[ANPPOM-Lista] RES: Posição de docentes quanto às politicas de cotas

Ale Fenerich fenerich em gmail.com
Sáb Dez 29 15:40:49 BRST 2012


Respondo com calma às ótimas provocações... o assunto é prioritário, me
parece...


Sim Mannis! No meu (nosso) tempo de Unicamp, a impressão que eu tenho é que
os professores mais criativos vinham com as bombas para destruir a ponte
que unia um conhecimento estável e monótono herdado dos conservatórios com
um futuro bonachão. Hoje me parece, ao menos nas federais, que os
professores que vêm com a bomba nas mãos constatam que não há ponte,
fundamento, nem mesmo projeto, e que é preciso construí-la. Em quatro anos,
sobra pouco tempo para explodí-la.

Isto quer dizer que um curso superior cumpre o papel da educação básica.
Nos nossos cursos talvez isso não seja dramático, como disse o Silvio. Numa
engenharia, um aluno sem fundamentos em matemática de segundo grau vai
pastar nos cálculos, sendo consistentemente reprovado. Eu concordo com
Silvio: não faz mal ensinarmos teoria musical, leitura, rítmica muito
básica (eu tenho feito isso); a Universidade não precisa formar apenas
compositores e intérpretes. No entanto, o desafio talvez esteja em ensinar
isso com qualidade, pouco tempo e de modo a não constranger os alunos. Isso
sim é sambar miudinho...

Em Juiz de Fora não temos cursos regulares e com a qualidade dos da
Unibanda ou da ULM; parece-me que será a licenciatura em música (a ser
criada na UFJF em breve) que cumprirá esse papel. Há portanto uma tendência
a pensar que a licenciatura seria uma graduação mais fraca, que permite com
que alunos sem formação musical nela se inscrevam e concluam um curso
genérico em música. E há a tendência apontada pelo Daniel em tentar se
extinguir a prova específica em música.

A meu ver, este pacote de entendimento da licenciatura em música (que vem
das reitorias, alinhadas com o governo federal e ávidas por inserção
social) é totalmente equivocado. Um curso de licenciatura em música pode
vir a ser genérico sim, mas não deve ser de má qualidade, e além disso deve
exigir a mesma prova em conhecimentos específicos (pelo menos em teoria
musical) dos bacharelados, fazendo com que seus ingressantes tenham o mesmo
comprometimento musical que seus colegas bacharéis.

Enfim... perdoem o saco de gatos, mas creio que os assuntos cotas,
licenciaturas e politicas de inserção em massa são interligados, fazendo
com que os pensemos como um bloco.

ASF

Em 29 de dezembro de 2012 13:17, silvio ferraz
<silvioferrazmello em gmail.com>escreveu:

