[ANPPOM-L] derrubando muros

Jorge Antunes antunes em unb.br
Seg Ago 15 16:53:01 BRT 2011


Olá,

Para os que ainda insistem em contrapor música erudita e música popular,
musica boa e música ruim, vanguardista e repentista, envio a seguir trecho
de artigo que escrevi há uns 12 anos:

      Desde 1875, quando surgiu nos cabarés da Lapa, o maxixe era abominado
pela intelectualidade. Os eruditos torceram tanto o nariz que, quatro
décadas depois, a polícia proibiu a prática da dança em razão da lascívia de
seus praticantes. A baixaria só veio a ser reconhecida como arte quando
Mário de Andrade, já nos anos 30, qualificou o maxixe como a primeira dança
genuinamente brasileira e estudou sua gênese sincopada da cultura
afro-lusitana.

      Esse tipo de história, em que intelectualóides condenam a arte
comercial de mau gosto, viria a se repetir com a Geração Paissandu, no Rio.
Os jovens intelectualizados dos anos 60, freqüentadores do Cine Paissandu,
passaram a se apaixonar pelas musas de Godard depois de muito torcerem o
nariz para as chanchadas da Atlântida. Enquanto Anna Karina e Anne Wyazenski
eram cultuadas no Paissandu da Rua Senador Vergueiro, astros como Eliana,
Oscarito, Cyl Farney e Adelaide Chioso, na tela do Poeira da Rua Larga, eram
repudiados pelos intelectuais. Hoje a Chanchada é matéria de estudo na
Universidade, cultuada de modo científico, e é assunto de inúmeras teses
acadêmicas nas áreas de Cinema e Comunicação.

             Por essas e outras eu não condeno os tchans, as bundas
televisivas, as danças da garrafa e nem as egüinhas pocotós. Estou certo de
que dentro de uns 30 anos, teses e mais teses serão escritas na Academia,
estudando o comportamento e a semiologia das egüinhas rapidinhas dos bailes
funks, e a estética e estilística de poucos tons dos pocotós. Já vislumbro
defesa de tese no Anfi 9 da UnB, em 2040: *"A interdisciplinaridade como
forma de hibridismo na egüinha pocotó, sob um olhar fenomenológico e
calipigista".*

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*

             Assim, não me assombro quando tenho notícias de que um
estudante secundarista mergulhou de modo cego sobre outros adolescentes
roqueiros durante o recreio. Isso é cultura. Se já é raro vermos jovens
malhando judas no Sábado de Aleluia, também não me assusto tanto. Nem mais
fico indignado ao ver consagrada a importação do halloween ianque. Tudo isso
é transformação cultural.

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Abraços,
Jorge Antunes
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