[ANPPOM-Lista] "Precisamos dizer quem está lucrando"

Camila Zerbinatti camiladuze em gmail.com
Sex Fev 26 11:25:04 BRT 2016


"Precisamos dizer quem está lucrando" tanto quanto "Precisamos falar sobre
a vaidade na vida acadêmica e artística", na medida em que os sistemas de
opressão operam de maneiras diversas mas igualmente nocivas e prejudiciais
para quem paga as contas (monetárias, morais, éticas, humanas, emocionais,
profissionais).

Saudações cordias,
Camila.

Em 26 de fevereiro de 2016 11:04, Camila Zerbinatti <camiladuze em gmail.com>
escreveu:

> Caro Professor Damián,
>
> Agradeço muito tua observação. Entendo o que você coloca e também vejo o
> que você diz, que é inegável.
> Mas, apesar de também discordar da autora neste ponto, como você, vejo que
> ela levanta outras questões urgentes no texto. Questões que são discutidas
> e debatidas por muitas alunas e muitos alunos nas universidades públicas e
> privadas mas que, até então, não víamos serem levantadas por professoras e
> professores.
> Neste sentido, das questões que ela aponta antes de traçar este cenário
> fantasioso, e na direção que você aponta ao abordar a comercialização do
> ensino superior custeada por impostos, acho muito válido compartilhar aqui
> o recente discurso de formatura de Marcelo Caetano, cientista político
> graduado pela UnB, homem trans e homem negro brasileiro, o primeiro aluno
> formado pela UnB que conquistou o direito de usar seu nome social naquela
> Universidade: (envio a transcrição e o link para o vídeo)
>
> "*querida academia*
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
> *do alto dos seus títulosdaí de onde você vêa universidade é pra quê?pra
> caber quem?dentro da sua salavocê se escondepra não ver lá foraou pra quem
> tá lá fora não te ver?o conhecimento que você produzé pro povo ou pro
> cnpq?pra sociedade ou pra enfeitar teu lattes?*
> se quem tá dentro
> não vê os muros em volta
> quem vê de fora
> não enxerga nada além da muralha
> se no meio da aula
> você diz que eu tô todo errado
> eu te digo que pra chegar até aqui
> atravessei cerca de arame farpado
> você escreve
> artigo, livro, capítulo
> resumo, paper, ensaio
> fala da gente
> sem nem lembrar
> de olhar no olho da nossa gente
> alcança seus índices de produtividade
>
>
>
>
>
>
>
>
> *no dia seguinte,não sabe nossa cara,nosso nome, desconhece nossa
> identidadenossa cor é objeto de pesquisanosso sexo, etnografianossas casas
> são seu campoe seu olharbranco, macho, eurocentradojustifica-se como
> metodologia*
>
>
>
>
>
>
>
> *na sua nota da capeso que conta mais:seus pontos ou nossa voz?sua tese ou
> nossa história?o que vale mais:suas oito páginas de referênciaou a nossa
> ancestral experiência?*
>
> e não pense que entramos aqui por favor
> que não merecemos
> ou que qualquer coisa aqui nos foi dada
>
> *cotas não são presentesão só um pequeno pedaço do que nos devem*
> chegamos aqui forjados
> pelos que nos precederam
> não se esqueçam:
> nossos passos vêm de longe
> se estou aqui hoje
> é só porque tantos outros já vieram
> erguer muros não vai nos impedir de entrar
> se precisar,
> nós vamos derrubar
> tomar de assalto o que é nosso
>
>
>
>
>
>
>
>
>
>
> *e não queremos só um lugar à mesaqueremos interromper o jantare começar
> tudo de novoreerguer uma universidade que seja do povo e para o povoonde
> não apenas se fale sobre o outromas onde o outro se torna um nós que é
> capaz de falar sobre si mesmonão criem a ilusão de que tudo que se diz na
> academia é a verdademas lembrem-se: é sempre poderinclusive, o poder de
> dizero que é a verdade*
> como cientistas políticos
> termos lugar para dizer o que é a democracia
> vivemos em uma, nossos professores vão dizer
> Estado Democrático de Direito é o seu nome
> Será mesmo?
> pois vamos aos fatos:
>
> Planaltina, Distrito Federal, 26 de Maio de 2013. Antonio Pereira de
> Araújo, auxiliar de serviços gerais, é detido em abordagem padrão.
> Conduzido à delegacia, nunca mais foi visto.
> Rocinha, Rio de Janeiro, 14 de Julho de 2014. Amarildo Dias de Souza,
> pedreiro, limpava peixe na porta de casa quando policias que conduziam a
> operação “Paz Armada” o abordaram. Nunca mais foi visto.
>
> Grajaú, São Paulo, 16 de Outubro de 2015. Yago Pedrosa Araújo, estudante
> de 16 anos, é parado em mais uma abordagem daquelas: padrão! 4 dias depois
> é encontrado morto, executado. Nunca mais foi visto vivo.
>
> Infelizmente, a lista poderia continuar: Cláudia Ferreira da Silva,
> Cristian do Carmo, Rafael de Souza Paulino, Roberto de Souza Penha, Carlos
> Eduardo da Silva de Souza, Wilton Domingos Junior, Cleiton Correa de Souza
> e tantos outros.
>
> Os mortos da democracia se acumulam
> Já não se escondem mais nos porões
> Mas ficam expostos, em plena luz do dia
> Nas vielas de uma quebrada qualquer
>
> *Se a Democracia existe, ela não é para todosMas hoje, saímos daqui com o
