[ANPPOM-L] Qual a música que queremos em nossas Universidades?

Hugo Leonardo Ribeiro hugolribeiro em yahoo.com.br
Qua Out 10 14:37:50 BRT 2007


Caro Rubens,
Infelizmente atualmente estou incapacitado para responder mais
profundamente, pois estou no Encontro Nacional da ABEM, em Campo Grande, com
acesso restrito à internet. Mas deixo a mesma provocação que fiz à
professora Beatriz Ilari, após sua palestra hoje pela manhã:

Como podemos nós, da Etnomusicologia, Sociologia da Educação Musical, e
Educação Musical falarmos em diversidade musical como uma realidade, como
uma prática nas instituições de ensino de música (e não mais como dilema)
se, para ser um etnomusicólogo ou um educador musical (muitos diriam que
isso é um neologismo) precisamos, obrigatoriamente aprender contraponto e
harmonia durante quatro anos?

Será que um dia será possível reconhecermos um excelente músico como
merecedor de um diploma de curso superior sem ter que obrigá-lo a cursar
tais disciplinas dogmáticas?

Será que seria possível pensarmos num currículo de um curso superior de
música, aberto e flexível o suficiente para um aluno de composição, educação
musical, violino, ou o que for, escolher não cursar determinadas disciplinas
ou ter que executar determinado repertório canônico, e ainda assim poder se
formar e seguir adiante profissionalmente?

Quando eu voltar para Aracaju, eu continuo...

Um abraço, e obrigado pela oportunidade da discussão.

