[ANPPOM-L] RES: o DJ e o compositor (era que música queremos?) [longa]

jamannis uol jamannis em uol.com.br
Dom Out 21 13:45:59 BRST 2007


Acredito que o Rodolfo tocou num aspecto muito importante da questão:

- CONSEGUIR QUE OS ALUNOS FAÇAM ALGUMA COISA POR SI QUE FUNCIONE BEM PARA
ELES E QUE SEJA ADEQUADO PARA (pelo menos uma parte d)OS DEMAIS. -

Contraponto / solfejo dos objetos / educação da escuta, são alguns dos
utensílios didáticos dos quais dispomos.

Pessoalmente uso todos sem colocar nenhum acima de outro (em disciplinas
diferentes - contraponto e fuga / composição musical) e à vezes misturo
quando a oportunidade surge.

Isso porque cada aluno é uma pedra diferente e única neste universo. E cada
uma delas deve ser talhada de um modo diferente, pois cada uma tem suas
particularidades e uma vocação para sua forma futura. Acho que afirmar que
só há um modo certo de fazer isso é tão errado quanto, por exemplo,
padronizar e automatizar o atendimento médico em rotinas pré-estabelecidas
impostas. Seria talhar todas as pedras de forma idêntica. Se isso funciona
na construção civil (pois garante maior controle da estabilidade e
distribuição de forças), na edificação da humanidade seria praticamente um
crime.

Acompanhei alunos que se encontraram e enxergaram o caminho quando
aprenderam bem o contraponto. Outros quando descobriram o infinito universo
que se abre através do domínio da escuta. Outros ao analisar uma música
(mesmo polifônica que seja) através da tipo-morfologia (e não do
contraponto). Depois desse insight, observo que eles começam a andar por si.
Cada pessoa tem seu código, suas particularidades e cada um vai descobrir
seu caminho de um jeito diferente. Cabe ao PROFESSOR se antenar, se abrir,
captar o que está acontecendo com o aluno e dirigi-lo ora para um lado, ora
para outro, observar, analisar e deixá-lo ir na direção na qual ele
encontrará as respostas às suas perguntas. Com o devido cuidado de NÂO DAR
AS RESPOSTAS PRONTAS sem que o aluno se dirija VOLUNTARIAMENTE A ELAS. O
aluno somente as entenderá plenamente QUANDO DE FATO ESTIVER PREPARADO E
PRONTO PARA SABER OUVI-LAS.

Portanto defendo uma pratica AMPLA E ABRANGENTE na formação musical.
Infelizmente as grades curriculares na instituição do ensino acabam se
tornando guilhotinas. Mas sempre agradeço pelo fato de que temos colegas nas
instituições que compreendem isso e facilitam a flexibilização na medida do
possível.

Melhores saudações

José Augusto Mannis











-----Mensagem original-----
De: anppom-l-bounces em iar.unicamp.br [mailto:anppom-l-bounces em iar.unicamp.br]
Em nome de Rodolfo Caesar
Enviada em: domingo, 21 de outubro de 2007 08:37
Para: Alexandre Bräutigam
Cc: anppom-l em iar.unicamp.br
Assunto: Re: [ANPPOM-L] o DJ e o compositor (era que música queremos?)
[longa]

...
 
Nesses treze anos da disciplina, noto que uma das coisas mais difíceis é 
evitar que os alunos saiam fazendo a écoute réduite de tudo sem quererem 
descobrir que, no 'fundo', não há redução possível, até porque não 
existe fundo. Não dá pé.

...