> concordo com o alê no que diz respeito a uma projeção futura.
>
> no momento, a unicamp tem um sistema (o profis) que seleciona alunos do
> ensino médio de escolas públicas conforme seus resultados de enem; há
> também o upa (universidade portas abertas) quando justamente estes alunos
> visitam a unicamp e conhecem os cursos. Em janeiro acontece o ciência&artes
> nas férias, sempre oferecemos a alunos do ensino médio cursos de música.
> Além disto desde um bom tempo temos a Unibanda (hoje Escola Livre de
> Música) que dá aulas de instrumento (melhor até que no departamento) para
> jovens geralmente de bandas da região ou gente que vem de Tatuí.
>
> também temos estas diferenças entre o aluno com mais ou menos experiência
> musical. Isto sempre existiu, no tempo em que estudei era assim também.
> somos um curso pequeno e a questão das cotas deverá mesmo é incidir sobre
> cursos fortes (medicina, engenharia) e cursos muito pequenos ainda
> (nutrição, enfermagem).
>
> mas vejo a coisa com bons olhos, acho que a universidade não é apenas para
> o músico de carreira (compositor-instrumentista), é também para aquele que
> vai migrar para a sonologia, que vai ser musicólogo e é nossa obrigação
> ensinar estas coisas que são simples (harmonia, contraponto e história da
> música)… bem mais simples que as exigências em física e química.
> o que precisamos é redesenhar nossos cursos diferentemente daquilo que
> herdamos dos conservatórios… e isto sim é urgente, com um novo desenho do
> curso de música veremos que as cotas não alterarão em nada o curso de nosso
> trabalho (além do que atualmente no departamento de música temos 45% dos
> alunos que se enquadrariam na política de cotas, e justamente eles os
> músicos de carreira).
>
> no campo político talvez a questão seja outra, bem distante desta que
> discutimos: dar um golpe ao sistema de cotas federal…  as 3 universidades
> oferecem um college que seleciona à sua maneira os alunos de escolas
> públicas dois anos antes do vestibular conforme notas no enem, garante
> assim que um bom número de prováveis cotistas estejam mais bem preparados
> para o ingresso na universidade… ou seja, o sistema canhestro é substituído
> por outro em que ainda se tem como critério o preparo do aluno para
> prosseguir em um curso superior…. e com isto alkmin garante seu lugar entre
> dilma e aécio….
>
> abs
> silvio
>
>
> On Dec 28, 2012, at 12:00 PM, <jamannis em uol.com.br> <jamannis em uol.com.br>
> wrote:
>
> Caro Alexandre,****
> ** **
> Você expôs um claro exemplo de como está empurrando um veículo encalhado
> com o freio de mão acionado.****
> ** **
> Se o condutor pudesse, de sua cabine (refrigerada), pelo menos soltar o
> freio de mão, aqueles que estão sob o sol e com os pés no chão, teriam mais
> eficiência para seu esforço.****
> ** **
> Mannis****
> ** **
> ** **
> *De:* Ale Fenerich [mailto:fenerich em gmail.com]
> *Enviada em:* quinta-feira, 27 de dezembro de 2012 12:49
> *Para:* jamannis em uol.com.br
> *Cc:* ANPPOM
> *Assunto:* Re: [ANPPOM-Lista] Posição de docentes quanto às politicas de
> cotas****
> ** **
> Caro Mannis e demais colegas,
>
>
> Gostaria de expor minha pobre análise a este respeito de modo bem direto,
> sem a elegância de sua mensagem mas de forma explícita.
>
> No trabalho que temos desenvolvido na Federal de Juiz de Fora, o sistema
> de cotas traz desafios muito grandes para os docentes. De fato temos
> classes cujos alunos possuem diversos níveis de maturidade musical. Isso
> faz com que tenhamos que elaborar estratégias diversas para tentar sanar
> essa desigualdade, muitas vezes profunda. Há alunos, por exemplo, com
> dificuldades imensas em assuntos muito básicos, da educação fundamental.
> Como professores de música, nossa obrigação é tentar contornar estes
> problemas, e nem sempre é fácil, pois estas lacunas se refletem no modo
> como aprendem.
>
> Entretanto, em comparação com a minha própria formação, realizada na
> Unicamp nos anos 90, temos hoje uma estrutura social mais horizontal, na
> qual há menos competição entre os alunos e mais colaboração entre eles,
> principalmente entre os cotistas. Há também uma distância entre os alunos
> "profissionais" de música e aqueles que tiveram menos recursos de formação,
> a qual temos que tentar equilibrar. Esta distância passa por uma arrogância
> de alguns alunos mais maduros musicalmente (e talvez menos maduros enquanto
> cidadãos), os quais desprezam os demais e, consequentemente, acabam por
> desprezar o curso e os esforços de aprendizado geral.
>
> Enfim, são notas sobre um panorama geral, nas quais observo mais valores
> positivos que negativos. São o preço de uma democratização do ensino
> superior realizada talvez de forma um pouco canhesca no Brasil, mas que
> talvez tenha resultados positivos em 10, 15 anos. Assim espero.
>
> Colegas de federais, alguma opinião a respeito?
>
> Um abraço!
>
>  ****
> Em 26 de dezembro de 2012 15:26, <jamannis em uol.com.br> escreveu:****
>  ****
>  ****
> O editorial desta data (26/12/2012) OESP, especificamente “Cotas nas
