[ANPPOM-L] Ai, que susto!
Alexandre Negreiros
alexandrenegreiros em yahoo.com.br
Dom Jun 3 15:18:18 BRT 2007
Prezada Stela e colegas,
Acho que ficou claro que o Palombini quis destacar a clareza do
preconceito à música funk, evidenciando os avisos destinados a seus
ouvintes que não surgiam para o acesso ao material equivalente que o
gerou, e não divulgar materiais pornográficos. Talvez pudesse ter
deixado isso mais claro, mas talvez tenha imaginado que seria esse o
olhar que prevaleceria.
Apesar de também ser parcialmente indignado com a carência melódica,
harmônica e rítmica do "funk marginal" (se é que tal conceito é
válido, mas aqui uso apenas para diferenciá-lo de suas variações mais
bem aceitas pela casta crítica, como James Brown, Tim Maia ou
Fernanda Abreu), nas raras em que identificamos tais elementos, não
podemos deixar de observá-lo - e admiti-lo - como manifestação
legítima, originária de um grupo social bem definido, que assim se
mostra capaz de encontrar na vastidão desse vazio educacional a que é
relegado, essas duas ou três ferramentas com as quais grita, existe,
cria identidade própria e experimenta uma fração mínima da auto-
estima que lhe é permitida por sua desgraça, com a qual lida sem que
lhe permitam sequer drogar-se, como se aplica morfina aos enfermos
com dores extremas. Se tivemos a melhor educação pré-escolar, eles
tiveram valas negras para brincar, e baixar os olhos e mudar de
assunto não ajuda a melhorar o conteúdo da internet.
Seus "manipuladores" são empresários tão gananciosos quanto os mais
pródigos empreiteiros, mas com formação equivalente aos da música que
promovem, são incapazes de nos distrair de modo a tornarem-se
aceitáveis, e 15 minutos de conversa com os administradores do
conglomerado Furacão 2000 eliminam qualquer dúvida. Por qualquer
definição isenta em que se apóie, não há como excluir tais
manifestações do conceito de cultura popular apenas por haver
exploradores de sua difusão, sob pena de condenarmos também as
rendeiras do Ceará, o artesanato de Pernambuco e outras manifestações
inquestionáveis que, integradas a um sistema que não abre exceções
românticas, condena indiscriminadamente à miséria ou ao dinheiro e o
mercado da esquina. Talvez seja necessário refletir sobre a dor de
perceber tantas características desconfortáveis no funk marginal. Não
sou pesquisador do tema, e devo estar aglutinando subdivisões,
estilos e tendências diversas que integram uma classe específica de
produtos, mas capitulemos ao fato de que são oferecidos e consumidos
de forma muito semelhante aos produtos culturais "legitimados" por
nossa elite pós-graduada.
O arrombamento de tradições locais pela difusão indiscriminada da
cultura do Alto Leblon através das novelas da Globo é pornografia
pura; a passividade com que nos mantemos ignorantes e assistimos o
ECAD funcionar para a cupidez de seus controladores, sem qualquer
fiscalização pública, é pornográfica, imoral e vergonhosa; o lucro do
Bradesco (apenas um dentre os 20 bancos enormes) apenas no 1º
trimestre de 2007, é escatológico, rendendo R$ 19 mil por DIA a quem
detenha reles 0,1% de suas ações. Mas a meia-dúzia de centros-
culturais com que conseguem tornar decente esse estupro são
usufruídos por quem irá rejeitar as manifestações do grupo de
degradados que, ingênuos e servis como a mulher que descreve,
alimentam cada centavo dessa pedofilia pública. Fazem isso ao arcar
religiosamente com juros criminosos praticados pelos atravessadores
das migalhas eletrodomésticas com que nos sentimos atenuando o abismo
dessas diferenças. Então, com suas migalhas, patrocinam as nossas
orquestras, as novelas da Globo, "viabilizam os seus sonhos" e fica
tudo certo. Se pagarmos melhor à nossa empregada doméstica, não
sobrará para a viagem à Paris, e ainda é comum exigir-lhes, nas mais
imaculadas famílias, que não estudem, para elidir suas já remotas
chances de galgar ascenção social. E temos a cara-de-pau de não
lembrar o nome do picareta em quem votamos, de torcer o nariz para
quem reclama das coisas no restaurante, em apontar arrogância nos que
buscam aprimorar a comunicação com melhor vocabulário. Chique é não
precisar: que loucura!
Imagino que a origem de sua indignação se remeta muito mais à culpa -
que não nos permitimos sentir - ao tolerar essas pornografias mais
graves, malgrado plenamente abastecidos com conceitos ampliados pelo
conhecimento de línguas e linguagens, com as quais refinamos o humor
em rodas de chá importado antes do concerto no Municipal, comprado
com dinheiro que tantos privilégios reduziram a chance de não tê-lo.
