[Dicasdeiluminacao-l] Vieux-Colombier Uma Luz Para o Teatro Brasileiro

Valmir Perez valmirperez em gmail.com
Ter Nov 18 14:12:12 BRST 2008


Prezado(a) assinante, bom dia,
Estou enviando abaixo excelente artigo de Ivo Godois e Vera Collaço, ambos
da Universidade do Estado de Santa Catarina.

O texto, que trata de um importante e pitoresco detalhe da história da
iluminação no Brasil,  também poder ser lido ou baixado em extensão pdf no
endereço
http://www.iar.unicamp.br/lab/luz/ld/C%eanica/Hist%f3ria/Artigo_jornada-Final.pdf


*Vieux-Colombier Uma Luz Para o Teatro
Brasileiro*[1]<file:///D:/Temp/Artigo_jornada-Final_Ivo%5b1%5d,5.doc#_ftn1>



Ivo Godois e Vera Collaço
(Orientadora)[2]<file:///D:/Temp/Artigo_jornada-Final_Ivo%5b1%5d,5.doc#_ftn2>





*RESUMO*: O Vieux-Colombie foi uma proposta inovadora tanto no espaço cênico
como para a formação do ator. Iniciado pelo Francês Jacques Copeau em 1913,
teve em seu aluno, Louis Jouvet um de seus grandes disseminadores. Este
também praticou experimentos com iluminação cênica. Como diretor passou pelo
Brasil demonstrando espetáculos que continham qualidades também na
iluminação, o que pode ter provocado interferência na montagem da peça
Vestido de Noiva realizada pelo grupo carioca Os Comediantes.



*PALAVRAS-CHAVES*: Iluminação Cênica, Luiz Jouvet, Teatro brasileiro.







            O teatro do Vieux-Colombier (Velho Pombal) iniciou suas
atividades na Paris dos anos de 1913, situado à margem esquerda do Rio Sena,
vizinho dos estabelecimentos escolares e universitários, próximo de um
bairro rico. Jacques Copeau instalou-se num espaço sem as características
extremamente adequadas à representação artística. Precisou adaptá-lo e
proceder à concretização de um espaço em consonância com a renovação
dramática a que almejava.

Copeau não inovou na proposta de criação desse espaço, mas conseguiu
consolidar um projeto meditado por muito tempo, e a partir do período em que
se manteve ativo deixou sua referência para os experimentos futuros. Antes
de sua reformulação espacial interna, o "Velho Pombal" já havia sido ocupado
por representações artísticas, quando ainda com o nome de *Athénée
Saint-Germain*. Desta vez, porém, alem da mudança do nome, no espaço
instalavam-se artistas cuja concordância intelectual e gosto comum da ação
os tornariam companheiros de luta, com o intuito de estabelecerem um ideal
para a formação do ator e para a atuação em equipe. Talvez querendo
distanciar-se do culto desenfreado do estrelismo, como afirma Roubine
(1998:52) Copeau procurava "erguer um teatro novo sobre alicerces intactos,
e limpar o palco de tudo quanto o suja e oprime". Para Copeau o espaço novo
deveria ser diferente dos teatros com arquitetura à italiana construídos no
século XIX e que continuavam sendo implantados no início do XX bem próximo
dele, nas edificações do T*héâtre des Champs-Elysées* (1911) e da *Comédie
des Champs-Elysées* (1913). Jacques Copeau consolidou propostas que já
haviam sido levantadas nas décadas anteriores, pois em 1890 o também francês
André Antoine denunciava a irracionalidade do espetáculo no espaço à
italiana, expondo assim os primeiros fragmentos críticos sobre a soberania
desse tipo de sala de representação.

