[ANPPOM-Lista] Composição em Grupo

Daniel Lemos dal_lemos em yahoo.com.br
Ter Mar 20 06:14:14 BRT 2012


Prof. Palombini e colegas,
Acaba que a música contemporânea traz um importante aporte para a prática de composição em grupo. A "volta" da improvisação, as técnicas eletroacústicas, música aleatória... os relatos do colega Alexandre Fenerich reforçam o trabalho neste contexto. Engraçado é há poucos relatos desta prática em termos de bibliografia... dariam boas dissertações.

Prof. Sílvio: verdade, e neste sentido, podemos dizer que toda obra publicada se torna patrimônio cultural. Teoricamente, seria domínio público, mas esta não é a essência do termo "domínio público" em nossa sociedade; nesse caso significa "de graça". Aí questionamos também a questão de direitos autorais. Às vezes o intérprete trabalha na obra de um compositor e acaba tendo que pagar pelo usufruto dela, sendo que na maioria das vezes não é o compositor que o faz, mas os herdeiros dos direitos autorais ou o ECAD.

Caímos na questão das políticas públicas de incentivo à cultura. Pobre do artista brasileiro... atualmente, o Estado joga a responsabilidade para as empresas com as "Leis de Fomento", que dá o direito das empresas utilizam dinheiro público - que seria pago como imposto de qualquer maneira - para publicidade particular e autopromoção. Esse é um dos pontos que precisamos "cutucar" daqui em diante. Bem, fugi um pouco do assunto, mas tenho pensado nisso bastante ultimamente...

Abraços,

Daniel LemosCurso de Música/DEART - musica.ufma.brufma.academia.edu/dlemos - audioarte.blogspot.com
Universidade Federal do Maranhão


--- Em seg, 19/3/12, silvioferrazmello <silvioferrazmello em uol.com.br> escreveu:

De: silvioferrazmello <silvioferrazmello em uol.com.br>
Assunto: Re: [ANPPOM-Lista] Composição em Grupo
Para: "Daniel Lemos" <dal_lemos em yahoo.com.br>
Data: Segunda-feira, 19 de Março de 2012, 18:09

vc toca em um ponto que é mais altode fato toda composição é coletiva...este é o fatoou seja, se há alguém que assina este alguém pode ser apenas uma espécie de "antena da raça", para retomar um termo poundiano.de tradição escrita ou de tradição oral, ela é coletiva...o conhecimento é coletivo.veja por exemplo os milhares de brianzinhos que estão nos festivais de música contemporânea na europa, eua e mesmo japão. ou seja, existe uma espécie de zeit geist, não há como evitar isto.
se vc toma um artista como twombly, que quase ninguém fala, e visita seus trabalhos verá que ninguém fala nele mas que sua obra está por detrás de muita coisa da qual se fala, o mesmo para o um Michaux, quem lê Michaux?...mas ele está ali escondido na obra visual de qualquer poeta contemporâneo. mesmo que se saiba da existência dele..
ou seja, existe um modo de pensar de época, este modo atravessa diversas de nossos hábitos e quando escrevemos lá vem ele.claro, estes modos se multiplicam qdo se multiplica o número de relações.
estou aqui estudando para a aula de história da música...canto gregoriano, música obrigatoriamente anônima, já que é de Deus....conforme os ditos de são jerônimo e de santo hilário e de isidoro de sevilla.e então nasce a questão até onde esta nova prática coletiva não é a retomada da beatitude dos primeiros séculos de cristianismo, onde ninguém pode ser mais do que ninguém, ninguém pode querer se como Deus, deve-se abdicar à vaidade que morre com a carne e abraçar a palavra do coletivo que de Deus emana?
são questões, podem parecer bizarras, mas estão aí. 
abssilvio 

On Mar 19, 2012, at 5:33 PM, Daniel Lemos wrote:

Olá Sílvio,

Hum, agora o assunto está començando a tomar forma. Realmente, transitar entre passando e presente requer a análise da época em si; de fato não havia ainda direitos autorais como na atualidade, pois Mozart também defendia esta questão, se não me engano (novamente).

No caso do Salmo 51 que mencionaste, poderíamos considerar que o texto também daria um caráter de composição coletiva, assim como em Lieds ou Óperas? Seria possível considerar os casos em que o texto não é escrito pelo compositor, não?

Por outro lado, poderíamos também pensar que "toda composição é coletiva", do ponto de vista que a criação nunca é totalmente alheia; o compositor utiliza elementos musicais do passado e do presente. Mesmo que negue, seu conhecimento musical já o "contamina". Ainda, não música de tradição escrita, o
 intérprete sempre coloca suas experiências musicais próprias em diálogo com a obra interpretada. Aí estenderíamos bem o conceito de composição coletiva, não?