Temos todas as ferramentas para censurar tantas pornografias, mas os
depravados são tão competentes que conquistaram - não sem a
colaboração de um certo medo cívico nascido nos anos de chumbo - o
nosso constrangimento até para falar dela, quiçá para implementá-la.
Penso que, enquanto mantivermos o olhar insular, e olharmos os
funkeiros como os "outros", invasores de nosso castelo de cultura
ocidental européia, só teremos deles melodias assim tão simples, com
conteúdos assim tão primários, quando muito. Assim, jamais seremos
candidatos ao primeiro mundo já que, nos indignemos ou não, são
também habitantes de um mesmo reino que, para ter acesso à simples
curiosidade pelo que não lhe causa estímulos orgânicos, precisam não
temer por sua vida, por sua sobrevivência ou por seu futuro, quando
são heróis e chegam a ter um.
Me perdoem a ênfase e a extensão.
Abraços!
Alexandre
On Jun 3, 2007, at 11:55 AM, Stela Brandao wrote:
> Que lamentável tudo isto! Muito mais lamentável ainda ser a lista
> da ANPPOM
> veículo de propagação de coisa desse gênero, dessa crescente
> degeneração da
> cultura popular facilitada e promovida pelos veículos de
> comunicação em
> massa. É mesmo para baixar de vez o nível do pensamento do povo,
> que já
> tinha uma concentração pélvica de proporção mais do que exagerada,
> patológica até, para rebaixá-la ainda mais ao cano de esgoto. As
> pessoas
> não precisam desse tipo de aula. O sexo está sendo instrumento de
> bestialização da humanidade em geral e do Brasil muito em
> particular. Seria
> interessante lembrar que nós, seres humanos, temos outros centros
> para onde
> fazer ascender a energia criativa gerada no chacra básico onde se
> encontram
> nossos órgãos genitais. Toda essa vulgaridade está íntimamente
> ligada à
> cultura da violência (as letras do "Funk" bem o demostram), à
> exacerbação
> fálica da pior espécia, negando ao homem a possibilidade de nobreza e
> auto-domínio e reduzindo a mulher ao seu pior papel de servilismo
> sexual; à
> exaltação da libidinagem como um valor supostamente ligado à liberdade
> individual, quanto mais degradante melhor, reduzindo a libido, ou
> energia
> criativa, a um brinquedo perigoso de mentes incultas e ignorantes.
> Isto tudo
> não tem nada a ver com Arte, com liberdade, com cultura! Se é
> cultura, eu
> abomino essa cultura e conclamaria os jovens a educarem o seu
> pensamento e
> a impulsionarem sua energia vital em outras direções de verdadeiro
> significado e auto-conhecimento para a edificação da cultura de seu
> país.
> Se há algum mérito em expôr tais baixarias na TV, Internet, etc.,
> que seja
> para acender um debate sobre os rumos da cultura popular e da
> educação atual
> e avaliar os seus efeitos na consciência de uma sociedade, de um povo.
> Stela Brandão, EdD
>
>
> ----- Original Message -----
> From: "carlos palombini" <palombini em terra.com.br>
> To: "ANPPOM" <anppom-l em iar.unicamp.br>
> Cc: "Leonardo Aldrovandi" <leoaldrovandi em yahoo.com.br>;
> <rafael_nassif em hotmail.com>
> Sent: Sunday, June 03, 2007 9:27 AM
> Subject: [ANPPOM-L] Ai, que susto!
>
>
>
> O Youtube é muito bom: encontram-se lá desde a execução de obras de
> Xenakis ou _Vingt regards_ de Messiaen até um outro tipo de obra-
> prima.
>
> [quem não gostar de funk carioca, por favor, não leia o que se segue]
>
> A sexóloga do SBT deu uma aula de sexo anal, que é, por si só, uma das
> coisas mais engraçadas da web:
>
> www.youtube.com/watch?v=vDkoyWDT3TE
>
> O DJ Raphael Mendes fez o que precisava ser feito: transformou a
> aula de
> sexo anal do SBT num funk que é uma das coisas mais engraçadas do
> funk:
>
> www.youtube.com/watch?v=hEmswlmOHjk
>
> Mais engraçado ainda é que vc acessa sem problemas a aula da sexóloga.
> Todavia, para acessar o "Funk da aula de sexo anal", que contém apenas
> --- e contém muito menos do que --- a professora disse, vc necessita
> concordar que:
>
> "This video may contain content that is inappropriate for some
> users, as
> flagged by YouTube's user community. By clicking 'Confirm', you are
> agreeing that all videos flagged by the YouTube community will be
> viewable by this account."
>
> A quem quiser experimentar, é bom lembrar que são 20 dias de estudos
> preliminares.
>
> --
> cvp
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> http://iar.unicamp.br/mailman/listinfo/anppom-l
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