[ANPPOM-L] Sobre o espet á culo "Luar Trovado", baseado em "Pierrot Lunaire" de Schoenberg

Luciana Gifoni nanagifoni em gmail.com
Ter Jun 12 19:37:10 BRT 2007


Em 12/06/07, Luciana Gifoni <nanagifoni em gmail.com> escreveu:
>
> Prezado professor Antunes,
>
> interessante seu depoimento, gostaria mesmo de ter visto esse espetáculo,
> mas apenas esclarecendo um ponto do relato: Claudinho E Bochecha formavam
> uma dupla, o primeiro morreu em um acidente de carro em 1996, quanto ao
> outro não faço idéia do que anda fazendo.
>
> Abraços,
>
> Luciana
>
> p.s.: quanto ao Luar Trovado, assisti no domingo, não teve Tom Zé nem
> discurso nenhum do Gerald Thomas. Ufa.
>
> Em 12/06/07, Jorge Antunes <antunes em unb.br> escreveu:
> >
> > Caros Zé Luiz, Fernando e Carlos:
> >
> > Gostei muito da discussão sobre o tema do diálogo Pierrot & Funk.
> > Não vi e não gostei.
> > As opiniões de vocês, que assistiram, corroboram meu vaticínio.
> >
> > Gostaria de informar que apresentei, em 2005, nos CCBBs do Rio e de
> > Brasília, espetáculos que também colocavam no palco linguagens
> > tradicionalmente consideradas antagônicas.
> > Estou me referindo à série intitulada Speculum Brasilis.
> > Os espetáculos eram do tipo "non stop". Cada um deles mesclava música
> > eletroacústica (pré-gravada, sintetizador analógico e computador) com uma
> > manifestação musical popular. O primeiro espetáculo usava o chorinho com
> > bandolim (Hamilton de Holanda). No segundo tínhamos o grupo de bumba-meu-boi
> > do Seu Teodoro. O terceiro contava com a participação de um coro de câmara
> > cantando canções folclóricas. O quarto tinha a viola caipira (Roberto
> > Corrêa).
> > Cada um desses espetáculos usava a simultaneidade das linguagens.
> > Diálogos esporádicos, linguagens alternadas, também eram usados, mas com
> > breves durações. Assim, o que acontecia predominantemente era a fusão.
> > Em boa parte do tempo em que a tradição popular atuava, eu a processava
> > no computador em tempo real com o GRM-Tools no G4.
> >
> > A seguir relato o que mais interessa.
> > No Rio teríamos que apresentar um quinto espetáculo. Para este estava
> > prevista, no projeto, a participação do funk carioca com a Tati
> > Quebra-Barraco.
> > O meu produtor entrou em contato com ela, que o enviou ao seu empresário
> > (creio que este era seu próprio marido).
> > Não deu certo, porque o empresário era arrogante e exigia uma fortuna de
> > cachê.
> > Depois convidamos o Claudinho Bochecha. O empresário desse foi mais
> > cordial e interessado e o valor pedido como cachê era bem mais coerente e
> > acessível para nós. Quando ficou tudo acertado, o Bochecha me pediu um
> > "demo" da "tal" música eletroacústica.
> > A conversa acabou logo. Segundo o empresário, o Claudinho Bochecha não
> > gostou, ou ficou amedrontado.
> > Finalmente, fizemos o quinto espetáculo com uma dupla caipira.
> >
> > Devo salientar que todas as músicas, com exceção daquela do
> > bumba-meu-boi, eram de minha autoria. Tanto as eletroacústicas quanto as
> > "populares" : choros, canções, coco, embolada, cantoria etc.
> >
> > Modestia à parte, deu tudo muito certo, com resultado muito bom. O
> > público que assistiu era eclético e gostou. Dos nossos colegas membros da
> > Anppom que assistiram, lembro-me de apenas três nomes: Carlos Kater, Isabel
> > Montandom e Ricardo Tacuchian.
> >
> > Creio que o acerto foi conseqüência de dois fatores que não estiveram
> > presentes nessa experiência do Sesc Pinheiros, com o diálogo Schoenberg &
> > Funk:
> > 1- O predomínio da simultaneidade de linguagens, em lugar da
> > alternância;
> > 2- A utilização de obras do mesmo autor.
> >
> > Abraço,
> > Jorge Antunes
> >
> > PS. A seguir, para que se divirtam um pouco, reproduzo as redondilhas
> > que escrevi para os cantadores do quinto espetáculo.
