[ANPPOM-Lista] Para refletir!

Daniel Puig danielpuig em me.com
Qui Fev 27 07:11:08 BRT 2014


car em s,
concordo com rodolfo e diósnio, eu mesmo artista e professor, terminando meu doutorado e trabalhando em uma universidade pública (com educação musical)...
mas considero, diósnio, que ver o título como forma de dar suporte a financiamentos é uma distorção e tanto, também sintoma do mesmo colonialismo que você apontou. mestres e doutores são formados para que se tenha pesquisadores e pedagogos. sim, mestrado e doutorado também são pensados como uma formação pedagógica para o ensino superior. ou seja, poder justificar financiamentos é uma outra história, que vem a reboque de se ter alguém que, tendo passado por estes árduos cursos e práticas de pesquisa e ensino, provavelmente tem condições de oferecer na universidade onde atua um ensino e formação de qualidade para novos pesquisadores e professores... ou artistas, ou profissionais de diversas áreas, que podem ou não atuar na pesquisa e no ensino. por este último "ou" é que mestrado profissional é criação que -não- visa a formação de pedagogos, mas de profissionais que atuam em outros campos de suas áreas, que não o ensino.
se estiver errado, por favor, corrijam-me.
abraços e bons carnavais,
daniel puig


Em 26/02/2014, à(s) 22:05, Diósnio Machado Neto <diosnio em gmail.com> escreveu:

