[ANPPOM-L] pirataria

Jorge Antunes antunes em unb.br
Seg Ago 7 12:33:52 BRT 2006


Car em s amig em s:

Desculpe eventual duplicata desta mensagem.
Esta mesma mensagem enviei ontem, mas meu Netscape acusa "Unsent".
Perdoe-me se a mensagem lhe chega de novo.
Saiu ontem, domingo, no Correio Braziliense, meu artigo intitulado:
Cem anos de perdão para os piratas.
Abaixo reproduzo o texto.
Boa leitura.
Abraço,
Jorge Antunes

------------------------------------------
Cem anos de perdão para os piratas

Jorge Antunes
Compositor, maestro, professor titular da UnB, candidato a Deputado Distrital pelo PSOL

  Uma luta renhida pelo monopólio do disco vem sendo travada nos bastidores internacionais. A luta tem conseqüências graves para a cultura brasileira, mas nossa imprensa não tem divulgado a questão com o destaque devido.
No dia 27 de julho a gravadora EMI divulgou sua decisão: desistiu, temporariamente, de comprar a Warner Music. A decisão da EMI foi conseqüência da corajosa decisão do Tribunal Europeu de Justiça, que no dia 13 de julho anulou a autorização da fusão entre o grupo japonês de música Sony e o alemão BMG, que havia sido concedida pela Comissão Européia em 2004. A fusão entre as duas empresas gerara a segunda maior companhia mundial do setor, atrás apenas da Universal. A decisão inédita da primeira instância da Corte Européia acatou a contestação de gravadoras independentes à transação. Mas como ainda cabe recurso, o rumo ao monopólio pode ser retomado futuramente.
O mercado fonográfico é capitaneado por seis grandes empresas gravadoras de discos, sendo que nenhuma delas é brasileira. A tendência dessa indústria é cruel e perniciosa, porque a monopolização gradual é a marca nesse mercado. A fusão da Sony com a BMG e a anunciada fusão da EMI com a Warner seriam as mais novas jogadas que amedrontam aqueles que defendem a democratização da cultura e de sua fruição.
A gravação sonora vem se revelando, cada vez mais, meio de enriquecimento desenfreado de grupos financeiros que controlam e comandam o planeta Terra. O sucesso se deve à adesão de governos e de legisladores à luta dos empresários contra a pirataria. A todo momento ouvimos a denúncia de que a pirataria prejudica os artistas, pois que estes deixam de receber os 2% a que têm direito sobre a venda dos discos. O Estado também se vê prejudicado, tendo em vista que, com a pirataria, impostos deixam de ser arrecadados.
Mas é sabido que nem todos os discos lançados são pirateados. Só são pirateados aqueles que contêm músicas de sucesso. Mas, quais são as músicas que fazem sucesso? Todos sabem que não podem fazer sucesso as músicas desconhecidas do grande público. Ou seja, só podem fazer sucesso as músicas que tocam nas rádios e nas televisões. De todas as músicas novas, poucas são levadas à antena das rádios e e das TVs.
O público que ouve rádio sabe que a programação não varia muito. Os sucessos se repetem tocados implacavelmente, em diferentes estações, com freqüência assustadora. Qualquer ouvinte desavisado é levado a crer que aquela música muito tocada é sucesso, porque é repetidamente tocada. Outros ingênuos dirão que ela é muito tocada porque é sucesso. O gosto do público é construído, de modo covarde e criminoso, dando lugar a um círculo vicioso que estabiliza a tolerância de um crime de lesa-cultura e, portanto, também de lesa-pátria.
As multinacionais do disco, não satisfeitas em monopolizar o mercado da música, compram programas e programadores de rádio, para que as músicas que elas querem vender se repitam continuamente nos alto-falantes de cada residência, de cada radinho de pilha e de cada carro. Essa compra de programas radiofônicos e de radialistas, aliada à divulgação massificante, encarece demasiadamente a produção, fazendo com que o preço de venda do disco seja altíssimo.
A pirataria chega até mesmo a fabricar cópias ilegais de discos que ainda não chegaram às lojas e às rádios, porque já sabe de antemão o que vai ser sucesso. Claro, todos sabem que terão sucesso as músicas que estão nos discos cuja difusão radiofônica massificada, através do jabá, será paga pelas gravadoras.
Os artistas chamados independentes, que ainda não foram adotados pelos proxenetas internacionais do som, não têm suas músicas tocadas no rádio. Assim, eles não têm suas obras ouvidas, conhecidas, massificadas e, portanto, não fazem sucesso: não são pirateadas.
Artistas independentes começam a se organizar repudiando energicamente a prática do jabá. A criminalização dessa prática antiética já conta com projetos de lei, mas estes andam a passo lento na Câmara. Os artistas que se organizam para combater a pirataria e que, com esta, deixam de ganhar 2% nas vendas dos produtos originais, sabem da existência do jabá e, portanto, são coniventes com o espúrio e antiético procedimento.
Talvez não devamos ainda chamar de ladrões as gravadoras, as rádios, os radialistas e os músicos que participam da cadeia produtiva que inclui o jabá, pois que esta prática imoral ainda não foi criminalizada. Mas dentro em pouco deveremos leniência a certos malandros: pirata que pirateia ladrão tem cem anos de perdão.
------------------------------------------






-------------- Próxima Parte ----------
Um anexo em HTML foi limpo...
URL: <http://www.listas.unicamp.br/pipermail/anppom-l/attachments/20060807/ce85a174/attachment.html>


Mais detalhes sobre a lista de discussão Anppom-L