[ANPPOM-L] Villa-Lobos e a musicologia (era VL e Ives)

Rubens Ricciardi rrrr em usp.br
Sex Ago 17 14:55:25 BRT 2007


meus caros,

bastante oportuna e esclarecedora a lembrança do Prof. Palombini daquele 
debate "Behague X Tarasti"...

e só completando esta mesma questão do "nacionalismo", gostaria aqui de 
lembrar ainda a concepção madura do próprio Mário de Andrade, que consta já 
em seu "Banquete":

"Não sou nacionalista. Sou simplesmente nacional.  Nacionalismo é uma teoria 
política, mesmo em arte. Perigosa para a sociedade, precária como 
inteligência".

Esta brilhante conclusão de Mário de Andrade (redigida entre 1943 e 1945) é 
a definitiva superação do "Ensaio" de 1928 (e infelizmente nossos colegas 
musicólogos brasileiros se lembram sempre do Mário de Andrade nos anos 20, e 
ignoram quase sempre o Mário dos anos 40, quando ele justamente corrigiu 
seus erros "nacionalistas" e apontou para soluções bem mais interessantes), 
ou mesmo está já inserida num contexto bem posterior aos debates em torno 
dos manifestos "Pau-Brasil" (1924) e "Antropofágico" (1928) de Oswald de 
Andrade - daí talvez a metáfora(?) de Tarasti, os "irmãos" Andrade enquanto 
condutores das polêmicas (afinal, são os dois pilares indissociáveis àquela 
altura da modernidade no Brasil): o Oswald irreverente criava as teses e o 
Mário estudioso tentava argumentar em torno delas...

e, concluindo ainda, após o "Banquete" de Mário de Andrade, qualquer uso do 
conceito de "nacionalismo" em música do século XX no Brasil torna-se já 
problemático, pois este conceito foi contaminado definitivamente tanto pelo 
fascismo italiano como pelo nazismo alemão - ambas ideologias nacionalistas, 
e, portanto já sempre, imperialistas, belicistas, totalitárias (ou seja, 
ditatoriais e antidemocráticas) e xenófobas.  Contaminaram definitivamente e 
de tal modo o conceito, que não se pode mais empregá-lo quando referido a 
movimentos nas artes entre aproximadamente 1920 e 1969 no Brasil, mesmo que 
nossa realidade artística tenha sido outra, diferentemente da realidade 
italiana ou alemã da época - não obstante haver ainda maior dificuldade 
nesta discussão, pois vista sob outros aspectos, a própria ditadura de 
Getúlio Vargas tem pontos em comum com aquelas ditaduras na Europa. Ainda 
por cima, entre outros fatores, o nacionalismo romântico do século XIX teve 
como resultado a primeira Guerra Mundial. Já o nacionalismo nazi-fascista 
teve como resultado a  Segunda Guerra Mundial.
Vale a pena insistir ainda neste mesmo conceito pra se falar de música????

abraços a todos do Rubens Ricciardi


----- Original Message ----- 
From: "carlos palombini" <palombini em terra.com.br>
To: "ANPPOM lista" <anppom-l em iar.unicamp.br>
Sent: Wednesday, August 15, 2007 11:10 AM
Subject: [ANPPOM-L] Villa-Lobos e a musicologia (era VL e Ives)



Paulo Renato Guérios, um antropólogo formado pelo Museu Nacional (UFRJ),
defendeu em 2001 e publicou em 2003, pela Editora da Fundação Getúlio
Vargas, um trabalho excelente sobre Vila Lobos, _Heitor Villa-Lobos: o
caminho sinuoso da predestinação_, a meu ver o que de melhor se publicou
sobre VL no Brasil.

O trabalho de Tarasti é admirável pela abrangência do repertório
analisado e pela ênfase dada ao modernismo do autor, em detrimento de
seu nacionalismo (a tônica do Villa-Lobos de Béhague). Muito oportunas
também são as críticas de Tarasti à musicologia brasileira. Tarasti foi
trucidado por Béhague  numa resenha que este publicou em sua própria
revista, a _Latin American Music Review_, que em nada contribuiu para
sua (a de Béhague) reputação. É verdade que o trabalho de Tarasti contém
pequenos erros que o podem tornar presa fácil de críticas malevolentes.
Por exemplo, possivelmente por analogia com os irmãos Andada, ele fala
dos "irmãos Andrade", atribuindo a Oswald e Mário um parentesco que deve
ter feito o segundo cantar lundus na cova. Todavia, comparado com o de
Tarasti, o VL de Béhague me parece excessivamente "êmico", isto é,
excessivamente ligado às posições e pressupostos da musicologia
brasileira. Não é à toa que o VL de Béhague se abre com a saudação de
Mariz: "Welcome to the Villa-Lobos club of scholars!"

Carlos
<palombini em terra.com.br>


José Luiz Martinez escreveu:
> Colegas,
>
> Sobre análise da obra de Villa-Lobos, gostaria de recomendar a tese de
> doutorado da Valerie Albright, defendida nos aureos anos do programa de
> Comunicação e Semiótica da PUC-SP. Ela trabalhou com Ives e Villa-Lobos,
> aplicando o método de Wallace Berry. As referÊncias:
>
> ALBRIGHT, Valerie (2002). "Aproximações entre duas culturas americanas na
> linguagem de Ives e Villa-Lobos", tese de doutorado não publicada. São
> Paulo: PUC.
>
> E, claro, não poderia deixar de citar o livro de meu ex-orientador, Eero
> Tarasti, repleto de análises criteriosas:
>
> Tarasti, Eero (1995). Heitor Villa-Lobos, the Life and Works, 1887-1959.
> Jefferson: McFarland.
>
> Abraços,
> Martinez
>
>
>


-- 
carlos palombini (dr p)
professor adjunto de musicologia
universidade federal de minas gerais
<cpalombini em gmail.com>

"Revolutionär wird der sein, der sich selbst revolutionieren kann" (Ludwig 
Wittgenstein, Vermischte Bemerkungen)

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