[ANPPOM-L] STF e OMB

SBME . sbme em sbme.com.br
Sáb Ago 13 10:08:44 BRT 2011


Caro Prof. Rogerio Budasz:

Obrigado por sua mensagem e por suas lúcidas considerações.
Em primeiro lugar gostaria de dizer que estou feliz por ter dado margem a
que a lista de discussão da Anppom passasse a ser realmente uma lista de
discussão de temas interessantes, abrindo espaço para várias manifestações,
inclusive de colegas que nunca haviam, antes, escrito para a lista.
Existe uma grande confusão com relação à OBM. Muitos a confundem com um
Sindicato que deve apenas lutar pelos direitos dos profissionais, dando-lhes
permanentes benefícios.
A OMB, autarquia federal da administração indireta, foi criada com o
objetivo de fiscalizar o exercício da profissão.
Todos os que têm curso superior em música são automaticamente reconhecidos
pela OMB, recebendo a carteira profissional, que tem fé pública.
O fato é que assim como fazemos diferença entre o Socialismo Utópico e o
Socialismo Real, poderíamos também falar de duas OMBs: a OMB utópica, que
está no papel, na letra da lei; e a OMB Real, escrota, canalha, repressora,
injusta, que sempre esteve por aí.
Do jeito que as coisas vão, não mais será usada a expressão "exercício
ilegal da profissão de músico", pois que, segundo a Ministra Ellen e muitas
outras pessoas, principalmente músicos, ao invés de se consertar a OMB,
deve-se extingui-la.
Existiram gestões da OMB, em algumas regiões (Conselhos Regionais), que já
foram exemplares, aproximando-se do ideal: fiscalizando o exercício da
profissão, intermediando entre músico e patrão defendendo direitos do
músico, e até mesmo fornecendo seguro social e construindo retiros e
conjuntos residenciais para seus filiados. Mas são casos esporádicos que
ficaram esquecidos no tempo. As novas gerações não têm notícias desses
momentos áureos da história da OMB.
É claro que a OMB que aí está não serve a ninguém.
O problema é que quem faz a OMB andar são os seus Conselhos e suas
Diretorias, eleitas pelos associados. Faça um levantamento, e veja quais
músicos integram essas diretorias. Pergunte aos colegas quem se disporia a
se candidatar e integrar uma chapa para, sendo eleito, dar à OMB os rumos
desejados.
O que defendo não tem nada a ver com jdanovismo, stalinismo, dirigismo
estético. Tem a ver somente com competência artística, competência
técnico-musical, ou seja, com tudo aquilo que lutamos construir em nosso
trabalho nas Universidades.
A campanha em curso se afina com a onda do neoliberalismo, e com a entrega
de tudo ao mercado. Ao mesmo povo que não tem acesso à educação de
qualidade, pretende-se entregar a fiscalização das competências. A mídia em
geral, a Rede Globo em particular, ficam encarregadas de ensinar ao povo
aquilo de que se deve gostar, para que em seguida o mesmo povo passe a
comprar, consumir, aquilo de que aprenderam a gostar.
O caminho parece apontar para aquela situação em que qualquer tocador de
instrumento será um profissional a ser engajado pelo patrão explorador, como
mão de obra barata.
Essa situação fortalecerá a tese daqueles que querem acabar com a Música e
as Artes na Universidade. Uma profissão que não precisa de regulamentação,
cujo exercício não precisa de fiscalização, que não precisa de longos
aprendizados, que seja entendida como apenas um direito à livre expressão,
cuja prática seja caracterizada como atividade que não tem como oferecer
riscos à sociedade, evidentemente não precisa ser ensinada em Universidades.
Abraço,
Jorge Antunes






Em 13 de agosto de 2011 09:17, Rogerio Budasz <rogeriobudasz em yahoo.com>escreveu:

> Prezado Maestro Jorge Antunes,
>
> Devo lembrar primeiramente que minha posição quanto à OMB sempre foi a de
> que quem quiser se filiar, filie-se e usufrua os benefiícios oriundos dessa
> filiação, se é que existe algum, mas que não se exija que intérpretes,
> regentes, compositores, educadores musicais, musicólogos, semioticistas
> musicais, engenheiros de som, copistas, etc. etc. façam o mesmo.
> Entendo que o ponto principal de sua colocação concerne a afirnação  da
> ministra Ellen Gracie de que o exercício desregulamentado da profissão de
> músico não representa um "risco social". Noto que as suas mensagens
> anteriores referem-se a intérpretes e, talvez, técnicos de som. Entretanto,
> seus argumentos a respeito da interpretação "errada" de certas obras seriam
> fatalmente usados em outras esferas da prática musical, afinal compositores
> também são profissionais da música e seriam julgados pelo mesmo crivo.