Ao ser implantado, o teatro do Vieux-Colombier não chegou a transformar a
relação público-espetáculo, pois manteve a frontalidade. Já não apresentava,
porém, o palco separado da sala. Uma escada gerava uma espécie de
complemento de comunicação, um vínculo entre ambas e trazia na iluminação a
ligação da cena ao espectador. De fato, "a exemplo de Craig, a quem admira
profundamente, Copeau utiliza uma iluminação modulável, cuja fonte se situa
atrás do público, evitando assim o efeito de separação entre o espectador e
a caixa do palco que o uso da ribalta costuma suscitar" (Roubine, 1998, p.
86). Copeau também tinha conhecimento de outros projetos arquitetônicos e
práticas de iluminação em espaços experimentais através de Adolphe Appia,
com o qual mantinha proximidade. Em um
encontro[3]<file:///D:/Temp/Artigo_jornada-Final_Ivo%5b1%5d,5.doc#_ftn3>,
Adolphe Appia, expressou-lhe o fascínio que o exercera o projeto de
Emile-Jaques Dalcroze, desenvolvido em Hellerau, e os experimentos feitos
por este e por Appia no espetáculo *Orphée *(Orfeu).

Jaques-Dalcroze mandou construir, em Hellerau, nos arredores de Dresde, na
Suíça, um teatro concebido como um vasto ateliê pelo arquiteto H. Tessenow.
Dalcroze instalou na localidade sua Escola de Formação para a Música e para
o Ritmo. Desde 1898, Appia havia feito para Dalcroze projetos de disposição
de um espaço com diferentes planos. Alexander Salzmann fez a adaptação do
espaço de representação em 1911, inspirado nos projetos de Appia (para o
espetáculo *Orphée* (Orfeu) montado já em Genebra e não mais em Hellerau, da
qual Dalcroze havia se mudado. Salzmann acrescentou à adaptação um sistema
de iluminação aperfeiçoado para aquele espaço. Claudel entusiasmou-se ao
assistir o espetáculo e escreveu artigo na Nova Revista Francesa em 1913, da
qual Copeau era diretor. Detalhou a sala onde foi representado o espetáculo
*Orfeu* como um vasto retângulo onde não havia cenários fixos. Os elementos
cênicos se moviam e se encaixavam uns aos outros. Nas paredes e no teto
havia tecidos brancos esticados e, atrás destes, gambiarras com lâmpadas
elétricas em uma disposição retangular. A localização desses elementos
luminosos não deixava visíveis os focos de luz. Claudel também descreveu em
seu artigo a existência ao fundo da sala de uma mesa de luz, a qual permitia
que uma só pessoa, ao acompanhar o espetáculo, operasse a distribuição
luminosa que lhe parecesse necessária às cenas.

Com a criação da escola e seu sistema de repertório e alternância de
espetáculos em cada temporada, Copeau permanece como o primeiro a
concretizar a reforma do ensino do ator e a abrir caminho para outros, nesse
campo. Longe de ser contra a iluminação cênica, Copeau apenas não concordava
com o rumo de algumas pesquisas que se distanciavam das suas tentativas de
esvaziar o palco. Podemos perceber esse conhecimento na área da luz em
afirmações contidas no texto "O Teatro do Vieux Colombier"
[4]<file:///D:/Temp/Artigo_jornada-Final_Ivo%5b1%5d,5.doc#_ftn4>
.



Não que sejamos insensíveis à arte de criar uma atmosfera por meio da cor,
da forma e da luz. Aplaudimos, há três anos, a feliz iniciativa do Sr.
Jacques Rouché, que se esforçava, com o concurso de excelentes pintores,
para dotar o cenário de uma nova qualidade estética. Conhecemos as
pesquisas, acompanhamos os projetos e as realizações dos Srs. Meyerhold,
Stanislavski, Dântchenko na Rússia; dos Srs. MaxReinhardt, Littmann, Fuchs e
Erler na Alemanha; dos Srs. Gordon Craig e Granville Barker na
Inglaterra.




Copeau concentrava esforços na encenação voltada ao trabalho de
interpretação, e negava a importância de toda e qualquer maquinaria.
Acreditava que apaixonar-se por invenções de engenheiros ou de eletricistas
seria conceder uma importância maior aos elementos cênicos e à disposição
das luzes, o que levaria a cair nos truques. Dentre seus vários alunos e
seguidores de pesquisa, fechemos aqui o foco sobre, Louis Jouvet, que em sua
jornada como diretor e ator procedeu influências marcante também no Brasil.