> poder de dizer o que é a democracia*
>
>
>
> *É nossa a responsabilidade de combater esse genocídioUm genocídio que
> começa aqui dentroQuando são brancos todos os nossos professoresQuando é
> branca e masculina toda a nossa bibliografia*
> Se a ciência pensa que tem todas as verdades
> Digo-lhe agora que não
> Que não sabe o que é caminhar com a cabeça na mira de uma HK
> Que não sabe o que é ter o corpo vendido por séculos
> Ter a mente diminuída, ver todo um povo destruído
> Essa ciência que trabalha com hipóteses
> E esquece que o que chama de objeto é feito da carne viva
> Ainda aguardamos pelo dia
> Em que o preto estará no rosto
> Mais do que nas becas
> Em que as travestis estarão na escola
> Mais do que na esquina
> Se esse dia não chega, a gente toma!
> Nada nunca foi dado, porque agora seria?
> mas ainda vai chegar o dia
> Em que outros tantos como eu
> Estarão aqui e poderão dizer
> Tudo nosso, nada deles!" Marcelo Caetano
>
> https://www.youtube.com/watch?v=sfZ2E7pR0ko
>
>
> Ao ouvir e ler Marcelo Caetano, não há como não lembrar das pesquisas do
> professor Carlos Palombini (e das professoras Adriana Facina e Mariana
> Vedder quando ele aponta o quanto "o funk carioca e o hip-hop paulista
> tensionam a produção da cultura popular." No discurso de Caetano, arrisco
> dizer, a expressão do hip-hop tensiona também a produção acadêmica e
> científica.
>
>
> Saudações cordiais,
> Camila.
>
> Em 25 de fevereiro de 2016 12:38, Dr. K <musicoyargentino em gmail.com>
> escreveu:
>
>> Cara Camila,
>>
>> Obviamente essa colega desconhece totalmente a realidade econômica
>> brasileira: "Hoje, o Brasil tem um dos cenários mais animadores do mundo.
>> Há uma nova geração de cotistas ou bolsistas Prouni e Fies, que veem a
>> universidade com olhos críticos, que desafiam a supremacia das camadas
>> médias brancas que se perpetuavam nas universidades e desconstroem os
>> paradigmas da meritocracia."
>>
>> Enquanto ela idealiza alunos que entram pela porta dos fundos ao sistema
>> de ensino superior, a empresa Kroton e seus associados tem o maior
>> rendimento do mundo de um conglomerado educacional, sustentado pelos nossos
>> impostos.
>>
>> Dr. Damián Keller | ccrma.stanford.edu/~dkeller
>> NAP | sites.google.com/site/napmusica
>>
>>
>>> Message: 2
>>> Date: Wed, 24 Feb 2016 11:48:10 -0300
>>> From: Camila Zerbinatti <camiladuze em gmail.com>
>>> To: "anppom-l em iar.unicamp.br" <anppom-l em iar.unicamp.br>, Ppgmus Udesc
>>>         <ppgmus.udesc em gmail.com>, Melita Bona <melitab em yahoo.com.br>
>>> Subject: [ANPPOM-Lista] "Precisamos falar sobre a vaidade na vida
>>>         acadêmica [e artística]"
>>> Message-ID:
>>>         <
>>> CAGiY0jThZ7_Yt6WAjxSjnBOUDmqUosRDXd820QJbWRiSGVvVwA em mail.gmail.com>
>>> Content-Type: text/plain; charset="utf-8"
>>>
>>> Olá para todas e todos,
>>>
>>>
>>> Compartilho aqui um texto que, para mim, é no mínimo muito corajoso,
>>> lúcido, urgente e transformador, ao abordar com franqueza situações
>>> recorrentes em nosso cotidiano artístico e acadêmico brasileiro. O texto
>>> "Precisamos falar sobre a vaidade na vida acadêmica", de Rosana
>>> Pinheiro-Machado, cientista social e antropóloga, professora do
>>> departamento de Desenvolvimento Internacional da Universidade de Oxford,
>>> foi publicado hoje na revista Carta Capital. Poderia ou deveria, penso
>>> eu,
>>> estar também em muitas revistas/ periódicos/ boletins/ informativos
>>> acadêmicos.
>>>
>>> *"Seria automático reproduzir os mecanismos que me podaram. É a vingança
>>> do
>>> oprimido. A única forma de cortamos isso é por meio da autocrítica
>>> constante. É preciso apontar superficialidade, mas isso deve ser um
>>> convite
>>> ao aprofundamento. Esquece-se facilmente que, em uma universidade, o
>>> compromisso primordial do professor é pedagógico com seus alunos, e não
>>> narcisista consigo mesmo.Quais os valores que imperam na academia?
>>> Precisamos menos de enrolação, frases de efeitos, jogo de palavras,
>>> textos
>>> longos e desconexos, frases imensas, ?donos de Foucault? [e de tantas
>>> outras coisas]. Se quisermos que o conhecimento seja um caminho à
>>> autonomia, precisamos de mais liberdade, criatividade, objetividade,
>>> simplicidade, solidariedade e humildade. (...) Tudo depende em quem
>>> queremos nos espelhar. A perversidade dos pequenos poderes é apenas uma
>>> parte da história. (...)" Rosana Pinheiro-Machado*
>>>
>>>
>>> http://www.cartacapital.com.br/sociedade/precisamos-falar-sobre-a-vaidade-na-vida-academica
>>>
>>> Saudações cordiais*,
>>> Camila Durães Zerbinatti
>>>
>>>
>>
>> ________________________________________________
>> Lista de discussões ANPPOM
>> http://iar.unicamp.br/mailman/listinfo/anppom-l
>> ________________________________________________
>>
>
>
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