> Curiosamente, a história nos tem mostrado que são sempre os regimes
> totalitários e as elites econômicas os maiores preocupados com o risco
> social que a música pode causar, porque para eles, de fato, certas músicas
> representam risco. Temo que, se delegarmos à OMB ou a qualquer juiz
> decidir se a música que compomos e que interpretamos representa um risco
> social, aí voltaríamos ao Zhdanovismo ou, pior ainda, aos tempos do
> Reichsmusikkammer. Se por correto exercício da profissão de músico devemos
> entender apenas à interpretação e difusão da música, então a OMB que aí está
> não serve a ninguém.
>
> abraços
> Rogério Budasz
>
>
>
> --- On *Thu, 8/11/11, SBME . <sbme em sbme.com.br>* wrote:
>
>
> From: SBME . <sbme em sbme.com.br>
> Subject: Re: [ANPPOM-L] STF e OMB
> To: "ANPPOM" <anppom-l em iar.unicamp.br>
> Date: Thursday, August 11, 2011, 2:44 PM
>
>
> Olá, colegas:
>
> Inicialmente gostaria de agradecer ao maestro Mário Marçal Jr, pela honra
> que me deu ao se debruçar em minhas reflexões, para emitir suas opiniões
> sobre o tema que levantei. O exímio violinista, líder do grupo SC Trio,
> expõe suas ideias de modo claro.
> Entretanto acho oportuno relembrar que não fiz e nem faço, por enquanto,
> qualquer análise ou emissão de opinião, sobre a decisão do STF com relação à
> Ordem dos Músicos quanto à não obrigatoriedade de filiação dos músicos à
> entidade.
> Recordo que o único tema que coloco na berlinda é a afirmação de Ministros,
> segundo a qual "a prática musical nunca representa risco social".
> Meu primeiro ímpeto é o de dizer que se alguma atividade pública mal
> realizada não representa risco social, então a mesma atividade quando bem
> realizada não implicará em qualquer bem social.
> Se isso for verdade, poderíamos concluir que a prática musical "não cheira,
> nem fede". No limite chegaríamos à conclusão de que ela de nada serve e que
> o mundo poderia muito bem viver sem Música. Em não existindo música, ninguém
> morreria.
> Mas, morrer é o mal maior?
> Talvez alguns saibam que eu sou autor de algumas composições musicais. Eu,
> pessoalmente, preciso que os músicos, ao tocarem alguma de minhas peças –o
> que às vezes acontece–, toquem exatamente as notas, os ritmos, que coloquei
> na partitura. Claro, isso quando escrevo notas e ritmos determinados.
> Talvez falte-me modéstia, talvez eu seja pretensioso, mas eu preciso que
> seja assim, porque acredito que o que escrevi na partitura determinará um
> bem social se for concretizado acusticamente, fielmente como escrevi.
>
> Existem inúmeros exemplos de casos em que a música determina risco social.
> Para não me alongar mostrarei apenas um.
> Há anos, talvez década, o Prof. Manoel Veiga, da UFBA, relatou uma de suas
> experiências como membro do Conselho de Cultura da Bahia, ou de Salvador
> (não me lembro de qual Conselho exatamente).
> Chegara-lhe às mãos um estudo científico em forma de pesquisa
> médico-acústica que, ao final, demonstrava o seguinte: a juventude que
> acompanha os trios elétricos nas ruas de Salvador, já perdeu 15% de sua
> capacidade auditiva, em razão da alta intensidade sonora (com mais de 110
> dB) em um raio de muitos metros.
> O então Conselheiro Manoel Veiga levou a denúncia às autoridades através do
> Conselho. O resultado foi o abafamento do relato e a ordem de não divulgação
> da pesquisa, porque o governo local alertou: "a divulgação da pesquisa
> implicaria em sério prejuizo para o turismo na Bahia".
> Evidentemente esse problema não tem nada com a Ordem dos Músicos.
> Evidentemeente não é se filiando à OMB que os 110 dB diminuirão. Reitero que
> coloco na berlinda apenas a afirmação dos Juizes da Alta Corte segundo a
> qual *"a música nunca oferece risco social"*.
> Abraços,
> Jorge Antunes
>
>
>
>
> Em 11 de agosto de 2011 14:59, mariomarcaljr <mariomarcaljr em gmail.com<http://mc/compose?to=mariomarcaljr@gmail.com>
> > escreveu:
>
> Olá Jorge Antunes e caros colegas!