> universidades paulistas”, cita posição de colegiados e de ‘vários docentes’
> das universidades estaduais paulistas de uma maneira que me causou
> estranhamento. ****
>  ****
> Cito excerto: *“.../ Historicamente, os órgãos colegiados da USP, Unicamp
> e Unesp sempre foram contrários à adoção de políticas de cotas nos
> vestibulares, alegando que elas distorcem os resultados dos exames,
> comprometem o princípio de mérito e colocam em salas de aula alunos
> despreparados.**  Vários docentes receberam com reservas esse programa de
> inclusão social. Serão decisivas as reuniões das congregações das
> faculdades mais importantes, como as de Medicina, Direito e Engenharia.
> /...”*****
> * *****
> Sou membro de vários colegiados em minha universidade, em vários niveis, e
> tenho claro em minha memória que em todas as oportunidades em que ocorreu a
> discussão a respeito de cotas para ingresso na universidade, o principal
> motivo de questionamento era o de estar implementando um procedimento para
> remediar um problema sem sanar sua causa. ‘Colocar alunos despreparados em
> salas de aula’ é uma das consequências disso, mas não algo a ser observado
> e tratado em si e de forma restrita, senão visto num contexto amplo diante
> de uma situação complexa.****
>  ****
> ‘Comprometer o princípio de mérito’ e ‘distorcer os resultados do exame de
> vestibular’ são alegações que podem até ter ocorrido, mas são irrelevantes
> em relação ao eixo de pensamento, uma vez que o cerne da questão, sempre
> bem aceito por todos, era ‘buscar uma solução para combater uma
> desigualdade e uma injustiça’.****
>  ****
> Em todos os debates foi unânime a aprovação de que uma educação
> fortalecida pela revitalização das escolas públicas nos níveis fundamental
> e médio teria um impacto marcante e decisivo sobre essa exclusão que se
> busca combater. Sempre perguntamos onde está o compromisso do estado (em
> nível federal, estadual e municipal) que deveria cumprir as metas
> estabelecidas quanto ao percentual orçamentário dedicado à educação. Se
> fossem de fato cumpridos, de forma responsável e eficiente, a desigualdade
> não estaria na situação em que se encontra atualmente.****
>  ****
> O que os colegiados e os membros da comunidade acadêmica desejam, não é
> que a prova seletiva que elaboram seja aplicada exibindo sua elegância e a
> consistência de seus métodos. O que zelamos sempre em nosso método de
> trabalho é que antes de adotar e aplicar um procedimento, este deve ser
> suficiente e consistentemente testado e validado. Em políticas públicas
> esse rigor seria uma prevenção para que, com o tempo, grandes soluções
> anunciadas com alarde não se revelem ineficientes, senão inócuas.****
>  ****
> Se temos alunos na sala de aula com dois níveis de preparação distintos,
> isso poderia até ser trabalhado. Temos condições e potencial criativo para
> encontrar soluções. Mas não queremos sair precipitadamente empurrando o
> caminhão, antes de ter certeza de que o motor dele de fato não pode
> funcionar, ou que pelo menos o freio de mão seja solto. Queremos que, antes
> disso, as obrigações do estado (Federação, Estado e Município) sejam
> cumpridas. No costume dos índios, o cacique era o primeiro a se levantar e
> a realizar a tarefa árdua que ninguém queria fazer. Depois dele, todos se
> erguiam e se punham a trabalhar. ****
>  ****
> Por outro lado, como docente e pesquisador, nunca ousaria dizer que uma
> área do conhecimento pudesse ser mais importante do que outra. Simplesmente
> porque o universo, com sua estrutura e seus fenômenos, segue seu curso
> normal, independentemente da taxonomia que os homens inventaram para vê-
> lo, entendê-lo e explicá-lo, da mesma forma como aves, mamíferos, anfíbios,
> insetos, plantas e demais formas de vida seguem vivendo, se reproduzindo e
> evoluindo à revelia das frequentes e rápidas variações das classificações
> que lhes aplicam.****
>  ****
> José Augusto Mannis (docente Instituto de Artes, Depto. de Música, Unicamp)
> ****
>  ****
>  ****
>  ****
>  ****
>  ****
> _____________________________________****
>  ****
> Prof. Dr. José Augusto Mannis****
> Universidade Estadual de Campinas - Unicamp****
> Instituto de Artes****
> Depto. de Música****
> jamannis em uol.com.br****
> +55 (19) 8116-3160****
> RID: B-9522-2012****
> ORCID: 0000-0002-9484-5674****
>  ****
>
> ________________________________________________
> Lista de discussões ANPPOM
> http://iar.unicamp.br/mailman/listinfo/anppom-l
> ________________________________________________****
>
>
>
> --****
> ------------------------------------------****
> Alexandre Sperandéo Fenerich****
> prof. Adjunto IAD - UFJF - http://www.ufjf.br/musica/****
> ** **
> http://soundcloud.com/ale_fenerich****
> http://sussurro.musica.ufrj.br/fghij/f/fenerichale/fenerichale.htm****
> n-1.art.br****
> http://soundcloud.com/n-1-1 ****
> http://www.ufjf.br/eimas/****
> http://www.ufjf.br/tecartes/****
> http://www.limiares.com.br/duo-n1.html****
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> (55 32) 8481-8277****
> ** **
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