[ANPPOM-L] Um golpe na classe artística (pelas costas)
Marcos Filho
marcosfilhomusica em yahoo.com.br
Ter Mar 3 14:58:36 BRT 2009
TENDÊNCIAS/DEBATES
Um golpe na classe artística (pelas costas)
JÚLIO MEDAGLIA e PAULO PÉLICO
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Filmes semelhantes a esse já vimos em outros países e épocas. Como se
sabe,eles não fizeram sucesso ao longo da história...
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COMO se sabe, a atual crise econômica
vem vitimando impiedosamente empresas
em todo o mundo, das maiores
organizações às mais modestas. Imagine, nessa
situação, como está a vida do produtor
cultural, esse idealista que sai à
rua com um projeto teatral, editorial ou
musical debaixo do braço em busca
de patrocínio -aliás, o primeiro a ser
cortado ao se vislumbrar a mais tênue
ou a mais longínqua nuvem negra no
universo mercadológico.
Apesar do tido como baixo "valor de
mercado" de nossa produção intelectual,
o presidente Lula, ao mesmo tempo em que
disponibiliza R$ 250 bilhões em
pacotões anticrise com socorro
financeiro a bancos, desoneração fiscal às
exportações, estímulos à indústria
automobilística etc., penaliza a classe
artística ao sancionar a lei
complementar nº 128/2008, também subscrita
pelos ministros Guido Mantega e Miguel
Jorge. A nova lei trocou sutilmente
as atividades culturais de lugar (do
anexo 4º para o 5º). Assim sendo, a
faixa das alíquotas incidentes sobre
pequenas empresas produtoras de cultura
foi substituída por outra cujas
alíquotas chegam a quase triplicar os
impostos do setor.
Com o excessivo peso dos impostos, os
microempresários da cultura haviam
recebido com alívio a notícia do projeto
de lei do Simples Nacional, uma
nova modalidade de tributação que
prometia uma redução de até 40% na carga
tributária, estabelecendo os impostos ao
redor de 9%. Milhares de
microempresas culturais -após fazerem
essa opção contábil, assumirem
compromissos e pautarem suas atividades
em razão dessa nova realidade- se
viram subitamente presas numa armadilha,
com uma carga tributária de até
27,9%.
Isso coloca as microempresas da cultura
numa faixa de semelhante à de uma
média ou à de uma grande empresa. E o
mais espantoso desse fato é que essas
mudanças ocorreram sem a menor
transparência e sem debate nem comunicados
prévios aos atingidos pela alteração. Os
artistas e produtores tomaram
conhecimento do assunto no início deste
ano, já diante do fato consumado.
Não sabemos como classificar a atitude
do presidente e dos congressistas, se
de esperteza ou de má-fé.
O caso é que a lei foi aprovada às
pressas no dia 19 de dezembro, uma
sexta-feira, último dia do calendário
legislativo, de forma quase secreta, a
ponto de tributaristas próximos ao
governo e que participaram da elaboração
do projeto do Supersimples desconhecerem
a existência da matéria. Era
proposital a aprovação na antevéspera do
Natal e com as tramitações
envolvidas em segredo. Como se sabe, no
caso dos impostos, qualquer lei que
altere suas regras, quando aprovada, só
entra em vigor no ano seguinte.
Trata-se não só de uma proteção do
contribuinte diante da volúpia
arrecadadora do erário mas também de um
direito constitucional, presente na
legislação tributária de todos os
países. Se o projeto tivesse sido exposto
publicamente, certamente teria provocado
reações, debates e envolveria algum
tempo. Assim, se aprovado fosse, só
entraria em vigor em 2010.
Pelo visto, a Fazenda tinha pressa,
optando pelo silêncio, pela malícia, por
um artifício legislativo sub-reptício
para presentear, qual macabro
papai-noel, a in-telligentsia brasileira
com um rombo em seus já minguados
recursos de produção cultural. Claro
está que tal carga de impostos é
desproporcional à atividade de produção
cultural, o que empurrará grande
parte do setor para a informalidade.
Dificultará também a geração de
empregos na área, enquanto as proporções
dessa nova arrecadação em nada
contribuirão para o crescimento do país.
Ao contrário, dificultarão e diminuirão
as possibilidades de captação de
recursos para os microempresários
culturais, sonhadores de um Brasil mais
culto e civilizado. Aliás, os métodos
utilizados pelo Ministério da Fazenda
revelam nítidos vestígios medievais,
época na qual os aumentos de impostos
eram comunicados sem escrúpulos aos
aldeões, intimidados que eram pelos
ruídos das patas dos cavalos da guarda
montada do senhor feudal.
Precisamos reagir, com todos os meios de
que dispõem os operadores e os
produtores culturais, de forma que a
sociedade venha a tomar conhecimento
desse descalabro. Como se isso não
bastasse, o governo federal acaba de
bloquear 78% do orçamento do Ministério
da Cultura para este ano.
Gostaríamos de saber o que querem dizer
esses fatos. Filmes semelhantes já
vimos em outros países e épocas. Como se
sabe, eles não fizeram sucesso ao
longo da história...
JÚLIO MEDAGLIA , regente sinfônico
formado pela Escola Superior de Música da
Universidade de Freiburg (Alemanha), foi
diretor dos Teatros Municipais do
Rio de Janeiro e de São Paulo, do Centro
Cultural São Paulo e da
Universidade Livre de Música. É autor do
arranjo original da música
"Tropicália", que deu origem
ao movimento.
PAULO PÉLICO , 52, é autor e produtor
teatral.
Os artigos publicados com assinatura não
traduzem a opinião do jornal. Sua
publicação obedece ao propósito de
estimular o debate dos problemas
brasileiros e mundiais e de refletir as
diversas tendências do pensamento
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