[ANPPOM-Lista] SOS MÚSICA MARANHENSE - SÃO LUÍS 400 ANOS

Daniel Lemos dal_lemos em yahoo.com.br
Seg Set 10 19:08:09 BRT 2012




Caros,

 

A cidade
de São Luís/MA está completando 400 anos. Como festa comemorativa, a Secretaria
de Cultura do Estado pagou mais de 10 milhões de reais (pelo que se diz, já que
não existe nenhuma política de transparência das finanças estaduais – e muito
menos Editais) em shows de artistas reconhecidos como Roberto Carlos, Ivete
Sangalo e Gilberto Gil. Obviamente nada contra a reputação destes grandes
artistas brasileiros, mas contra a escolha arbitrária feita pela administração
pública maranhense. Além disso, destaca-se a apresentação da Orquestra
Sinfônica Brasileira (OSB), adotando “repertório maranhense”, ou seja: arranjo
de estilos como Bumba-meu-Boi, Tambor de Crioula, Cacuriá e Caixa do Divino,
entre outros. Provavelmente a OSB recebeu um bom incentivo para tocar um
repertório que está completamente fora de sua proposta artística. E obras de
compositores maranhenses como Leocádio Rayol, Antônio Rayol, Elpídio Pereira,
João Nunes e Ignácio Cunha – representantes dignos da cultura maranhense –
ficaram de fora.

 

Na
contramão deste propagandismo ufanista da administração estadual, temos uma
Escola de Música fechada desde Dezembro de 2011, que tem sido a grande responsável
pela formação de músicos maranhenses – muitos deles inclusive que tocam em
festejos folclóricos patrocinados pelo Estado, demorando até cinco meses para receber, quando recebem. Alguns
estão em outros Estados, outros foram para a Europa seguir carreira, e não há
perspectivas de que eles retornem tão cedo. E assim como fora com Elpídio
Pereira – que no final do século XIX, após inúmeras tentativas de apoio no
Maranhão, só conseguiu ir estudar na Europa graças a uma bolsa do governo do
Amazonas – perpetua-se a tradição local de não
investir no artista local. Não há 500 mil reais para realizar uma reforma
do prédio da Escola de Música, mas há oito
milhões para a Beija-Flor de Nilópolis desfilar com o tema do “Bumba-meu-Boi”
no concurso de Escolas de Samba do Rio de Janeiro, desperdiçando dinheiro do
contribuinte maranhense como se sua cultura precisasse do crivo de artistas de
outras regiões para se afirmar... e vinte mil reais para fazer uma Semana de
Cordas com instrumentistas brasileiros renomados?

 

O músico
maranhense está cansado de trabalhar por “amor à profissão”, lidando em seu
cotidiano com situações precárias e com o mais absoluto descaso do governo e
das grandes empresas – que obviamente se alinham com as políticas públicas de
Cultura em um país extremamente protecionista ao empresário com estes impostos
pesadíssimos, em prol de seu interesse maior: lucro e publicidade.
Que alternativas restam ao músico maranhense para que possa viver com DIGNIDADE e RESPEITO À SUA PROFISSÃO em seu próprio Estado? Um Estado
que, através de suas políticas, delega o próprio artista maranhense à
mediocridade, condições precárias de trabalho e o mais absoluto descaso
profissional, se diz “defensor da cultura maranhense”?

 

O mundo
está mudando, especialmente agora com as mídias digitais. Governos
autoritários, medidas repressoras, descaso com direitos humanos e fraudes tem
sua voz assegurada em e-mails, blogs e páginas de relacionamento. Ajude-nos a divulgar
esta situação lastimável em que se encontra o apoio ao artista no Estado do Maranhão – este sim,
representante da cultura maranhense de fato. Por favor, encaminhe este e-mail para toda a sua lista e contribua para
que sejam tomadas providências!

 

Seguem
abaixo dois depoimentos de músicos maranhenses natos e verdadeiros batalhadores, que cansaram de esperar
por uma Orquestra Sinfônica no Estado do Maranhão, situação semelhante apenas a
Roraima e Amapá. Ao contrátio destes dois Estados, o Maranhão
já tem estrutura e pessoal suficiente para abrir uma orquestra; falta apenas contar
com a “caridade” da administração
pública.



Primeiro manifesto:

 

Gente,
vamos fazer uma campanha contra essa vergonha que é vermos nosso dinheiro
público "desaparecer" e não termos direito a uma Orquestra! 

 

A
situação só vai mudar se fizermos algo!...mesmo que comecemos por algo simples
como por adesivos Perfurados no vidro Traseiro de nossos carros...

 

 

algo do
tipo......

Que Vergonha!

 

                   
  O Maranhão não tem uma Orquestra Sinfônica!

 

.....os
turistas vão ler, e os maranhenses -que sequer se
dão conta de que o MA não possui orquestra- terão algo para ler enquanto
perdem horas e mais horas nos engarrafamentos! 

 

....chega
de ficar de braços cruzados!....a EMEM só está sendo reformada porque  os
professores se manifestaram!

 

Vivemos
num estado onde não dá para esperar pela iniciativa pública( a não ser claro,
que montemos algum bloco de carnaval, ou bumba-meu-boi)

 

 

Segundo manifesto:

 

Boi de
Orquestra....ou Orquestra do Boi?


