueira

 <http://musica.ufma.br> http://musica.ufma.br


--- Em qua, 26/12/12, jamannis em uol.com.br <jamannis em uol.com.br> escreveu:


De: jamannis em uol.com.br <jamannis em uol.com.br>
Assunto: [ANPPOM-Lista] Posição de docentes quanto às politicas de cotas
Para: "'ANPPOM'" <anppom-l em iar.unicamp.br>
Data: Quarta-feira, 26 de Dezembro de 2012, 15:26

 

 

O editorial desta data (26/12/2012) OESP, especificamente “Cotas nas universidades paulistas”, cita posição de colegiados e de ‘vários docentes’ das universidades estaduais paulistas de uma maneira que me causou estranhamento.  

 

Cito excerto: “.../ Historicamente, os órgãos colegiados da USP, Unicamp e Unesp sempre foram contrários à adoção de políticas de cotas nos vestibulares, alegando que elas distorcem os resultados dos exames, comprometem o princípio de mérito e colocam em salas de aula alunos despreparados.  Vários docentes receberam com reservas esse programa de inclusão social. Serão decisivas as reuniões das congregações das faculdades mais importantes, como as de Medicina, Direito e Engenharia. /...”

 

Sou membro de vários colegiados em minha universidade, em vários niveis, e tenho claro em minha memória que em todas as oportunidades em que ocorreu a discussão a respeito de cotas para ingresso na universidade, o principal motivo de questionamento era o de estar implementando um procedimento para remediar um problema sem sanar sua causa. ‘Colocar alunos despreparados em salas de aula’ é uma das consequências disso, mas não algo a ser observado e tratado em si e de forma restrita, senão visto num contexto amplo diante de uma situação complexa. 

 

‘Comprometer o princípio de mérito’ e ‘distorcer os resultados do exame de vestibular’ são alegações que podem até ter ocorrido, mas são irrelevantes em relação ao eixo de pensamento, uma vez que o cerne da questão, sempre bem aceito por todos, era ‘buscar uma solução para combater uma desigualdade e uma injustiça’. 

 

Em todos os debates foi unânime a aprovação de que uma educação fortalecida pela revitalização das escolas públicas nos níveis fundamental e médio teria um impacto marcante e decisivo sobre essa exclusão que se busca combater. Sempre perguntamos onde está o compromisso do estado (em nível federal, estadual e municipal) que deveria cumprir as metas estabelecidas quanto ao percentual orçamentário dedicado à educação. Se fossem de fato cumpridos, de forma responsável e eficiente, a desigualdade não estaria na situação em que se encontra atualmente.

 

O que os colegiados e os membros da comunidade acadêmica desejam, não é que a prova seletiva que elaboram seja aplicada exibindo sua elegância e a consistência de seus métodos. O que zelamos sempre em nosso método de trabalho é que antes de adotar e aplicar um procedimento, este deve ser suficiente e consistentemente testado e validado. Em políticas públicas esse rigor seria uma prevenção para que, com o tempo, grandes soluções anunciadas com alarde não se revelem ineficientes, senão inócuas.

 

Se temos alunos na sala de aula com dois níveis de preparação distintos, isso poderia até ser trabalhado. Temos condições e potencial criativo para encontrar soluções. Mas não queremos sair precipitadamente empurrando o caminhão, antes de ter certeza de que o motor dele de fato não pode funcionar, ou que pelo menos o freio de mão seja solto. Queremos que, antes disso, as obrigações do estado (Federação, Estado e Município) sejam cumpridas. No costume dos índios, o cacique era o primeiro a se levantar e a realizar a tarefa árdua que ninguém queria fazer. Depois dele, todos se erguiam e se punham a trabalhar.  

 

Por outro lado, como docente e pesquisador, nunca ousaria dizer que uma área do conhecimento pudesse ser mais importante do que outra. Simplesmente porque o universo, com sua estrutura e seus fenômenos, segue seu curso normal, independentemente da taxonomia que os homens inventaram para vê- lo, entendê-lo e explicá-lo, da mesma forma como aves, mamíferos, anfíbios, insetos, plantas e demais formas de vida seguem vivendo, se reproduzindo e evoluindo à revelia das frequentes e rápidas variações das classificações que lhes aplicam. 

 

José Augusto Mannis (docente Instituto de Artes, Depto. de Música, Unicamp)

 

 

 

 

 

_____________________________________

 

Prof. Dr. José Augusto Mannis

Universidade Estadual de Campinas - Unicamp

Instituto de Artes

Depto. de Música

jamannis em uol.com.br

+55 (19) 8116-3160 

RID: B-9522-2012

ORCID: 0000-0002-9484-5674

 


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