[ANPPOM-L] FWD: TRADI ÇÃ O E RUPTURA - John Corigliano e a m ú sica do presentepor Matheus G. Bito ndi

silvio silvio.ferraz em terra.com.br
Sex Jul 20 15:10:31 BRT 2007


interessante a frase:

" A libertação das amarras seriais e a 
conseqüente reabertura dos ouvidos para toda a 
história da música"
afinal de contas ela era usada antes de outro 
modo: "a liberação da música das amarras do 
tonalismo", "a liberação do som". E não houve 
época mais aberta a ouvir toda a história do que 
os anos 50 e 60, nas classes de messiaen e 
maderna.

o mundo dá voltas e esquece as voltas dadas.

silvio ferraz


>Revista Trópico online
>
><http://p.php.uol.com.br/tropico/html/textos/2883,1.shl>
>
>
>TRADIÇÃO E RUPTURA
>
>John Corigliano e a música do presente
>
>Por Matheus G. Bitondi
>
>O compositor americano, um dos mais ilustres do pós-modernismo, esteve em
>São Paulo para palestras e concerto
>
>A uma pequena peça com caráter de abertura, escrita em linguagem mais
>tradicional e que denunciava a influência de Aaron Copland, seguia-se um
>concerto para clarinete de execução dificílima, linguagem contemporânea e
>orquestração inusual. Para encerrar, uma grandiosa sinfonia, que mesclava
>estas duas linguagens e acrescentava pitadas de um romantismo mahleriano.
>
>Assim foi o programa do concerto da Orquestra Sinfônica do Estado de São
>Paulo, na última noite do mês de maio na Sala São Paulo. Curioso, no
>entanto, era observar que estas três obras tão díspares haviam sido escritas
>por um mesmo compositor: John Corigliano. Também presente no espetáculo, o
>nova-iorquino nascido em 1938 acompanhava cada compasso de suas composições,
>instalado em um camarote logo acima da orquestra.
>
>À tarde, havia estado na USP, a convite do Departamento de Música da Escola
>de Comunicações e Artes, onde discursara e debatera a respeito de suas obras
>e idéias para uma platéia que contava com a presença de alguns dos mais
>destacados compositores locais, tais como Ronaldo Miranda, José Antônio de
>Almeida Prado, Marisa Rezende, entre outros.
>
>Com a mesma clareza com que se organizam suas obras, Corigliano falou sobre
>suas idéias, suas obras, seus métodos e técnicas de composição. Questionado
>acerca de sua posição perante o panorama musical atual, exaltou em sua
>resposta a liberdade estética e técnica dos tempos atuais, em detrimento do
>que classificou como uma postura "fundamentalista" dos compositores ligados
>ao serialismo integral, poética predominante nas décadas de 1950 e 60. "As
>técnicas estão todas em minha mente. Uso-as conforme as necessito", disse.
>
>Tal liberdade havia permitido ao compositor justapor em seu "Concerto para
>Clarinete" (1977) passagens cromáticas organizadas a partir de uma série
>dodecafônica a uma citação de uma sonata de Giovanni Gabrieli, escrita em
>1597; ou ainda incluir uma tarantela como segundo movimento de sua "Sinfonia
>nº.1" (1988). Segundo Corigliano, não haveria mais barreiras estéticas neste
>mundo globalizado e internetizado. Todas as técnicas e estéticas surgidas ao
>longo do século XX, por mais antagônicas que fossem, poderiam agora se unir
>a 700 anos da tradição musical ocidental, aglomerando-se em uma só peça.
>
>Além disso, ao que podemos deduzir de suas obras, são bem-vindos de volta à
>música contemporânea a melodia e a tonalidade da harmonia clássica, assim
>como estão abertas as portas para ritmos e gêneros advindos da música
>popular e folclórica de qualquer parte do mundo.
>
>Este ecletismo, porém, não é uma característica exclusiva da música de John
>Corigliano. Ele insere o compositor em um contexto que a historiografia
>musical recente -não sem a desconfiança de muitos- tende a denominar como
>pós-modernismo, aproximando as obras de Corigliano às de compositores como o
>russo Alfred Schnittke, o estoniano Arvo Pärt, os poloneses Henryk Górecki e
>Krzysztof Penderecki (em sua fase mais recente) e, no panorama nacional, de
>compositores como Gilberto Mendes.
>
>Como se pode averiguar por suas obras, esse ecletismo se manifesta nestes
>compositores ditos pós-modernos como uma clara intenção de restabelecer uma
>conexão entre suas composições e a História, seja pelo uso de citações ou
>alusões a músicas já existentes, ou pelo emprego de gêneros, técnicas e
>estruturas relacionados a outras épocas e tradições.
>
>Entretanto, o que haveria de novo nesta postura? E o que a diferenciaria
>dentro da história da música? O ecletismo já não estaria presente, por
>exemplo, em Monteverdi, ao lançar mão da prima e da seconda pratica,
>alinhadas respectivamente às estéticas renascentista e barroca? A referência
>a músicas populares já não se faria sentir em compositores como Tchaikóvski
>e Dvorák, que construíam sinfonias a partir de temas inspirados no folclore?
>
>Como se vê, muitos dos procedimentos observados nesta nova música
>pós-moderna não correspondem com o mesmo grau de novidade, sendo recorrentes
>em séculos de história da música. O fato é que a atitude destes compositores
>só pode ser compreendida se colocada em oposição direta à tendência que a
>precedeu, isto é, às poéticas ligadas ao serialismo integral.
>
>Durante os 20 anos que sucederam a Segunda Guerra Mundial, imbuídos da