Fiquei impressionado com a criatividade dos
organizadores e produtores musicais da programação cultural da Festa dos 400
anos de São Luís. Falo mais especificamente, do concerto “São Luís: 400 anos de
ritmo”, que teve a participação da Orquestra Sinfônica Brasileira do Rio de
Janeiro – OSB e de artistas maranhenses.

Nessa ocasião, a OSB apresentou um programa
com “sotaque” exclusivamente maranhense, composições de Ubiratan Sousa, Turíbio
Santos, entre outros, acompanhada por percussionistas e cantores locais. A
exceção foi a peça de abertura, “Parabéns São Luís”, de autoria do maestro
Mateus Araújo (RJ), mas que também, teve “inspiração” maranhense.

Um repertório desse gabarito é de
impressionar e de encher de orgulho a nós, maranhenses, por ver “nossa música”
sendo executada por uma das orquestras mais importantes do país.

Bem, seria isso mesmo que eu também sentiria
se não fosse o fato de que o Maranhão não possui uma orquestra sinfônica.
Explico.

Uma orquestra é a formação instrumental, por
excelência, para democratizar a música dita universal, obras de compositores de
vários lugares, épocas e estilos, que por seu valor histórico, artístico e
cultural, tornaram-se um patrimônio universal, a que todos deveriam ter acesso.
Entretanto, este é um direito, o qual vem sendo (e ouso dizer, por 400 anos!)
sistematicamente negligenciado ao povo maranhense. Direto que é negado, não só
pelo fato da inexistência de uma orquestra sinfônica no Maranhão, mas também
pela “ditadura” da cultura popular como única expressão artística com validade
real em nosso Estado.

O Povo Maranhense vive e faz música popular
365 dias por ano. A música folclórica do Bumba-meu-boi, do Tambor de Crioula,
entre outros tipos maranhenses já ultrapassaram os limites espaço-temporais do
Carnaval e do São João, acontecendo durante todo o ano e também, já gozam de
reconhecimento nacional e até internacional. Por tudo isso, consolidou-se como
uma expressão legítima e visceral da cultura maranhense, o que muito nos
alegra. Mas será que este mesmo Povo não merece conhecer Vivaldi, Bach, Mozart,
Beethoven, Schubert, Wagner, Tchaikovsky, Carlos Gomes, Villa-Lobos, Ernani
Aguiar, Francisco Mignoni, (certamente, todos fazem parte do repertório da
OSB), e mais Antônio Rayol, Elpídio Pereira, Pedro Growell entre outros,
artistas igualmente legítimos e viscerais da cultura universal, que
expressam/despertam as mais diversas emoções por meio da arte musical?

A música popular maranhense NÃO precisa da
OSB para se projetar para o resto do mundo, coisa que os grupos e artistas
locais já o fazem, e diga-se de passagem, muito melhor, com toda a sua
criatividade e originalidade e a despeitos das adversidades. No entanto, o Povo
Maranhense ainda precisa SIM da OSB para ter acesso ao patrimônio da música
universal.

Trazer uma orquestra sinfônica para São Luís,
para que ela se apresente, entre músicos, cantores e performances de
dançarinos, é colocar a música sinfônica em segundo plano, pois todos havemos
de concordar que nesse contexto, a orquestra foi apenas o suporte, o
acompanhamento dos cantores, dos dançarinos e dos “nomes pseudomaranhenses” que
estiveram no palco da Lagoa da Jansen, no dia 6 de setembro de 2012.

Por que será que a organização e os
produtores da Festa, não solicitaram a Gilberto Gil, a Zezé de Camargo e
Luciano, a Ivete Sangalo, a Alcione, a Zeca Pagodinho ou a Roberto Carlos que
também fizessem os seus shows exclusivamente com músicas maranhenses?

No entanto, tal “concepção artística” sobrou
para a OSB (atração que, como já dissemos, é a única porta-voz da música
universal) e que, politicamente, aceitou tal incumbência, a pedido da
organização e da produção da Festa dos 400 Anos e, obviamente, de seus
patrocinadores oficiais.

Perdemos mais uma raríssima chance de
ouvirmos obras, compositores, estilos musicais que fazem sim, parte de nossa
cultura e que somente (e infelizmente!) poucos, aqui em São Luís, tem acesso.

Este desabafo não é, de maneira alguma, um
ataque à música, ou à OSB, ou aos artistas locais que participaram do concerto.
Mas, um ATO DE REPÚDIO às circunstâncias e às instâncias que tal programa foi
concebido. E isso inclui, uma não representatividade legítima de artistas,
profissionais e instituições que efetivamente trabalham com música e que sabem
o valor da música universal para a formação de qualquer ser humano.

Completamos 400 anos. 400 anos de muitas
alegrias e conquistas. Mas também, de tristezas, de descasos, como a que
observamos nesta oportunidade em que o Povo Maranhense continua a ser subestimado,
onde os nossos líderes ainda impõem as ordens, ditam e rasgam regras, concedem
privilégios particulares e execram direitos coletivos.

Contagiado pela euforia deste momento
festivo, mas também, envolvido por um sentimento de pesar, é que lhe desejo


PARABÉNS, SÃO LUÍS!




Daniel Cerqueira

Professor de Piano da Universidade Federal do Maranhão (UFMA)


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