Rodolfo



Alexandre Bräutigam wrote:
> Caro Palombini e membros da lista,
>
> Então me parece que na verdade a semântica separa duas classes que, na 
> prática, estariam em alguns momentos, amalgamadas. Ainda mais quando o 
> DJ, além de escolher e ordenar as sequências das músicas ao vivo, 
> também produz as próprias. É o caso do Tiesto e do Infected Mushroom 
> (o primeiro sem formação musical tradicional, diferente da dupla que 
> compõe o IM).
> Na introdução de 'Converting Vegetarians' (IM) seria incipiente o uso 
> apenas de uma análise baseada nos conhecimentos adquiridos em aulas 
> formais de harmonia tonal ou contraponto (seja ele florido ou não). 
> Muito mais útil seria a tipomorfologia schaefferiana - não como um 
> sistema pronto e acabado, mas como algo que apresenta ferramentas mais 
> adequadas para tal.
> Apesar disso, muitos alunos de composição dos cursos de graduação de 
> nossas universidades saem dele sem ao menos saber quem foi Pierre 
> Schaeffer. Falo isso por experiência própria, conversando com colegas 
> de mestrado em música. Na UFRJ os cursos que apontam para esse lado 
> são matérias eletivas e portanto nem todos os alunos recebem este 
> conhecimento. Se formam especialistas em harmonia e contraponto, mas 
> desconhecem o Traité de Schaeffer. É isso que queremos para as 
> faculdades de música?
>
> um abraço a todos,
>
> Alexandre Bräutigam.
>
>
>
> > Date: Thu, 18 Oct 2007 15:58:50 -0300
> > From: palombini em terra.com.br
> > To: anppom-l em iar.unicamp.br
> > Subject: [ANPPOM-L] o DJ e o compositor (era que música queremos?) 
> [longa]
> >
> >
> >
> > Alexandre Bräutigam escreveu:
> > > Estendendo a discussão sobre o compositor, seu papel, seus meios de
> > > produção e registro assim como a delicada discussão dos direitos
> > > autorais (tudo o que envolve dinheiro, no mundo dos Homens, é
> > > complicado), qual a opinião dos professores a respeito dos remixes e
> > > dos DJs como compositores? Cito um exemplo : o DJ Tiësto (holandês) e
> > > sua música 'Adagio for strings'.
> > Minha opinião --- e já que vc só quer ouvir os professores, vou ser bem
> > professoral --- é que... "DJ" e "compositor" são termos que refletem as
> > práticas, os usos e costumes de grupos bem distintos. Pode-se 
> apresentar
> > o DJ como compositor ou o compositor como DJ a fim de esclarecer a
> > questão eterna das origens (uma obsessão minha). Meu exemplo preferido:
> > o processo de criação de "Étude pathétique" de Schaeffer (de modo algum
> > um compositor no sentido que se tem usado este termo aqui, i.e. aquele
> > rapaz ou aquela moça que sabe tudo o que um teórico austríaco do século
> > XVII escreveu em latim num livro publicado em 1725) como descrito pelo
> > próprio (por favor, se forem publicar o que se segue, digam que a idéia
> > é minha) o apresenta fazendo exatamente o que um DJ moderno faz. Ele
> > dispõe de 4 pratos (como se chamava no meu tempo a superfície giratória
> > daquilo que se denomina hoje pickup) sobre os quais vai colocando, como
> > ele mesmo diz, o que lhe cai nas mãos: uma barca dos canais de França,
> > sacerdotes de Bali, uma harmônica ou acordeon norte-americano, um disco
> > com a tosse de uma radialista interrompendo uma gravação de Sacha
> > Guitry. Depois, como ele mesmo diz, "exercício de virtuosidade nos
> > quatro potenciômetros e nas oito chaves de ignição". Este estudo nasce
> > em poucos minutos: o tempo de gravá-lo, o próprio Schaeffer afirma. As
> > diferenças entre o que Schaeffer e Garnier fazem seriam tão
> > esclarecedoras quanto as analogias, embora não seja apropriado
> > discuti-las aqui. Isto quer dizer que Schaeffer foi o primeiro DJ
> > moderno, em 1948? Não exatamente. A figura do DJ-produtor se 
> constrói em
> > várias etapas. A melhor fonte a este respeito é _Last Night a DJ Saved
> > My Life: The History of the Disc Jockey_, de Bill Brewester e Frank
> > Broughton (New York: Grove Press, 2000); o que se segue é mais uma
> > interpretação.
> >
> > A primeira destas etapas, acredito, é o surgimento de uma cena onde 
> seus
> > serviços sejam requeridos. Os swing kids da alemanha nazista raramente