>sensação de que a velha cultura européia havia culminado na destruição que
>se observava por toda parte, alguns compositores, como Karlheinz
>Stockhausen, Pierre Boulez e muitos outros, teriam empreendido um radical
>rompimento com tudo o que se ligava à música tradicional1, à época
>diretamente relacionada às propagandas nazistas, fascistas e stalinistas.
>Posteriormente, em meados da década de 1970, superados alguns dos traumas da
>guerra, entrariam em cena compositores buscando reatar os laços com a
>tradição, restabelecendo um diálogo entre o presente e o passado musicais.
>
>É nesse contexto que se insere John Corigliano. Referências à tradição
>musical estão presentes no todo e em cada compasso de suas obras. Ele toma
>de empréstimo gêneros clássicos, como a sinfonia ou o concerto, e os recheia
>de alusões tanto a obras consagradas do repertório quanto a pequenas
>estruturas tradicionais, como o motivo melódico ou mesmo o acorde perfeito.
>
>Tais alusões são geralmente expostas de maneira clara e escancarada ao
>ouvinte, e Corigliano é mestre em costurá-las em um contexto incrivelmente
>homogêneo. No entanto, é preciso dizer que esta referencialidade se dá por
>vezes de maneira óbvia e estereotipada. Em sua "Sinfonia nº.1", composta em
>homenagem a vários de seus amigos mortos pela Aids, o compositor elabora uma
>pequena melodia para cada uma destas vítimas, conectando-as em uma colcha de
>retalhos, à maneira daquelas montagens que se fazem com fotos de pessoas que
>se foram. O caráter triste que Corigliano imprime a cada uma destas
>melodias, contudo, é similar ao que ilustra cenas tristes em filmes
>hollywoodianos dos mais pasteurizados.
>
>O fato de Corigliano não procurar por novos meios melódicos para expressar
>sua tristeza aponta para uma outra característica do chamado pós-modernismo
>musical. Se as poéticas do pós-guerra se destacaram pelo caráter
>experimental de suas composições, especulando acerca dos parâmetros que
>norteiam do discurso musical, como a harmonia, os timbres e texturas, a
>orquestração e tantos outros, os compositores do pós-modernismo parecem se
>portar de modo muito mais conformista. Talvez pela comodidade de disporem de
>vários séculos de repertório e técnica musical prontos para o uso, eles
>tenham se aposentado da arriscada atividade especulativa.
>
>A mensagem que se extrai disso denota um certo pessimismo. Tem-se a
>impressão de que o novo se esgotou, e que apenas nos resta reorganizar o
>velho. No contexto histórico em que se insere, esta postura conformista
>coincide com o enfraquecimento das utopias nas últimas décadas do século XX.
>
>Nascido durante o Renascimento, em substituição à religião que perdia força
>nos meios humanistas, o pensamento utopista se alicerçava grosso modo sobre
>o preceito de que o ideal de perfeição não se encontrava em um mundo além e
>inatingível, como criam os medievais, mas poderia ser alcançado pelo
>empreendimento dos homens.
>
>Não por acaso, a religiosidade é outro fator que volta a se manifestar na
>música destes compositores pós-modernos e pós-utópicos. Na "Sinfonia nº.1"
>de Corigliano, ela surge sob a forma de um ritual fúnebre em memória de seus
>amigos, mais claramente no movimento final da obra. Em outros compositores,
>a religiosidade chega a ser o pretexto central da obra, como é o caso de
>Pärt ou Górecki.
>
>Extramusicalmente, outro fator que permite agrupar estes compositores sob um
>mesmo rótulo é o seu discurso. A libertação das amarras seriais e a
>conseqüente reabertura dos ouvidos para toda a história da música ecoam em
>suas falas e sintetizam-se musicalmente no que Alfred Schnittke viria a
>denominar "poliestilismo", poética da qual a obra de Corigliano é um bom
>exemplo.
>
>Entretanto, é curioso observar que, livres das restrições seriais,
>compositores de histórias e caracteres tão diversos, espalhados por regiões
>geográfica e culturalmente tão afastadas, como a Rússia, os Estados Unidos e
>o Brasil, tenham encontrado um mesmo caminho no usufruto desta liberdade,
>enquanto compositores que jamais se desvincularam totalmente de alguns
>preceitos seriais, como Stockhausen, Luigi Nono ou Iannis Xenakis, puderam
>trilhar caminhos muito mais diversos uns dos outros. A diversidade, porém,
>se não se manifesta na ideologia dos compositores do pós-modernismo, é
>gritante em suas obras, como ficou claro ao longo das três peças de John
>Corigliano executadas pela Osesp.
>
>
>O que ouvir:
>
>John Corigliano:
>- Sinfonia nº.1
>- Concerto para Clarinete
>
>Outros compositores "pós-modernos:
>- Alfred Schnittke: Concerto Grosso nº.1
>- Henryk Górecki: Sinfonia nº. 3
>- Arvo Pärt: Tabula Rasa
>
>
>Publicado em 17/7/2007
>
>.
>
>Matheus G. Bitondi
>É compositor, mestre em análise musical pela Unesp.
>
>1 - A bem da verdade, este rompimento resulta de uma interpretação
>superficial das idéias destes compositores, tendo em vista que o próprio
>Boulez utilizou-se de referências a formas musicais tradicionais, como a
>sonata, neste período que se seguiu à guerra.
>
>
>Revista Trópico online
>
><http://p.php.uol.com.br/tropico/html/textos/2883,1.shl>
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