>
> Acredito que a discussão seja sempre saudável, por isso darei minha opinião
> aqui.
>
> Acredito que tanto o veredicto quanto os argumentos estejam corretos, além
> de muito bem baseados na nossa constituição e nossas leis.
>
> Quanto ao que o Sr. jorge Antunes argumentou discordo, entendo, mas na
> minha opinião se justifica.
>
> Não acredito que alguém ou algum grupo tocando mal, ou "desafinado" possa
> causar um mal a sociedade. Se seguirmos essa linha iremos discutir
> infinitamente o que é arte, o que é afinação, o que o certo e errado. Isso
> em arte é um tanto limitador, tanto é que se seguíssemos as regras,
> estaríamos ainda impedidos de tocar trítonos.
>
> O que é afinado ou não, mal ou bom, certo e errado deve ser decidido por
> quem ouve, e não por um grupo de pessoas que detém um documento que diz que
> eles são o que são ou fazem o que fazem.
>
> Uma má interpretação não mata, no máximo vai fazer com que o publico se
> retire do recinto e nunca mais volte a assistir esse interprete, o que é
> problema do intérprete.
>
> Não estou dizendo que enquanto profissionais não devamos buscar nos
> informar sobre o "como era ou é interpretada" a música de determinada época
> ou compositor. Mas essa preocupação deve se restringir a "escolas" e não a
> apresentação pública de determinada arte em sí, caso contrário estaríamos
> também limitando os variados tipos de  interpretações e isso seria como
> proibir uma obra de Shakespeare de ser traduzida ou o que é pior, só
> permitido o uso do inglês da época para interpretar.
>
> Além disso acredito que o público tem todo o direito de poder escolher o
> que é melhor ou pior. E mesmo o pior pode vir a ser o melhor (de novo a
> história nos mostra quantos compositores morreram na pobreza porque a
> critica e/ou público achou que a sua música não prestava).
>
> O "conhecimento técnico" pode ser necessário, mas não da forma como colocou
> o Sr. Jorge Antunes. Caso contrário não precisaríamos nem sequer existir
> como musicos, hoje um computador faria nosso trabalho com muito mais
> exatidão. O intérprete valeria como uma mera ferramenta entre o compositor e
> o público, e o mesmo perderia sua característica como artista e seria
> somente mais um operário, o que não acredito que seja verdade.
>
> O que noto é uma mistura de argumentos, e cada um tenta puxar a brasa para
> o seu assado.
>
> Não defendo a extinção de uma ordem dos musicos, mas sim a obrigatoriedade
> de se associar a uma. A ordem deve existir para defender a quem dela
> participa e não a limitar quem esta fora dela.
>
> Outro dia li um texto de um colega preocupado em perder emprego porque sem
> a ordem, qualquer poderia ser musico. Achei tanto a preocupação quanto o
> argumento ridículos (me desculpem a sinceridade). Se um médico ou advogado
> quer também tocar um instrumento não vejo motivos para não o fazer. Tenho
> colegas os quais sua principal ocupação não é ser musico, e mesmo assim são
> extremamente profissionais e talentosos.
>
> Fico imaginando o pior cenário se realmente fosse proibida a execução de
> música por quem não esta associado a uma ordem. A música ao vivo seria como
> uma droga, estaria sendo consumida nos cantos obscuros da sociedade... Ela
> seria comercializada no mercado negro da música ao vivo... Jovens seriam
> presos por estarem usando um violão numa rola de amigos... Existiria a
> GESTAPO da ordem dos musicos e fariam papel de aniquilar quem não se
> associasse ao nazismo musical. (essa piadinha foi boa!!!)
>
> Me desculpem se não concordam, mas esta é a minha opinião.
>
>
> Mário Marçal Jr.
>
>
> Em 08/08/2011, às 13:21, "SBME ." <sbme em sbme.com.br<http://mc/compose?to=sbme@sbme.com.br>>
> escreveu:
>
> Colegas:
>
> Vejo que existe um intenso movimento de colegas em difundir a notícia sobre
> a decisão do STF.
> Mas não vejo qualquer iniciativa em incentivar a discussão sobre a questão.
>
> Vejo com muita preocupação os argumentos usados pelo ministros para decidir
> o que decidiram.
> Refiro-me aos argumentos, e não à decisão.
>
> Ellen Gracie alegou que  o registro em entidades só pode ser exigido quando
> o exercício da profissão sem controle representa um "risco social", "como no
> caso de médicos, engenheiros ou advogados".
> Isso é verdade?
> O mau exercício da profissão de músico intérprete não representa risco
> social?