 A iluminação em seus excessos foi um elemento combatido por Copeau, Talvez
a busca desse diretor tenha gerado em Jouvet a necessidade de experimentar
equipamentos de luz e até construí-los. O conhecimento sobre práticas
luminosas vinha do contato de seu mestre com grandes pensadores e homens de
teatro da época.  Entre 1913 e 1914, Jouvet atuou como ator em 13 (treze)
espetáculos. Com a guerra, tanto ele como seu diretor foram recrutados para
o *front* e o teatro foi fechado. Copeau foi dispensado meses depois, o que
não ocorreu com seu aluno. Os contatos mantiveram-se através de
correspondência e a busca para inovar a representação cênica também. Copeau
foi nomeado para uma missão cultural nos Estados Unidos, e através de
comunicações escritas com Jouvet desenvolveram um dispositivo cênico,
espécie de tablado, com pequenas diferenças de elevação que permitiam obter
diferentes espaços cênicos em um único lugar. A materialização do
experimento, já com a presença de Jouvet liberado da obrigação militar,
ocorreu em novembro de 1917, no *Garrick Theatre* o *Vieux Colombier* que
Copeau montou em Nova Iorque, e onde trabalhou durante dois anos na capital
norte americana.  Jouvet, quando no fronte, além de projetar o tablado
cênico, desenvolvia leituras e experimentos também com finalidades de
construir dispositivos luminosos, como se nota nos comentários contidos
nesta carta dirigida a Copeau:

Encontrei um dispositivo para suprimir de certa maneira as frisas – e para
adotar as luzes fixas em lugar das gambiarras – Luzes móveis em todas as
posições e inclinações. Estou muito contente com isso. Creio que poderá
funcionar, embora eu não veja o efeito
produzido.[5]<file:///D:/Temp/Artigo_jornada-Final_Ivo%5b1%5d,5.doc#_ftn5>




Esse anteparo luminoso teve aperfeiçoamento após o fim da guerra. Jouvet
patenteou a invenção e experimentou-a em fevereiro de 1920, quando da
reabertura do Vieux Colombier em Paris.  Naquele período também se instalou
no espaço a escola para formação de atores com cursos teóricos e práticos,
na qual Jouvet ficou responsável por ministrar conhecimentos sobre
arquitetura teatral. Copeau instalou no espaço reinaugurado, ateliês de
eletricidade e carpintaria cuja direção delegou a Jouvet, para que este
procedesse a pesquisas. Juntos trabalharam para transformar o palco do
Vieux-Colombier com o propósito de instalar ali o dispositivo arquitetônico
fixo já experimentado em Nova Iorque. Na mudança nada restou da caixa de
cena do antigo Vieux-Colombier. Eles eliminaram a boca de cena e
acrescentaram uma escada com a finalidade de deixar maior proximidade entre
a cena e o público. Receberam criticas pela ousadia, pois a acústica do
espaço adaptado não foi favorecida, devido ao material (cimento) utilizado
para cobrir o chão.

 Os rumos individuais de Jouvet esclareceram-se em 1922, quando aceitou o
posto de diretor técnico das duas salas da Comédie des Champs-Elysées. Em
1924, Copeau anunciou o fechamento do Vieux-Colombier, alugou um
castelo naBorgonha, no interior da França, e transmitiu em setembro
daquele ano a
companhia do Vieux-Colombier a Jouvet. Copeau mudou-se então para o castelo
acompanhado de trinta e três pessoas, a fim de dedicarem-se exclusivamente à
escola de atores e às pesquisas. Com dificuldades financeiras, viu-se
obrigado a abandonar seus objetivos em fevereiro de 1925. Alguns alunos,
mesmo assim, permaneceram ao lado dele entre 1925 e 1929, sendo chamados
pelos habitantes da região de Copiaus. Em 1929 Copeau resolveu dissolver o
grupo e prosseguir seus projetos de forma individual.

Por sua vez, Jouvet continuava a sua jornada pessoal como ator e diretor,
integrando-se com antigos companheiros do Vieux-Colombier e com outros mais
que a cena teatral francesa gerava. No decorrer da década de 30, além de
incursões na área do cinema, Jouvet trabalhou no *Théâtre de
l´Athénée*[Teatro do Ateneu], onde estabeleceu e manteve uma sólida
amizade e parceria
com o escritor Jean Giraudoux e com o cenógrafo Christian Bérard. Pôde então
aperfeiçoar ainda mais seus conhecimentos do texto dramático e da
cenografia. Encenou junto a estes alguns de seus maiores sucessos.

