[ANPPOM-Lista] O Globo: A música está cada vez mais previsível

Rael Bertarelli Gimenes Toffolo rael.gimenes em gmail.com
Qua Ago 15 13:18:04 BRT 2012


Olá Ale...

Na verdade, o meu texto ficou duvidoso, é bem difícil a gente abordar todos
os aspectos do que a gente tá pensando em um email.

Estou de total acordo com o que vc colocou. Também não acredito muito que é
uma besteira tentar "universalizar", principalmente porque
"universalizações" são exatamente o que a industria cultural pretende. Não
deveríamos cair na mesma armadilha.
O central do que coloquei é que achei que temos que tomar cuidado ao
colocar no mesmo balaio as coisas e compararmos com a mesma lupa coisas que
estão em campos dialéticos muito diversos. Também não podemos deixar de
considerar, por um excesso de zelo, que a situação em que se encontra a
produção de massa é no mínimo exagerada, não acha? Talvez o que mais me
incomoda, e sofro isso diariamente aqui em casa, é que as pessoas que ouvem
os Tchus e Tchas (e creio que não é o caso da história que vc contou) não
tem um mínimo de gentileza em nos excluir disso. As pessoas tem um "prazer"
de ouvir isso à todo volume, nas horas mais impróprias (madrugada como é o
meu caso) de forma que mais de um quarteirão tenha que ouvir junto com o
distinto. Me parece sim que há em conjunto com esses "ritos" uma degradação
até mesmo do respeito à liberdade do próximo em não querer ouvir isso.
Desculpe pela argumentação meio poluição sonora, etc, etc, mas não consegui
expressar melhor que isso. Além disso, a quantidade de música para não ser
ouvida, tem substituído consideravelmente a música para se ouvir. Vc não
concorda que cada vez menos as pessoas realmente param para ouvir música
(lógico que há uma culpa capitalista ai, a pessoa que rala a vida toda para
ganhar o pão e não sobra muito tempo para o resto, não só pra música). Há
hoje em dia há música para tudo, churrasco, elevador, carro, etc. Para
acompanhar, ou servir de ruído de fundo controlado  para diversas práticas
sociais. As pessoas perderam a relação com a escuta em sí. E isso se
reflete, como já sabemos, em muitas facetas do viver. Pergunte aos seus
alunos, quantos deles param para realmente OUVIR música, independente de
estilo, tipo, ou o que quer que seja. É assustador o que vem de resposta.
Enfim, reforçando, não discordo do que vc colocou não, e realmente acho bem
preciso o que vc disse. Enfim, nós aqui discutindo isso, mediados por uma
telinha, sem realmente ouvirmos uns aos outros! Será que não está tudo
relacionado? Será que essa é nova forma de acoplarmos com o mundo?
(digressões à parte)...
Realmente não tenho e acho que ninguém tenha, soluções definitivas para
diversas facetas do que se vive hoje no campo da "fruição" do som (para não
cair em jargões de estéticos), porém, análises mais acuradas da situação
podem proporcionar melhor visão (Será?). Só tentei contribuir com a
discussão para que ela caminhasse.