> >
> > CANTORIAS de Jorge Antunes para o Speculum Brasilis
> > para serem cantadas por Chico de Assis e João Santana
> >
> > O dotô da Academia
> > sabe tudo de montão.
> > Ele faz até transplante
> > de rim e de coração.
> > Só não quero que ele cante:
> > vai tirá meu ganha-pão.
> >
> > Mas tem coisa que o dotô
> > não tem a menor noção.
> > É saber que quem conhece
> > é o cabôco do sertão,
> > que sabe de muita prece
> > pra curá todo cristão.
> >
> > Da cozinheria na roça
> > vou contar segredo dela:
> > pro arroz não se queimar
> > não ficar como a barrela
> > é uma cruz você riscar
> > bem no fundo da panela.
> >
> > Quando tem dois cantadô
> > nossa voz a gente dobra.
> > Na noite escura e sombria
> > o cuidado se redobra:
> > ai daquele que assobia
> > pois está chamando cobra.
> >
> > O dotô não sabe tudo,
> > acho que nem sabe rima.
> > Se a ferida de sarar
> > pó e banha não anima,
> > de manhã, ao levantar,
> > cospe três vezes em cima.
> >
> > O mestre do contraponto
> > sabe até fazê uma fuga.
> > Mas aponta uma estrela
> > que no infinito madruga,
> > pois não sabe que ao vê-la
> > vem no dedo uma verruga.
> >
> > O maestro que dá aula
> > lá na Universidade
> > sabe tudo de Chopén,
> > sabe de tonalidade,
> > dizem que sabe também
> > fazer música que agrade.
> >
> > O meu filho Joãozinho
> > e minha sobrinha Mônica
> > estudaram com um mestre
> > que tinha doença crônica:
> > só compunha Sinfonia
> > misturada em eletrônica.
> >
> > Muitas coisas eles ouvem
> > desde Bach até Beethoven.
> > Gravam sons que vêm do céu,
> > fazem musca com o mause,
> > ouvem Bruckner, Ravel,
> > até mesmo Stockrrause.
> >
> > Eles ligam as orelha
> > num sonzinho muito doido.
> > Fazem zumbidos de abelha
> > som de pato, som de cuco,
> > tocam o que dá na telha,
> > fazem um som bem maluco.
> >
> >
> > Nós aqui fora do campus
> > só fazemos som singelo.
> > Não entendo o que houve,
> > eu me espanto, eu me gelo:
> > o maestro que nos ouve
> > diz que nosso som é belo.
> >
> > Nosso canto é matuto
> > mas não chega ao fracasso.
> > Eu insisto e eu luto
> > pra mostrar tudo que faço,
> > e tô sempre muito puto
> > quando não encontro espaço.
> >
> > Também diz a mesma coisa
> > o maestro sabichão.
> > Só de ópera tem quatro
> > com muita bela canção,
> > não encontra um teatro
> > pra mostrar a produção.
> >
> > Muita obra tem o home,
> > sinfonias e quartetos.
> > Ele escreve em qualquer data
> > acordes muito bem feitos.
> > Ele tem até cantata,
> > muitos trios e duetos
> >
> > Com apoio dos ricaço
> > por aí tem muita droga.
> > O que é bom não tem espaço,
> > não tem grana, não tem folga.
> > (*tirando o chapéu*)
> > O chapéu que agora eu passo
> > vai todo pra óp'ra Olga.
> >
> > Se esse trabalho do mestre
> > tá um pouco esquecido,
> > ele tá que nem a gente,
> > sem apoio, bem fudido.
> > Se juntá a gente sente
> > vai ficar fortalecido.
> >
> > Música que tem ciência,
> > tem beleza, tem poema,
> > que tem alma, tem essência,
> > que tem som um tanto novo,
> > pode fundir sem problema
> > com o canto do meu povo.
> >
> > O saber da Academia
> > não pode estacionar.
> > Toda aquela teoria
> > ganha muito se juntar
> > a busca do dia-a-dia
> > com o saber popular.
> >
> > O cantar do erudito
> > tá perdido no mercado.
> > É que nem canto na feira
> > que em busca de um trocado
> > anda sem eira nem beira
> > e sai sempre machucado.
> >
> > Pega a voz do cantador
> > e transforma em alquimia.
> > Mete no computador
> > transformando a noite em dia.
> > É liquidificador
> > que enlouquece a melodia.
> >
> > Eletrônica e canto
> > vão juntando energia.
> > Ri o jovem, chora a dona,
> > ri o home, chora a moça.
> > É fusão que emociona,
> > é união que faz a força.