> > fizeram mais do que discotecar e dançar swing norte-americano.O funk
> > carioca existiu por quase duas décadas como "mundo funk carioca" 
> (título
> > do livro de Vianna, que o escreveu no momento em que a cena estava para
> > gerar a música), alimentado por James Brown, soul da Filadélfia e Miami
> > Bass antes de passar a existir como música, em 1989 (i.e. um ano após a
> > publicação do livro de Vianna). O hip-hop existiu como cena desde a
> > primeira metade dos anos 70, quando o DJ jamaicano Kool Herc se mudou
> > para o Bronx (na Jamaica, o que chamamos de DJ chamava-se selector e o
> > que chamamos de MC chamava-se DJ, mas Herc era DJ no sentido nosso, ou
> > quase), alimentado por rock, disco e funk (submetidos a processos de
> > discotecagem forjados pelos DJs pioneiros da cena disco de Manhattan e,
> > depois, pelo scratch, inventado no próprio Bronx) antes da explosão de
> > "Rapper's Delight", do Sugar Hill Gang (aquela música que utilizou a
> > base de "Good Times" do Chic, que também foi usada por um grupo de rock
> > e Gabriel o Pensador no célebre "2345meia78"). A disco foi uma cena de
> > festas e clubes (sobretudo gays negros e latinos) de Manhattan,
> > alimentada de rock, soul, experimentalismo e pop desde o final dos anos
> > 60 antes de gerar a música disco, por uma mutação do soul, no final da
> > primeira metade dos anos 70. É na cena disco que surge a figura do
> > DJ-produtor, com Walter Gibbons, Tom Moulton, François Kevorkian etc. O
> > veículo principal da arte do DJ-produtor é o single de 12 polegadas (ou
> > 305mm, na versão nacionalista), descoberto por Moulton por um acaso,
> > quando foi prensar uma mixagem sua e descobriu que não havia material
> > para o single de 7 polegadas (que no meu tempo chamava-se compacto
> > simples). Quando Moulton recebeu o LP com uma faixazinha na borda, deu
> > uma gargalhada e julgou que o comprador se consideraria ludibriado. A
> > faixa foi espalhada pela superfície inteira do disco e descobriu-se que
> > o volume de um disco destes era muito mais alto. (Estes discos podiam
> > ser de vinil ou acetato.)
> >
> > A questão da autoria não é problema na cena dançante. Os grupos que
> > produzem esta música não tem cara. Um autor pode ter várias caras,
> > simples ou múltiplas (i. é, sozinho ou em parcerias) às quais vai 
> chamar
> > projetos, e estes projetos, por sua vez, podem jamais revelar, a não 
> ser
> > em texturas sonoras (o próprio invólucro do single e às vezes até seu
> > selo não sendo mais do que uma superfície branca), a persona corpórea
> > do "autor". A música eletrônica dançante é, praticamente, uma música 
> sem
> > cara. Por isso é tão difícil orientar-se no labirinto das tendências.
> > Para o "compositor" isto não seria importante, porque tudo estaria na
> > música. Mas quem tenha estudado um pouco as implicações estésicas das
> > tecnologias sabe que não é exatamente assim: "escuta reduzida",
> > "situação acusmática", "pseudo-instrumento", "objeto sonoro" de
> > Schaeffer; "perda da aura", "declínio do valor de culto", "aumento do
> > valor de exibição" de Benjamin; "fetichismo na música", "regressão da
> > audição" de Adorno; "Im-posição" de Heidegger...
> >
> > Quanto ao Tiesto, dizem que é o "maior DJ do mundo". Tanto quanto posso
> > julgar pelo vídeo, prefiro o baile de sábado do Clube Boqueirão de
> > Regatas, no aterro do Flamengo (entre o MAM e o aeroporto): a 
> acústica é
> > horrível, não há luzes nem ar condicionado e pode haver pancadaria (de
> > cunho recreativo, nada que a segurança do baile não domine), mas o
> > público não fica todo virado e embasbacado, levantando os braços para
> > "o maior DJ do mundo".
> >
> > Carlos
> >
> > --
> > carlos palombini (dr p)
> > professor adjunto de musicologia
> > universidade federal de minas gerais
> > <cpalombini em gmail.com>
> >
> > "Ed anco pare riconosciuto generalmente che ai giovani appartenga 
> una specie di diritto di volere il mondo occupato nei pensieri loro." 
> (Giacomo Leopardi, Pensieri XL, 1845)
> >
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