Enfim... Abração

2012/8/15 Ale Fenerich <fenerich em gmail.com>

> Oi Rael! Tudo bem cara? Um prazer discutir contigo!
>
> Eu acho um problema no seu argumento. Vou contar uma historinha. Bem,
>  você diz:
>
> "Bem, devemos considerar então que a população que ouve os Tchus e Tchas
> estão praticando seus ritos sociais?"
>
>
> E eu retomo com o exemplo da minha finada avó (que Deus a tenha), que todo
> santo dia ligava o rádio AM para dormir, e dormia de roncar. Sem rádio,
> tinha insônia. Do que ela gostava? Dos tchus da época: Roberto Carlos,
> Manolo Otelo, Gilliard. (este último o melhor na minha opinião!!). Essa
> escuta faz ou não faz parte de seu rito pessoal, amparado por um gosto?
>
> Ela poderia muito bem ouvir Mozart na Radio Cultura; entretando
> detestava...eu sei a razão: músicas demasiado longas, ausência de letra, e
> a variação de dinâmica que a fazia acordar.
>
> Minha avó era professora de violino...
>
> Sua faxineira e secretária, que a acompanhou por 50 anos, fazia o mesmo...
> a minha também, mas agora é no trabalho: só escuta belos gospels
> bem-arranjados (esse pessoal tem mesmo muito dinheiro!!) e, claro, tchuca.
>
> Evidentemente que eu não escuto nada disso... não faz parte do meu
> imaginário musical. Entretanto, nem todo mundo gosta de "música boa" -
> felizmente! Essas pessoas nos salvam da dureza de nossos gostos
> bem-tratados...aquilo que chamamos de música ruim é acalanto, é cantável, é
> simples. E simplicidade não se compra no mercado não... Será que é
> marketing? Ora, como alguém já colocou aqui, desde Machaut essa "música de
> marketing" tem se distanciado, na cultura ocidental, da "musica de
> escrita". Mas não vou me alongar nisso: muito pano pra manga!
>
> Enfim, desculpem meu tom anedótico, mas essa onda que nós "acadêmicos"
> temos de universalizar pra mim não cola... não cola, babe...não dá!!
>
>
> um abraço!
>
>
>
> Em 15 de agosto de 2012 02:42, Rael Bertarelli Gimenes Toffolo <
> rael.gimenes em gmail.com> escreveu:
>
> Caros,
>>
>> Primeiro, desculpe se o Reply não saiu correto.. meu webmail as vezes faz
>> besteria...
>>
>> Enfim,
>> Concordo em alguns pontos e discordo em outros. Primeiro, o estudo é
>> realmente positivista, ingênuo, faz medição de quantidade de notas,
>> amplitude geral, etc, como todos já apresentaram aqui de forma
>> interessante, porém não podemos desconsiderar a degeneração que realmente
>> ocorre. Se compararmos isso com uma visão ingênua e "erudita" meio Haute
>> Couture, realmente não acrescentamos nada de interessante à discussão. Os
>> argumentos, a pouco apresentados pelo Alê, sobre o Webern e sua
>> "simplicidade-complexidade" estrutural foram muito bem colocados. As
>> críticas em relação ao repertorio escolhido também foram ótimos, entre
>> todos os outros argumentos muito lúcidos que foram discutidos aqui, porém
>> comparar os "sucessinhos" comerciais atuais ao lundú é um pouco exagerado.
>> Temos que considerar o que é realmente produto "autêntico", e eu diria,
>> honesto de um grupo social daquilo que é confeccionado à partir de um
>> modelo de negócios dentro de uma "super saudável" estrutura de Budget
>> Empresarial. Afinal, como saiu em uma dessas revistas semanais "que se
>> dizem jornalísticas", nas palavras do próprio artista que criou a pérola,
>> "a grande revolução do sertanejo atual foi a transformação da dupla
>> sertaneja em uma empresa comercialmente organizada como qualquer outra".
>> Bem, a última coisa que interessa ai é a música. Bem, o Lundu também não
>> interessava tanto assim a música, era quase que um rito-social,
>> fundamentalmente ligado à dança, ok, mas um rito social legítimo de um
>> grupo que dava um valor autêntico para aquela prática. Bem, devemos
>> considerar então que a população que ouve os Tchus e Tchas estão praticando
>> seus ritos sociais? Não me parece, afinal, se fosse um rito ele seria mais
>> constante nas escolhas musicais e até nas danças que os caracterizariam,
>> não seria isso que define o rito? - constância e tradição com modificações,
>> logicamente, pois o folclore deve ser vivo - mas o que vemos é uma troca
>> acelerada e descartável o que parece confirmar que os Tchus e ai se te
>> pegos, boquinhas da garrafa, água mineral, etc, etc, não podem ser
>> considerados como manifestações legítimas de grupos sociais e sim "coisas"
>> empurradas por ótimas técnicas de marketing para as pessoas. Não devemos
>> esquecer que os profissionais de Marketing são caras muito bom no que
>> fazem! Então acho que podemos falar sim de degradação cultural,
>> empobrecimento perceptual, "regressão da audição", ainda que muita gente
>> considere Adorno meio "batido". A pesquisa feita é em sí boba, mas as
>> discussões aqui estão alçando vôos interessantes e não podemos ficar
>> colocando tudo no mesmo saco. Citando Pound "Literatura é simplesmente
>> linguagem carregada de significado até o máximo grau possível" e ainda: "Se
>> a literatura de uma nação entra em declínio a nação se atrofia e decai.". A