> >
> >
> >
> > José Luiz Martinez wrote:
> >
> > Caros colegas,
> >
> > Eu e o Fernando Iazzetta assistimos o espetáculo "Luar Trovado", baseado
> > em
> > "Pierrot Lunaire" de Schoenberg, sábado passado. O espetáculo aconteceu
> > no
> > teatro do Sesc Pinheiros, em São Paulo. A direção cênica é assinada por
> > Gerald Thomas e a direção musical é de Lívio Tratenberg.
> >
> > Embora eu e o Fernando não tenhamos nos encontrado no teatro,
> > concordamos
> > sobre o resultado. Repasso agora para as listas onde foi realizada
> > (alguns
> > dias antes do espetáculo) uma proveitosa discussão sobre Pierrot, Deise
> > Tigrona, bizarrices, etc. as mensagens trocadas hoje entre eu, o
> > Fernando e
> > mais alguns colegas.
> >
> > Confesso que toda a nossa discussão na lista da Anppom e na Musikeion
> > foi me
> > instigando. Eu estava curioso para ver o "Luar Trovado". Afinal, o
> > espetáculo portava boas promessas como a obra de Schoenberg com tradução
> > de
> > Augusto de Campos e diversos convidados que no mínimo garantiriam algo
> > de
> > bizarro. A partitura de "Pierrot Lunaire" foi executada corretamente.
> > Mas,
> > infelizmente, o espetáculo foi decepcionante. Valeu apenas pela
> > iniciativa.
> > Que outras experiências venham à luz e que o Sesc possa continuar
> > bancando
> > algo fundamental em ópera contemporânea. Criar e colocar em cena para
> > que o
> > público veja e julgue.
> >
> > Gostaria de advertir que concordamos em não omitir ou utilizar quaisquer
> >
> > eufemismos para os títulos dos funks cantados pela Deise Tigrona. Assim,
> >
> > aqueles que possivelmente se ofenderiam com palavras de baixo calão, por
> >
> > favor, desconsiderem essa mensagem e não leiam o que segue.
> >
> > Cordialmente,
> > Martinez
> >
> > --
> > Prof. Dr. José Luiz Martinez
> > Departamento de Linguagens do Corpo
> > Faculdade de Comunicação e Filosofia - PUC-SP
> >
> > Rede Interdisciplinar de Semiótica da Música
> > http://www.pucsp.br/pos/cos/rism
> >
> > Musikeion - fórum sobre signficação musical
> > http://listas.pucsp.br/mailman/listinfo/musikeion
> > http://listas.pucsp.br/pipermail/musikeion/
> >
> > **********************************************************************
> >
> > Caro Fernando,
> >
> > Eu também estava lá no sábado, pena que a gente não se encontrou na
> > saída
> > para bebericar uma crítica ferina ao espetáculo, chamado de ópera. Eu
> > pretendia escrever alguma coisa na lista da Anppom e na Musikeion.
> > Afinal,
> > depois de tanta conversa, nossos colegas devem estar curiosos. Você
> > permitiria que eu citasse sua mensagem e postasse na lista da Anppom?
> > Será
> > que teremos que usar eufemismos para o funk "a porra da boceta é minha"?
> >
> >
> > Eu concordo com tudo o que você disse. E acrescentaria o desnível entre
> > as
> > composições do Lívio Tratenberg e as peças do "Pierrot" de Schoenberg. É
> > uma
> > responsabiliade muito grande você compor peças para serem executadas ao
> > lado
> > de um clássico do séc. XX. Na minha opinião, as do Lívio eram todas
> > muito
> > fracas, inclusive as eletroacústicas. Outra coisa difícil de aguentar
> > eram
> > as "interações" entre a Lucila Tratenberg e a Adélia Issa. A coisa foi
> > colocada como um conflito entre as duas cantoras, inclusive resvalando
> > sobre
> > uma politicamente incorreta briga entre a gorda e a magra
> > (respectivamente
> > Adélia e Lucila). Musicalmente era fraquíssimo. Num ponto da cena
> > entrava um
> > clarone e uma tuba, mas os dois músicos passavam sem nenhuma interação
> > cênica com as duas. Se é para fazer uma cena grotesca e politicamente
> > incorreta, que se faça direito!
> >
> > O diálogo ficou mesmo entre a Deise e os músicos fazendo o "Pierrot". O
> > público aplaudia fortemente a funqueira. Poderia ter sido construído por
> > aí.