> Caros colegas,
> 
> Acho que insistir na discussão do mérito sobre ter ou não ter o artista sem titulação dentro da universidade brasileira não é a questão. Acredito que o importante é como se ensina instrumento no Brasil e quais são as reais condições em que ocorre este ensino, ou mesmo como se forma o processo de aprendizado, desde a infra estrutura até a "superiorização" deste ensino. Planteado assim não há cabimento cruzamentos e transportes de realidades. É sintoma do colonialismo impresso nos gens que nos faz olhar para os Estados Unidos, ou mesmo para o Piauí desde São Paulo; ou de Tatuí para Maceió...
> Assim sendo, e sempre considerando que o ofício da música é tão importante como a ciência da música, e portanto um título não definiria a contenda, me permitam apenas apimentar a discussão considerando que a insistência na questão do título serve como um torniquete, que de tanto virar se esquece do fator primordial da exigência do título, que é dar condições de acesso às políticas de financiamento das agências, ampliando a capacidade de montagem de infra estruturas nos núcleos de ensino superior público. E a realidade é que esta ideia não tem prosperado, porque até onde percebo há poucos projetos de infra estrutura para ensino de instrumento financiados pelas agências de pesquisa. Não sei se isto é tão agudo como vejo e pergunto para quem sabe se assim é? E se isto for verdade, o processo de titulação torna-se inócuo. Logo seria melhor pensar em outras alternativas que deem mais impulso ao ensino de instrumento. E é neste ponto que quero me dispor e expor minha visão. 
> Primeiro quero dizer que, apesar dos muitos avanços, significativos e do tamanho e méritos das notas de avaliação que vemos, por exemplo, na UFRGS, mudar a forma de ingresso do professor na universidade na nossa realidade é tanto mais difícil do que parece ser entender, e usar, as possibilidades de articulação que estão disponíveis dentro do próprio sistema. Para mim, o que aponta o Rodolfo poderia ser sanado se as instituições superiores de ensino técnico, como no caso das Fatecs paulistas, assumissem o que é difícil para a universidade, ou seja, montar a imensa estrutura que é necessária para capacitar o jovem no aprendizado de um instrumento. Pode parecer simplista, mas o que vejo hoje no Brasil é o aluno que quer ser um instrumentista privado de ambientes fundamentais para seu desenvolvimento, simplesmente porque a universidade tem protocolos de contratação e gastos que não são condizentes com o que necessita o instrumentista para se desenvolver; pergunto onde no Brasil há um orquestra-disciplina que dê oportunidade para o instrumentista aprender a tocar um repertório que vai de Mozart a Mahler? Isto pode se desdobrar para música de câmara, e tantas outras áreas do aprendizado do instrumento.  É só imaginar que boa parte dos músicos de orquestra em São Paulo, por exemplo, tiveram seu treinamento na Orquestra Experimental de Repertório (e aqui fica minha homenagem ao Jamil Maluf) e não numa disciplina regular e nos corpos musicais nas diversas escolas de música espalhadas em três universidades públicas!!!!!
> Em suma, o problema está além de ter ou não o professor artista. Está nas possibilidades, reais, de infraestrutura de ensino e, também, na formação de uma mentalidade do professor titulado em buscar as vias de financiamento que lhe permite o título. E isto articula-se também por definir melhor uma política institucional sobre a música na universidade, pois parece que queremos tudo, mas podemos bem pouco! Esta condição que nos fragiliza ao requerer paridade do artista com o cientista (e por favor me poupem de explicação da natureza de um e de outro, pois ambos formam o arabesco do saber e sentir humano)
> Logo, mesmo que sem expor outros argumentos, acho que o problema como exposto parece ser mais uma questão de reconhecimento do artista diante do saber científico (que é filosófico e butequeiro ao mesmo tempo) do que a disposição de criar estruturas competentes para o desenvolvimento do jovem instrumentista, que o título permite (e até acho justo bradar contra isto, mas aí é outro departamento).
> Atenciosamente,
> Diósnio Neto
> 
> 
> No dia 26 de Fevereiro de 2014 às 09:24, <corvisier em usp.br> escreveu:
> Caro Rodolfo,
> 
>  
> 
> Acho que você se enganou. Existem sim professores artistas, sem doutorado, lecionando em tempo integral  nas universidades estatais americanas. Posso citar um exemplo do meu ex-professor de piano  e um notável artista Abbey Simon, que apesar dos seus 91 anos,  ainda leciona em tempo integral na Universidade de Houston.
> 
> 
> 
> Fernando Corvisier
> 
> 
> De: rcoelho em usp.br
> Para: "Mario Marçal Jr" <mariomarcaljr em gmail.com>
> Cc: "Anppom CADASTRO" <anppom-l em iar.unicamp.br>, "Anppom CADASTRO" <anppomcadastro em gmail.com>
> Enviadas: Segunda-feira, 24 de Fevereiro de 2014 18:04:03
> Assunto: Re: [ANPPOM-Lista] Para refletir!
> 
> 
> Meu caro Mario,
> Nem tão bom assim. Quem conheceu de perto a vida universitária americana (fiz doutorado e pós-doc por lá) sabe que esse artigo é falacioso.
> O primeiro aspecto a considerar é que as universidades americanas mencionadas são privadas. E mesmo quando (parcialmente) estatais tem uma autonomia muito maior do que as nossas públicas. Lembre-se que as universidades brasileiras privadas também podem contratar (e contratam) professores sem doutorados e mestrados. Às vezes até despedem um professor quando ele completa uma titulação porque o salário deveria aumentar (conheço colegas que viveram essa experiência).
> Na prática, na área de música, nunca conheci um professor de universidade norte-americana sem titulação acadêmica: doutorado para as áreas teóricas, ou mestrado para as cadeiras de ensino de instrumento. Havia (e há tempos atrás com mais frequência) a prática de contratar grandes artistas sem titulação, mas de grande reputação. Eleazar de Carvalho, por exemplo, foi professor de Yale. Mas não o era em tempo integral. Regia a OSESP durante o ano e reservava alguns meses das férias no Brasil (que coincidem com um período letivo no hemisfério norte) para dar aulas de regência por lá. Era uma espécie de professor honorário. Quem “carregava o piano” no resto do ano era outro professor menos conhecido, mas portador de titulação.  E esse tipo de contrato é cada fez menos frequente.
> Os doutorados, aqui e lá, são essenciais para a formação de um pesquisador e de um docente. Grandes profissionais (ou artistas, no nosso caso) não são necessariamente bons pesquisadores e nem mesmo bons professores. São carreiras e competências diversas.
> Creio que na nossa área o problema é outro, e bem mais específico. A universidade pública brasileira fez uma mistura dos modelos universitários europeus e americanos, mas engessou as flexibilidades que porventura tais modelos tivessem. Tempos atrás podíamos contratar mestres. Isso está se tornando cada vez mais raro. A USP, onde trabalho, não o permite mais, em nenhuma hipótese. Isso dificulta muito a contratação de professores de instrumento. Os cursos de música que pretendem oferecer bacharelados em instrumento sofrem pela escassez de profissionais competentes com titulação de doutor. Esse tipo de profissional não tem vocação e nem interesse pela pesquisa acadêmica. Aliás, não se deveria esperar que tivessem, pois não é a natureza de sua profissão. Por isso as universidades americanas contratam regularmente portadores de títulos de mestres para essas cadeiras (e não exigem que eles façam pesquisa) e as europeias contratam esses professores nos conservatórios e não nas universidades. Por outro lado projetos em cursos de música de nossas universidades que pretendam se voltar para uma formação fortemente teórica, como para as carreiras de musicólogos, professores de teoria, e mesmo educadores e compositores, principalmente os que se dedicam às novas tecnologias, continuam a sofrer uma forte resistência dos colegas, por razões que tem a ver com disputas de mercado de trabalho e não com a natureza do trabalho que realizam, que é perfeitamente adequado ao perfil de um conhecimento universitário.
> Lembremos que a universidade não é apenas um local de formação profissional. É o espaço do saber, profissionalizante ou não. Nem é a universidade o único local de formação profissional. Por exemplo, a escolinha de futebol do Santos F.C. tem formado profissionais muito bem sucedidos. Quem não gostaria de ganhar o salário do Neymar?
> Não apenas por isso, mas também por isso, vira e mexe ressurgem as críticas do teor desse texto aos professores titulados, como se eles representassem uma reserva de mercado. Criar critérios de seleção não é fazer reserva de mercado, é cuidar do resultado da contratação para os fins pretendidos.
> 
> O que a universidade brasileira deveria reconhecer é a natureza diversa dos diferentes professores que são necessários para se montar um curso de música e colocar exigências de concurso, modelos de contrato e planos de carreiras diferenciados para as diferentes situações. Muita disputa interna desnecessária seria evitada com isso. Mas parece que isso é um ovo que nem Colombo conseguiria colocar em pé.
> Rodolfo Coelho de Souza
> 
> De: "Mario Marçal Jr" <mariomarcaljr em gmail.com>
> Para: "Anppom CADASTRO" <anppomcadastro em gmail.com>, "Anppom CADASTRO" <anppom-l em iar.unicamp.br>
> Enviadas: Domingo, 23 de Fevereiro de 2014 13:18:20
> Assunto: [ANPPOM-Lista] Para refletir!
> 
> Olá Caríssimos Colegas!!!
> 
> Um excelente texto para nossa reflexão! !!
> 
> http://ordemlivre.org/posts/sem-doutorado-entao-fora?fb_action_ids=10151995942207712&fb_action_types=og.likes&fb_source=other_multiline&action_object_map=%5B1389838204606209%5D&action_type_map=%5B%22og.likes%22%5D&action_ref_map=%5B%5D
> 
> Grande abraço
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> Diósnio Machado Neto
> História da Música e Música Brasileira
> Departamento de Música - FFCLRP/USP
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