>> despeito das discussões de se música é ou não linguagem, acho no mínimo
>> interessante pensarmos na música da mesma forma, já que música sendo ou não
>> linguagem é um processo, no mínimo, significante, carregado de sentido. Não
>> defendo aqui uma "erudição", tanto que me parece que o Lundú, ou qualquer
>> outra manifestação artístico-social não tem nada de simplificante, muito
>> pelo contrário, são extremamente complexos em sua natureza. E também não
>> defendo os pastiches que foram feitos no romantismo brasileiro e
>> subsequentes períodos de tentar "traduzir" esses fenômenos para as salas de
>> concerto num ideal de Haute Couture de uma elite branca "europeizada" da
>> época. Mas podemos sim separar o joio do trigo, principalmente na
>> atualidade e termos claros aquilo que é feito com honestidade daquilo que é
>> feito pra "vender plástico" (plástico do CD - se bem que hoje isso também
>> morreu).
>>
>>
>> 2012/8/14 luciano cesar <lucianocesar78 em yahoo.com.br>
>>
>>> Ok, então um levantamento de dados que acusa a falta absoluta de
>>> criatividade e o clichesismo da música comercial que canaliza milhões em
>>> dinheiro; um levantamento de dados - positivista, mas um levantamento - que
>>> embasa a denúncia do oportunismo da vadiagem... e isso é chamado de eugenia
>>> musical mal fundamentada por um acadêmico.
>>>
>>>   E tudo bem...
>>>
>>> Luciano
>>>
>>> --- Em *seg, 13/8/12, Pedro Filho <pedrofilhoamorim em gmail.com>*escreveu:
>>>
>>>
>>> De: Pedro Filho <pedrofilhoamorim em gmail.com>
>>> Assunto: Re: [ANPPOM-Lista] O Globo: A música está cada vez mais
>>> previsível
>>> Para: "Ale Fenerich" <fenerich em gmail.com>
>>> Cc: anppom-l em iar.unicamp.br
>>> Data: Segunda-feira, 13 de Agosto de 2012, 10:16
>>>
>>> O problema (ou a salvação, vai saber) é que os vigilantes não apitam
>>> muito fora da cerquinha acadêmica.
>>> E essas pesquisas que querem provar a decadência de alguma coisa (me
>>> lembra um pouco Adorno, mal comparando, porque ele se aprofundava no
>>> próprio preconceito e até o transcendia um pouco) na verdade querem é
>>> reforçar uma visão rasa do que seria uma "arte maior"....como alguém
>>> comentou aqui: bullshit...
>>>
>>> Isso pra mim só serve pra ouvir mais conversa fiada na mesa do bar, de
>>> gente enaltecendo Chico Buarque e dizendo que o tchu-tchá, ou o funk, ou o
>>> pagodão "não são música", igualzinho ao que os sinhozinhos diziam do lundu
>>> outrora. Eugenia musical mal fundamentada. Que preguiça....
>>>
>>>
>>> Em 12 de agosto de 2012 19:37, Ale Fenerich <fenerich em gmail.com<http://mc/compose?to=fenerich@gmail.com>
>>> > escreveu:
>>>
>>> E não é?
>>>
>>> Webern, o Pai de Todos Nós, no fim estava compondo com 3 notinhas
>>> apenas... mas ele tem a péssima mania de transpor, é um sujeito
>>> impaciente...
>>>
>>>
>>>
>>> Em 12 de agosto de 2012 14:02, Carlos Palombini <cpalombini em gmail.com<http://mc/compose?to=cpalombini@gmail.com>
>>> > escreveu:
>>>
>>>  até que não está tão ruim: todo o "nosso" cânone foi criado com 12! E
>>> são centenas de anos de música... Conclui-se que as 4 notas para 11 músicas
>>> em uns poucos aninhos representam um significativo avanço. Sim, isto é
>>> ciência.
>>>
>>>
>>> 2012/8/12 Ale Fenerich <fenerich em gmail.com<http://mc/compose?to=fenerich@gmail.com>
>>> >
>>>
>>> mais ciência...
>>>
>>>
>>>
>>> http://colunas.revistaepoca.globo.com/bombounaweb/2012/08/11/11-musicas-de-micareta-criadas-com-as-mesmas-quatro-notas-musicais/
>>>
>>>
>>> ________________________________________________
>>> Lista de discussões ANPPOM
>>> http://iar.unicamp.br/mailman/listinfo/anppom-l
>>> ________________________________________________
>>>
>>>
>>>
>>>
>>> --
>>> ------------------------------------------
>>> Alexandre Sperandéo Fenerich
>>> prof. Adjunto IAD - UFJF - http://www.ufjf.br/musica/
>>>
>>> http://soundcloud.com/ale_fenerich
>>> http://sussurro.musica.ufrj.br/fghij/f/fenerichale/fenerichale.htm
>>> n-1.art.br
>>> http://soundcloud.com/n-1-1
>>> http://www.ufjf.br/eimas/
>>> http://www.ufjf.br/tecartes/
>>> http://www.limiares.com.br/duo-n1.html
>>>
>>> (55 32) 8481-8277
>>>
>>>
>>>
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>>> ________________________________________________
>>> Lista de discussões ANPPOM
>>> http://iar.unicamp.br/mailman/listinfo/anppom-l
>>> ________________________________________________
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>>> --
>>> Pedro Filho Amorim
>>> http://www.myspace.com/pedrofilho
>>> http://peofilho.wordpress.com/
>>> (71)8830-7287
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> ------------------------------------------
> Alexandre Sperandéo Fenerich
> prof. Adjunto IAD - UFJF - http://www.ufjf.br/musica/
>
> http://soundcloud.com/ale_fenerich
> http://sussurro.musica.ufrj.br/fghij/f/fenerichale/fenerichale.htm
> n-1.art.br
> http://soundcloud.com/n-1-1
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> http://www.ufjf.br/tecartes/
> http://www.limiares.com.br/duo-n1.html
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