> Imagine um grupo social ouvindo a execução de uma obra contemporânea, nada
> conhecida, ou conhecida apenas de outro grupo social, mal tocada, cheia de
> desafinações, erros, saltos, etc. Nessas circunstâncias o público, sem
> perceber se estava tudo certo ou errado, recebe aquela execução como se ela
> representasse a realização fiel da partitura.
> Nesse caso, o mau músico intérprete, realizador da performance cheia de
> erros, não estaria provocando consequências desastrosas para a sociedade?
>
> O ministro Carlos Ayres Britto disse que não seria possível exigir esse
> registro pois a música é uma arte.
> O ministro Ricardo Lewandowski, por sua vez, chegou a dizer que seria o
> mesmo que exigir que os poetas fossem vinculados a uma Ordem Nacional da
> Poesia para que pudessem escrever.
>
> Mas, dentre as artes, a Música é a única que se utiliza do Triângulo da
> Comunicação para chegar ao público.
> O pintor, o poeta, o cineasta, o escultor, colocam suas criações artísticas
> diretamente no suporte, e o público tem acesso à fruição da arte
> contemplando o suporte diretamente.
> A música instrumental não vive esse processo simples. O compositor coloca
> sua criação num suporte, a partitura, plena de signos representativos, que
> deverão ser decodificados por músicos instrumentistas. Essa decodificação
> exige profundo conhecimento técnico.
>
> À salutar discussão!!!
> Abraços,
> Jorge Antunes
>
>
>
>
>
> Em 1 de agosto de 2011 19:49, Rogerio Budasz <<http://mc/compose?to=rogeriobudasz@yahoo.com>
> rogeriobudasz em yahoo.com <http://mc/compose?to=rogeriobudasz@yahoo.com>>escreveu:
>
> Matéria da Folha de hoje <<http://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/952808-musico-nao-precisa-de-registro-para-exercer-profissao-decide-stf.shtml>
> http://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/952808-musico-nao-precisa-de-registro-para-exercer-profissao-decide-stf.shtml
> >
> ==================================================
>
> Músico não precisa de registro para exercer profissão, decide STF
>
> FELIPE SELIGMAN
> DE BRASÍLIA
>
> Por unanimidade, o STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu nesta
> segunda-feira (1º) que o músico não precisa ter registro em entidade de
> classe para exercer sua profissão.
>
> Os ministros julgaram o caso de um músico de Santa Catarina que foi à
> Justiça ao alegar que, em seu Estado, ele só poderia atuar profissionalmente
> se fosse vinculado à Ordem de Músicos do Brasil.
>
> Em diversos locais do Brasil, músicos são obrigados a apresentar documento
> de músico profissional -- a "carteirinha de músico" -- para poder se
> apresentar.
>
> A decisão vale apenas para o caso específico, mas ficou decidido que os
> ministros poderão decidir sozinhos pedidos semelhantes que chegarem ao
> tribunal. Ou seja, se o registro continuar a ser cobrado, será revertido
> quando chegar no tribunal.
>
> Para a ministra Ellen Gracie, relatora da ação, o registro em entidades só
> pode ser exigido quando o exercício da profissão sem controle representa um
> "risco social", "como no caso de médicos, engenheiros ou advogados",
> afirmou.
>
> O colega Carlos Ayres Britto disse que não seria possível exigir esse
> registro pois a música é uma arte. Ricardo Lewandowski, por sua vez, chegou
> a dizer que seria o mesmo que exigir que os poetas fossem vinculados a uma
> Ordem Nacional da Poesia para que pudessem escrever.
>
> Já o ministro Gilmar Mendes lembrou da decisão do próprio tribunal que
> julgou inconstitucional a necessidade de diploma para os jornalistas, por
> entender que tal exigência feria o princípio da liberdade de expressão.
>
> ________________________________________________
> Lista de discussões ANPPOM
>  <http://iar.unicamp.br/mailman/listinfo/anppom-l>
> http://iar.unicamp.br/mailman/listinfo/anppom-l
> ________________________________________________
>
>
> ________________________________________________
> Lista de discussões ANPPOM
> http://iar.unicamp.br/mailman/listinfo/anppom-l
> ________________________________________________
>
>
>
> -----Inline Attachment Follows-----
>
>
> ________________________________________________
> Lista de discussões ANPPOM
> http://iar.unicamp.br/mailman/listinfo/anppom-l
> ________________________________________________
>
>
-------------- Próxima Parte ----------
Um anexo em HTML foi limpo...
URL: <http://www.listas.unicamp.br/pipermail/anppom-l/attachments/20110813/2aad919f/attachment.html>


Mais detalhes sobre a lista de discussão Anppom-L