Em 1936, os integrantes do "Cartel", fundado em 1927 para defender
interesses individuais de um grupo de diretores, encontrar-se-iam para uma
missão importante na renovação dos clássicos da dramaturgia teatral
francesa. Com a nomeação de Edouard Bourdet para o cargo de administrador da
Comédie-Francaise, este abre um precedente na história dessa instituição e
convida para dirigirem espetáculos Jouvet, Gaston Baty, Charles Dullin e
Jacques Copeau. Suas funções não implicavam no abandono do cargo de
diretores em seus teatros respectivos.  Devido a problemas graves de saúde,
Bourdet afastou-se da administração da Comédie-Francaise em 1939. No mesmo
ano Paris foi ocupada pelos alemães, o que gerou implicações diretas na
administração e no repertório da instituição, que até então só permitia a
encenação de dramaturgos franceses. Em 1940 o diretor licenciado foi
demitido, assumindo o cargo o seu interino Jacques Copeau. Este fora nomeado
numa situação conturbada e não contava que seus companheiros manifestassem
apoio a Boudet — entre eles Jouvet, que discordava da encenação de
dramaturgos alemães pela Comédie-Française. Nesse contexto, Copeau pediu
demissão em março de 1941, tendo-se mantido por apenas dez meses no cargo.

Por não concordar com o programa cultural estabelecido pelos alemães Jouvet
resolveu deixar Paris, junto com sua companhia para Portugal e em seguida
para a América do Sul, aportando no Rio de Janeiro e outras metrópoles
Sul-Americanas. O Brasil apresentava um terreno fértil para o
desenvolvimento da arte, na época. O governo Vargas através do seu Ministro
da Educação e saúde Gustavo Capanema e seu fiel assistente Carlos Drummond
de Andrade buscavam consolidar a modernidade dentro do Estado Novo
Getulista. O idioma francês era um dos mais utilizados por intelectuais das
academias e por vários artistas brasileiros que visitavam com freqüência
aquele país.

Ao final de junho de 1941, Jouvet chega ao Rio, seguido de vinte e cinco
pessoas entre atores e técnicos. 34 (trinta e quatro) toneladas de materiais
acompanhavam a trupe. Todo esse volume de objetos e de pessoas não visava a
atender a um único espetáculo. Jouvet viera nesta turnê, inicialmente
programada para ter a duração de três meses, com várias obras em seu
repertório. Ao longo do mês de julho foram mostradas sete peças diferentes
de dramaturgos diversos, com a habilidade de interpretação da mesma equipe,
que se apresentava dia sim, dia não.  Nota-se por aí a importância dada pelo
diretor em ter a presença de sua equipe técnica acompanhando a turnê com a
destreza necessária para reestruturar cenário e iluminação de um dia para o
outro. É de se ressalta que essa prática deve ter gerado aprendizado aos
técnicos brasileiros que os auxiliaram nas duas temporadas no Rio de Janeiro
e São Paulo, em 1941 e 1942.

 Jouvet tinha 54 anos quando chegou ao Brasil. Já era um ator de renome e um
diretor reconhecido pela sua qualidade profissional. Sobre os cuidados e
dedicação que tinha com seus trabalhos encontramos referências no depoimento
de Álvaro Moreyra, ligado ao teatro amador carioca, em 1941, ao narrar sua
conversa com o diretor na primeira temporada. Relatou então a ele que
assistira à estréia de Jouvet na inauguração do Vieux-Colombier, em 1913:
"[...] prolongar a conversa — nas palavras de Moreyra— seria bom, se ele não
fosse um homem sério que leva o teatro a sério e que ia trabalhar pela noite
adentro".[6] <file:///D:/Temp/Artigo_jornada-Final_Ivo%5b1%5d,5.doc#_ftn6>Pelo
que se percebe, Jouvet e sua equipe técnica trabalhavam intensamente
para instalar e readequar cenário e iluminação dos espetáculos, no pouco
tempo que restava entre uma apresentação e outra. Décio de Almeida Prado que
também já havia assistido a trabalhos de Jouvet em 1939, quando estivera em
Paris, e que em 1941 iniciava sua carreira como critico literário, apontou
detalhes, em sua crítica na revista Clima nº3, que enalteciam a qualidade
dos trabalhos deste diretor, incluindo as virtudes da iluminação. Décio
salientava o valor de "um grupo de peças estrangeiras encenadas da mesma
forma como foram criadas, pela mesma companhia, com o mesmo cenário, os
mesmos efeitos de
luz".[7]<file:///D:/Temp/Artigo_jornada-Final_Ivo%5b1%5d,5.doc#_ftn7>Sobre
o impacto causado pelas duas temporadas de Jouvet no teatro
brasileiro, é oportuno lembrar o depoimento de Gustavo Dória, um dos
integrantes do grupo carioca Os Comediantes, que iniciava suas atividades no
mesmo período. Após assistir aos espetáculos de Jouvet, o grupo reavaliou
suas propostas de teatro:



 Todos conhecíamos a importância de Jouvet, sua posição no teatro francês,
sua descendência direta do movimento de Copeau. Mas jamais poderíamos
imaginar que o espetáculo teatral pudesse atingir aquele grau de elaboração
artística. Jamais tínhamos visto uma conjunção tão perfeita entre texto,
interpretação e
montagem[8]<file:///D:/Temp/Artigo_jornada-Final_Ivo%5b1%5d,5.doc#_ftn8>
.



O caráter novo e o aspecto moderno que o grupo procurava estavam em frente
deles. Com sua história e qualidade de trabalho, o ilustre diretor francês
passou a ser figura comentada nos meios artísticos e intelectuais. No Rio de
Janeiro o contato com os espetáculos de Jouvet foi além do visual, pois, a
convocação de um grupo de pintores e desenhistas para trabalharem com ele
quando da segunda temporada carioca em 1942, permitindo que os artistas
locais convivessem com a obra deste diretor. Não se tem aqui um registro do
conteúdo transmitido aos colaboradores brasileiros, mas Jouvet não deixaria
passar a oportunidade de expor as vantagens do cenário no formato de
praticáveis e diferentes níveis que nos tempos do Vieux-Colombier fora
criado. Embora não seja citado como um dos integrantes da equipe que
auxiliou Jouvet, o cenógrafo Thomas Santa Rosa estava imerso no meio
político e artístico da época. Não ficaria distante das rodas de
intelectuais ligados ao Governo ou imune a comentários sobre inovações
cenográficas aprendidas pelos membros da equipe colaboradora de Jouvet. O
cenário da peça *Vestido** de Noiva* foi produzido de forma criativa e
inovadora, estando assim dentro do que Jouvet considerava potencialidade do
artista brasileiro. A construção de madeira estabelecia dois andares e,
juntamente com o nível do palco, favorecia os três planos narrativos
solicitados pelo dramaturgo. A criatividade de Santa Rosa estava na
existência de arcos que facilitavam a entrada e saída dos atores, e também
na projeção de efeitos de luz que contagiavam o público. Esses arcos
remetiam aos Arcos da Lapa, um ponto característico carioca que
contextualizava o espetáculo em determinada região. Nelson Rodrigues
escreveu o texto em 1943, após as duas temporadas realizadas por Jouvet no
Rio de Janeiro, em 1941 e 1942. Não se tem registros de que o autor tivesse
assistido ao espetáculo de Jouvet ou de que conhecesse as pesquisa de Copeau
com os "praticáveis" que proporcionavam diferentes planos sem precisar mudar
de cenário durante a apresentação. No período em que o diretor francês
esteve no Rio, Nelson era jornalista de conceituados periódicos da capital
nacional. Ingressara havia pouco tempo na dramaturgia, e a divulgação de
notícias do renomado diretor que valorizava a criação do texto circulando
pela cidade e recebendo artistas amadores em seu apartamento não deveria
tê-lo passado despercebido. Os membros do grupo Os Comediantes entenderam a
importância inovadora de Jouvet e intensificaram relações:

Generoso com os atores amadores, Jouvet os recebia em seu apartamento,
durante os sete meses em que residiu no Rio de Janeiro. Brutus Pedreira e
outros integrantes de *Os* *Comediantes* voltaram de uma dessas visitas –
relembra Gustavo Dória – com a "verdade estarrecedora: qualquer iniciativa
que pretendesse fixar no Brasil um teatro de qualidade, um teatro que
atingisse verdadeiramente a uma platéia, não estaria realizando nada
enquanto não prestigiasse a literatura nacional! [...] O ponto de partida
era o autor brasileiro".  (Ibidem)

Nelson Rodrigues mantinha proximidade com o ministério Capanema: Manuel
Bandeira que trabalhava neste ministério foi o primeiro a receber cópia da
peça Vestido de Noiva. Escreveu manifestando elogios ao texto. Apesar dos
bons comentários da imprensa, o autor não conseguia levá-la para a cena.
Alegavam-se dificuldades para a construção do cenário e os custos elevados
de sua confecção e implantação. Surgiu então Thomas Santa Rosa, que achou
possível a sua realização e falou com o polonês Zbigniew Ziembinski. Os dois
Juntaram-se então com a procura objetivada pelo Grupo Os Comediantes e
decidiram-se pela montagem do texto, que estreou após oito meses de
exaustivos ensaios. O plano de luz para a estréia da obra continha 132
efeitos. Foi idealizado por Ziembinski e acompanhado de perto por Santa
Rosa. Com os técnicos que já haviam auxiliado a equipe de Jouvet, no Teatro
Municipal do Rio, foi que Ziembinski inovou a iluminação cênica brasileira.
Dedicou muitas horas à montagem de luz, trabalhando noite adentro para
proceder a melhorias, e aperfeiçoá-la. Tem-se aí outra semelhança com a
proposta de Jouvet, que assim agiu para não perder qualidade, no curto tempo
de readequação em suas peças. A importância dada ao posicionamento dos
equipamentos de luz para gerar bons efeitos e a dedicação de tempo para tal
fim torna o espetáculo Vestido de Noiva, de 1943, como um divisor de águas
no Brasil, no tocante à valorização da ferramenta geradora de luminosidade
na cena e à dos profissionais que a executam. Sobre a iluminação da peça na
estréia, o escritor Nelson Rodrigues assim escreveu :

Não posso falar da luz sem lhe acrescentar um ponto de exclamação. Em 1943,
nosso teatro não era iluminado artisticamente. Pendurava-se, no palco, uma
lâmpada de sala de visitas, ou de jantar. Só. E a luz fixa imutável – e
burríssima – nada tinha a ver com os textos e os sonhos da carne e da alma.
Ziembiski era o primeiro, entre nós, a iluminar poeticamente e
dramaticamente uma peça. Estou vendo Alaíde, ao aparecer, pela primeira vez,
de noiva. Ficamos atônitos de beleza. Dentro da luz, era um maravilhoso e
diáfano pavão branco[9]<file:///D:/Temp/Artigo_jornada-Final_Ivo%5b1%5d,5.doc#_ftn9>.


            Nelson Rodrigues não deixa pistas claras sobre uma possível
influência recebida de outros espetáculos. Observe-se, porem, a frase que se
refere a condição da luz cênica no teatro brasileiro de então: "nosso teatro
não era iluminado artisticamente". Na seqüência, o teatrólogo reforça a sua
afirmativa: "Ziembinski era o primeiro entre nós..." Por aí podemos entender
que ele conhecia trabalhos de qualidade executados por diretores de outros
países. Entre estes, poderiam ser incluídos os trabalhos de Jouvet em suas
duas temporadas no Rio de Janeiro em períodos anteriores à criação do texto
de Nelson Rodrigues, da direção de Ziembinski, da cenografia de Santa Rosa e
da montagem do Grupo Os Comediantes. Estes últimos assumiram, em depoimento
já aqui transcrito, a decisiva influência do diretor francês para os rumos
seguidos pela equipe.

        Portanto a suposição esta lançada: teria a presença de Louis Jouvet
e sua companhia, em temporada no Brasil no início dos anos de 1940,
influenciado direta ou indiretamente a primeira montagem de Vestido de
Noiva?











*Referências Bibliográficas:*

* *

CARLSON, Marvin. Teorias do Teatro. Tradução de Gilsom César Cardoso de
Souza. São Paulo: UNESP, 1997.