Hugo Ribeiro


Em 09/10/07, Rubens Ricciardi <rrrr em usp.br> escreveu:
>
>  caro Prof. Hugo Leonardo Ribeiro,
>
> o senhor escreveu:
>
> *"uma música "antiga", cheia de regras, de preconceitos harmônicos
> (consonâncias e dissonâncias)"*
>
> prezado colega, com todo respeito, preconceituosa é a sua generalização...
>
> dissonância(s) e consonância(s) são sempre historialmente contextuais (em
> cada época a questão é posta de modo diverso), ainda quando se pode reduzir
> a tanto...
>
> regras? nenhum único grande compositor deixou de criar as suas...
>
> me perdoe, mas colocar tudo no mesmo saco é desconhecer os fundamentos das
> poéticas musicais ao longo da história - e temos aí pelo menos uns 2500 anos
> de música escrita,
>
> temos que diferenciar melhor este seu "antigo", pois então sua
> compreensão do "novo" pode ser prejudicada e igualmente sua escuta pode se
> tornar por demais redutiva...
>
> mas enfim, é preciso *talento* antes de mais nada para se ouvir música...
> as linguagens, os estilos, as estruturas, as texturas de fato em suas ricas
> relações com os parâmetros musicais, os contrastes, as liberdades formais, o
> métier, as singularidades poéticas...
>
> não deixa de ser um exercício exaustivo para aquele que se aventura
> a "aprimorar o gosto elitista"...
>
> Rubens Ricciardi
>
>
> ----- Original Message -----
> *From:* Hugo Leonardo Ribeiro <hugolribeiro em yahoo.com.br>
> *To:* anppom-l em iar.unicamp.br
> *Cc:* rrr em usp.br ; Yo Argentino <musicoyargentino em hotmail.com>
> *Sent:* Monday, October 08, 2007 9:18 AM
> *Subject:* [ANPPOM-L] Qual a música que queremos em nossas Universidades?
>
> Apesar de "lutar" contra qualquer forma de elitismo musical disfarçado sob
> o pseudônimo de "dom" ou "talento" (John Blacking vem logo à mente),
> acredito que nossos exames de conhecimento específico estão realmente
> descontextualizados. Há muitos mais saberes musicais que poderiam ser
> aproveitados na academia. Mas as provas específicas de música são muito
> limitadas em sua capacidade de avaliar a musicalidade de uma pessoa.
>
> Lembro também das palavras de Lucas Robatto, quando afirmava que Widmer
> fez uma experiência quando pegava pessoas "comuns" e as transformava em
> grandes compositores de música contemporânea, cujo exemplo mais claro e
> incontestável foi Agnaldo Ribeiro. Pelo que parece, para Widmer, o acúmulo
> de conhecimento sobre as regras e teorias tonais iriam "atrapalhar" a
> criatividade latente (Schaffer) que existe dentro de nós, principalmente no
> que se referia à liberdade de experimentar novos sons, novas combinações
> harmônicas e timbrísticas.
>
> Uma breve comparação auditiva entre as obras de dois compositores que
> foram alunos na UFBA, em períodos distintos, Agnaldo Ribeiro (livre, sem
> amarras tonais) e Wellington Gomes (cujo conhecimento tonal prévio está
> indiscutivelmente presente em sua obra), nos revela essa diferença de
> pensamento composicional. Não há mérito ou demérito. Há diferentes formas de
> pensar e sentir música.
>
> Recentemente tive uma experiência semelhante durante minha pesquisa para a
> tese de doutorado. Deparei com dois músicos com qualidades e saberes
> diferentes. Cada qual poderia ser considerado um excelente músico dentro do
> estilo que tocavam. Ambos eram guitarristas de Metal. Mas um toca Heavy
> Metal, com todo um conhecimento tonal que implica tocar esse estilo. O outro
> toca Death Metal, com toda anarquia atonal que o estilo exige. Mas, digamos,
> se ambos quisessem fazer um curso superior em Composição, o primeiro sairia
> na vantagem, pois já traria uma bagagem de vivência prática e teórica a
> respeito de um tipo de música que será a base da avaliação, ou seja, a
> música tonal, seja em termos teóricos, gramaticais ou perceptivos. O segundo
> guitarrista teria que se esforçar em aprender as regras do sistema tonal,
> para poder ser admitido, e todo seu conhecimento musical, sua experiência e
> prática não seriam levados em consideração. O paradoxo está no fato que, o
> primeiro vivencia uma música "antiga", cheia de regras, de preconceitos
> harmônicos (consonâncias e dissonâncias), enquanto que o segundo vivencia
> uma música muito mais moderna, contextualizada com o caos urbano, sem
> preconceitos, sem amarras teóricas, e com muito mais liberdade sonora
> (inclusive no uso de texturas densas como um ruido branco, ou claras como um
> dedilhado com a guitarra "clean").
>
> Inclusive esse guitarrista de Death Metal chegou a me procurar para ter
> aulas particulares sobre escalas e harmonias, como ele próprio disse. Nos
> desencontramos antes que pudesse dar a resposta. Mas confesso que fiquei com
> medo de que, ao ensiná-lo regras tonais, acabasse por reprimir de alguma
> forma suas idéias atonais que eu tanto admirava.
>
> E concordo plenamente com o Antunes quando ele nos provoca para
> repensarmos nossos exames de "aptidão musical". Como podemos esperar
> compositores, intérpretes e público de música contemporânea se ainda
> exigimos que, para entrar na Universidade, eles passem anos de suas vidas
> estudando a música de três séculos atrás? Como criticar as orquestras por
> tocarem tanto Mozart e Beethoven, se é esse o repertório que elegemos como
> "cavalos de batalha", como diria o pajé Manuel Veiga?
>
> Vou parar por aqui pois acho que já estou me repetindo, e creio que vocês
> já entenderam o que eu queria dizer, ou melhor, provocar.
>
> Hugo RIbeiro
>
>
> Em 08/10/07, Rubens Ricciardi <rrrr em usp.br> escreveu:
> >
> > meus caros,
> >
> > então "talento" não existe??? é tudo "crença"???
> >
> > pois viva o mediano! viva o politicamente correto! - aí sim se está
> > salvo e
> > seguro na própria mesquinhez...
> >
> > Rubens Ricciardi
> >
> >
> > ----- Original Message -----
> > From: "eduardo luedy" <eluedy em yahoo.com>
> > To: <antunes em unb.br>; "Yo Argentino" < musicoyargentino em hotmail.com>;
> > <anppom-l em iar.unicamp.br>
> > Sent: Friday, October 05, 2007 8:10 PM
> > Subject: Re: [ANPPOM-L] insinuação do Antunes
> >
> >
> > Prezados colegas da anppom,
> >
> > Este debate está muito interessante.
> > Concordo em quase tudo que foi dito pelo Jorge
> > Antunes. Também lamento que a crença no "talento", no
> > "dom inato" ainda se façam tão presentes em nosso meio
> > acadêmico.............. Abraços a todos,
> >
> > Eduardo Luedy
> >
> > ________________________________________________
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> > http://iar.unicamp.br/mailman/listinfo/anppom-l
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