[ANPPOM-L] novo humanismo

carlos palombini palombini em terra.com.br
Qua Out 10 10:38:14 BRT 2007


No que diz respeito à música, não acho que se trate de "abandono 
gradativo [...] do espírito humanista". Este espírito, não me parece que 
ele tenha caracterizado o Conservatório de Música no qual estudaram 
minha minha avó e minha bisavó, e que transformou-se, hoje, na 
pós-graduação brasileira que desfruta da melhor nota na avaliação da 
CAPES.  A não ser que os caminhos da pós-graduação brasileira em música 
sejam descaminhos, é provável que a música esteja descobrindo seu 
humanismo no Brasil.

A palestra de Olgária Mattos, na abertura da Anppom este ano, foi sem 
dúvida uma obra-prima de oratória. Não me parece, contudo, que um  "novo 
humanismo" seja a solução para o problema da Universidade brasileira. 
Esqueçamos a meta, e pensemos na viagem, como propôs Olgária Mattos, 
citando Cavafys, em conclusão à sua palestra. É uma excelente proposta 
para um professor assalariado de uma instituição pública com 
aposentadoria ainda integral. Aplicada à gestão do patrimônio público, 
trata-se de um ato de irresponsabilidade coletiva.  Será que não existe 
nada além do dilema entre um humanismo requentado e tacitamente 
exclusivista e a submissão às regras do mercado? Não podemos fazer 
voltar o relógio à Renascença e descobrir de novo o Brasil, colonizá-lo 
"humanisticamente". O que somos, em ampla medida, é o reverso da medalha 
do humanismo da Europa renascentista. Do mesmo modo, um filme como 
_Tropa de elite_, onde um bando de assassinos (reais!) é apresentado 
como uma elite de ética  quase impecável, é a contrapartida necessária 
deste "novo humanismo" com o qual se pretende gerir o patrimônio público 
brasileiro.

Carlos Palombini

> Acho que os professores clamam (independente das categorias que arrolam) é
> pelo abandono gradativo que a universidade sofreu do espírito humanista, que
> eliminou a sensibilidade humana em detrimento de um discurso que entendia a
> formação apenas e tão-somente pela absorção do dado "objetivo" e "positivo"
> que mecanizava, como num passe de mágica, a competência. 
>
> Como diz o prof. Antunes, reavivar esse espírito é a tarefa que vai garantir
> o próprio espaço liberal que deve nortear a arte, a ciência e, nessa
> congruência, a arte na universidade. O reaquecimento para a compreensão da
> complexidade pelos índices valorativos da consciência humana do mundo e não
> apenas pelo umbigo da especialidade - Rousseau entendia isso como único
> antídoto capaz de superar a opressão histórica social inerente da sociedade
> de interesses - é sine qua non para poderemos perseguir a sofisticação do
> discurso artístico e sua relação com o desenvolvimento humano e, mais que
> isso, dos seres viventes. Senão, comprometeremos pelo preconceito, como
> vemos vez e outra explícito nos nossos congressos, a tolerância que garante
> a pluralidade que observa a vida sistematizando-a desde a legitimação das
> diversas manifestações culturais até o zelo pelo desenvolvimento tecnológico
> e suas práticas interpretativas. É tudo um mesmo complexo que se forma no e
> pelo homem...
>
> A questão é como fazê-lo em um ambiente de conspurcação moral, política e
> social, causa e efeito do abandono sistemático da educação e a
> mercantilização do ensino, até mesmo nas universidades públicas. 
>
> Vejo algum lampejo de resposta no surgimento dos cursos técnicos
> profissionalizantes, secundários, na área de artes. O modelo já existe,
> desde a década de 1970, nas áreas técnicas da engenharia. Apesar dos muitos
> problemas sociais que causou o modelo desenvolvimentista militar (e por ser
> imposto a sangue e opressão já era por si só repugnante), não há como negar
> que os benefícios na área técnica foram notórios e mais, arrisco a dizer que
> foi o que consubstanciou o salto para a consolidação dos parques industriais
> no Brasil, partindo de uma realidade agrícola até então imarcescível. 
> Saudação a todos,
> Diósnio Machado Neto
>   

-- 
carlos palombini
professor adjunto de musicologia
universidade federal de minas gerais
<cpalombini em gmail.com>

"... et la variété des choses est en réalité ce qui me construit." (Francis Ponge, "My Creative Method", 27 de dezembro de 1947)




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