COPEAU, Jacques. A Improvisação, in Registros III. Os Registros do Vieux
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Dasté e Suzanne Maistre Saint-Denis. Paris: Gallimard, 1979. Coleção
Práticas do teatro – Tradução de José Ronaldo Faleiro .



COPEAU, Jacques. Início da Escola do Vieux Colombier, in Registros III. Os
Registros do Vieux Colombier (Velho Pombal). Textos coletados e
estabelecidos por Marie-Hélène Dasté e Suzanne Maistre Saint-Denis. Notas de
Norman Paul. Paris: Gallimard, 1979. Tradução de José Ronaldo Faleiro.



COPEAU, Jacques. O Teatro do Vieux Colombier (Velho Pombal), in Registros I.
Textos coletados e estabelecidos por Marie-Hélène Dasté e Suzanne Maistre
Saint-Denis. Notas de Claude Sicard. Paris: Gallimard, 1974. Tradução de
José Ronaldo Faleiro.



JOMARON, Jaqueline. Jacques Copeau – Le Tréteau nu [O tablado nu],  in O
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1992. Tradução de José Ronaldo Faleiro.



MOSTAÇO, Edélcio. Aspectos da Iluminação, In Folhetin nº 25; Teatro do
Pequeno Gesto; janeiro a junho de 2007.



PONTES, Eloisa. LouIs Jouvet e o nascimento da crítica e do teatro
brasileiro moderno. XXIV Encontro anual da AMPOCS; Grupo temático nº 10.
Pensamento Social no Brasil. Outubro, 2000.



PRENAFETA, Beato. DIAS, Jamil. PIEDADE, Milton. Iluminação Cênica –
Fragmentos da História. São Paulo: ABrIC, 2005.



ROUBINE, Jean-Jacques. A Linguagem da Encenação Teatral.Tradução de Yan
Michalski 2ª edição. Rio de Janeiro: Editora Jorge Zahar, 1998.



------------------------------

[1] <file:///D:/Temp/Artigo_jornada-Final_Ivo%5b1%5d,5.doc#_ftnref1> PPGT
CEART/UDESC – Projeto de Mestrado: A Iluminação de Um Palco. Orientadora
Vera Martins Collaço.

[2] <file:///D:/Temp/Artigo_jornada-Final_Ivo%5b1%5d,5.doc#_ftnref2> Ivo
Godois – Acadêmico do Programa de Pós Graduação em Teatro do Centro de Artes
da UDESC, Vera Regina Martins Collaço é Professora Dra. do Departamento de
Artes Cênica do CEART – UDESC.

[3] <file:///D:/Temp/Artigo_jornada-Final_Ivo%5b1%5d,5.doc#_ftnref3>  COPEAU,
Jacques.  A Improvisação In Registros III , Registros do Vieux-Colombier.
Tradução de José Ronaldo Faleiro

[4] <file:///D:/Temp/Artigo_jornada-Final_Ivo%5b1%5d,5.doc#_ftnref4> COPEAU,
Jacques. O Teatro do Vieux Colombier. Tradução de José Ronaldo Faleiro

[5] <file:///D:/Temp/Artigo_jornada-Final_Ivo%5b1%5d,5.doc#_ftnref5> COPEAU,
Jacques. A Improvisação. Tradução de José Ronaldo Faleiro.

[6] <file:///D:/Temp/Artigo_jornada-Final_Ivo%5b1%5d,5.doc#_ftnref6>  Pontes,
Heloisa. Louis Jouvet e o nascimento da crítica e do teatro brasileiro
moderno.

[7] <file:///D:/Temp/Artigo_jornada-Final_Ivo%5b1%5d,5.doc#_ftnref7>  PONTES,
Heloisa. Louis Jouvet e o nascimento da crítica e do teatro brasileiro
moderno.

[8] <file:///D:/Temp/Artigo_jornada-Final_Ivo%5b1%5d,5.doc#_ftnref8> * Idem*
.

[9] <file:///D:/Temp/Artigo_jornada-Final_Ivo%5b1%5d,5.doc#_ftnref9>  MOSTAÇO,
Edélcio. Aspectos da iluminação.



-- 
Valmir Perez
Lighting Designer
Laboratório de Iluminação
Unicamp
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