> > Mas era uma simples alternância. Os músicos e a Adélia ficavam no escuro
> > e
> > entrava a Deise. A Deise saia e voltavam os músicos. Seria melhor do que
> >
> > toda a cenografia obvia e efeitos desperdiçados. Até uma encenação de
> > algumas das canções de Schoenberg teria sido melhor. "Lavadeira Lívida",
> > por
> > exemplo, poderia ter uma cena correspondente com a bailarina. Qualquer
> > coisa
> > seria melhor do que aquele casal de atores fazendo piquenique na lua, ou
> > um
> > fotógrafo que entrava em cena disparando o flash, personagens
> > completamente
> > inexpressivos e dispensáveis. Ainda que óbvio por outro lado, eu
> > preferiria
> > que o cenário fosse uma favela. Seria mais instigante do que o pastiche
> > lunar.
> >
> > Acho que a Elke Maravilha (dublando horrivelmente sua voz gravada, num
> > texto
> > fraco e mal interpretado) representa bem a idéia central da direção
> > cênica
> > de colocar alguns ícones da mídia, mais pelo nome do que pela atuação,
> > para
> > compor algo muito bizarro, mas que no fim implodiu pela inconsistência
> > musical e cênica.
> >
> > Para mim a amplificação da voz da Adélia tinha um problema técnico. Não
> > sei
> > se você (Fernando) concorda. Mas estava tudo bem enquanto ela cantava em
> > pp
> > ou mf, mas quando ela ia para o f e ff a amplificação fazia a voz da
> > Adélia
> > ficar insuportavelmente forte, encobrindo completamente os instrumentos.
> >
> > Faltou aí um compressor?
> >
> > A história do Tom Zé era o que faltava para acabar com toda a "ópera".
> > Talvez o G. Thomas tenha percebido ao final que nada daquilo parava de
> > pé e
> > resolveu transformar tudo em programa de auditório. Ao menos disfarçou a
> >
> > reação da platéia...
> >
> > Abraços,
> > Martinez
> >
> > On 10/06/2007 02:50, "Fernando Iazzetta" <iazzetta em usp.br> wrote:
> >
> > > Meus caros,
> > >
> > > Foi alarme falso. Me dei ao trabalho de ir conferir o pierrot com
> > funk. A
> > > deise tigrona funkeou com "a buceta é minha, eu dou pra quem eu
> > quiser", a
> > > Elke maravilha fez um "dueto" com a lucilia tragtemberg e a adelia
> > issa
> > > cantou direitinho umas partes do pierrot schoenberguiano. Tudo normal.
> >
> > > Fizeram boa música até.
> > >
> > > O bizarro ficou mesmo por conta do Gerald Thomas e põe bizarro nisso.
> > O
> > > espetáculo é horroroso, dos cenários à direção de cena, parecia
> > trabalho de
> > > estudantes de artes cênicas que ainda não entenderam como se juntam
> > idéias e
> > > realização.
> > >
> > > Para completar no finalzinho da encenação o G Thomas entrou no palco e
> > falou
> > > que no Brasil tem um cara mais fantástico e radical que Schoenberg, e
> > chamou
> > > o Tom Zé que levantou da primeira fila da platéia e fez um discurso
> > > gaguejado em que misturou assuntos como "o cromatismo de Mahler"  com
> > a
> > > buceta da tigrona e por aí vai... De repente chamaram o Danilo Miranda
> >
> > > (manda-chuva do SESC), depois o cara que fez a cenografia, depois a
> > deise
> > > tigrona com a Elke, todo mundo se cumprimentou palco (tudo bem, os
> > músicos
> > > ficaram num canto sem saber o que fazer). Quando a coisa começou a
> > sair de
> > > controle o G Thomas pediu para baixar a cortina, e... acabou!
> > >
> > > Tão bizarro que muita gente não sabia se era pra bater palma ou se a
> > "coisa"
> > > ia recomeçar depois de um intervalo.
> > >
> > >
> > > Abraços, fernando
> > >
> > >
> >
> > ________________________________________________
> > Lista de discussões ANPPOM
> > http://iar.unicamp.br/mailman/listinfo/anppom-l
> > ________________________________________________
> >
> >
> > ________________________________________________
> > Lista de discussões ANPPOM
> > http://iar.unicamp.br/mailman/listinfo/anppom-l
> > ________________________________________________
> >
> >
>
-------------- Próxima Parte ----------
Um anexo em HTML foi limpo...
URL: <http://www.listas.unicamp.br/pipermail/anppom-l/attachments/20070612/d63b51d7/attachment.html>


Mais detalhes sobre a lista de discussão Anppom-L