Um abraço,

Daniel LemosCurso de Música/DEART - musica.ufma.brufma.academia.edu/dlemos - audioarte.blogspot.com
Universidade Federal do Maranhão


--- Em seg, 19/3/12, silvioferrazmello <silvioferrazmello em uol.com.br> escreveu:

De: silvioferrazmello <silvioferrazmello em uol.com.br>
Assunto: Re: [ANPPOM-Lista] Composição em Grupo
Para: "Daniel Lemos" <dal_lemos em yahoo.com.br>
Cc: anppom-l em iar.unicamp.br
Data: Segunda-feira, 19 de Março de 2012, 16:52

oi
 daniel
..interessante tua resposta.então:o que estava colocando na roda era questionar o próprio conceito de composição coletiva e trazendo para o debate a produção das oficinas.mozart usava este modo de trabalhar e, pelo que sabemos, stockhausen a retomou na composição de Licht.
um oficial (como se chamava os trabalhadores das oficinas) pode bem deixar sua marca e até mesmo ser determinante na feitura de um trabalho.são diversos os relatos de trabalhos coletivos no renascimento.e por vezes se contratava um artista e se garantia que a obra ficaria pronta contratando dois oficiais (o que nos garantiu uma meia duzia de quadros de da Vinci, por exemplo, e nos garantiu o Requiem).e os oficiais podem não apenas garantir como também interferir decisivamente no resultado, visto que mesmo na mais ampla democracia teórica sempre
 existirá a diferença de velocidade de trabalho dos participantes de uma obra.
o que é importante realçar é que o que há de novo na composição coletiva não deve ser apenas o fato de ser feita por muita gente.é necessário outro ingrediente ou estaremos apenas reinaugurando o passado, embevecidos por imaginar estar inventando a roda.

algumas modalidades podem ser mapeadas:
1) composição coletiva como prática pedagógica...mas neste caso há uma orientação.2) isto é bem distinto do processo que parece ter havido na composição do grupo da paraíba (mando a pergunta ao valério: houve uma condução de um dos participantes ou realmente todas decisões foram coletivas?).3) e há a produção coletiva em que participantes tem funções diferentes (tomar cuidado com a proposta de retomar a produção fordista...seria
 interessante estudar a música do realismo socialista e a do cinema americano...alguém assina, ou o proletariado assina, e um bando de anônimos trabalha e até mesmo é demitido em meio ao processo caso não esteja rendendo)4) há tembém trabalho em que cada um que participa o faz às cegas e o resultado é o amálgama díspar (cage+merce cunningham)5) o trabalho do tipo improvisação livre coletiva (trabalho de iazzetta e rogério costa na usp)6.1) o trabalho de colaboração (o técnico informático ou eletrônico e o compositor, como acontece no ircam, grm e tal)6.2) o trabalho de colaboração compositor-instrumentista como o realizou e dovumentou giacinto scelsi. ou seja, existem modalidades desta prática.
no mais, quanto a Mozart...ele não assina a obra, não teve tempo pra isto.ele teria assinado talvez (nem disto se sabe ao certo) o
 contrato para realização da obra.temos de tomar cuidado com nossa noção de propriedade romântica e a noção de propriedade pré-romântica...dois mundos a parte.vale à pena a leitura do pequeno livro  de Szendi sobre a escuta musical em que trabalhar justamente o conceito de autoria. 
a quem pertence o stabat mater, o qual bach reproduz hipsis literis em seu salmo 51...esta peça, o salmo, é de bach ou pergolesi?
abssilvio
On Mar 19, 2012, at 1:26 PM, Daniel Lemos wrote:

Caro Sílvio,

Obrigado pelas informações. Interessante observar que há de fato iniciativas de composição "formal" coletivas. Agora não imaginava que a
 composição do Requiem de Mozart poderia ser considerada uma metodologia de composição coletiva. Neste caso, em que sentido especificamente? Se o compositor estiver aberto a sugestões musicais de intérpretes, seria isto uma composição coletiva? Do aspecto da autoria, poderia não ser, pois Mozart assina a obra. Ainda, a aproximação entre intérprete e compositor, assim como nas Sequenze de Berio, poderiam ser consideradas "composição coletiva"?

Um abraço,

Daniel LemosCurso de Música/DEART - musica.ufma.brufma.academia.edu/dlemos - audioarte.blogspot.com
Universidade Federal do Maranhão


--- Em dom, 18/3/12, silvioferrazmello <silvioferrazmello em uol.com.br> escreveu:

De: silvioferrazmello <silvioferrazmello em uol.com.br>
Assunto: Re: [ANPPOM-Lista] Composição em Grupo
Para: "Valério Fiel da Costa" <fieldacosta em gmail.com>
Cc: "ANPPOM-L" <anppom-l em iar.unicamp.br>
Data: Domingo, 18 de Março de 2012, 23:27

Caro Daniel,
Lembro aqui de uma
 experiência.Em 1994 Flo Menezes, eu e os alunos do festival de campos do jordão compusemos uma grande peça para isntrumentos e eletrônica como resultado do curso de composição.A peça, intitulada Campos de Pássaros, está gravada em CD Música Maximalista (creio que o segundo
 volume)Mas existem diversas formas de composição coletiva.Mozart mantinha uma verdadeira oficina e seu Requiem é resultado desta oficina bem como suas ultimas sinfonias e a Cantata Maçônica.Cabe saber bem o que entende0se por composição coletiva e o quanto seus participantes realmente participam do processo desde seus primeiros passos.Cito o exemplo de Campos pois dele participaram, dentre os 9 alunos do curso, alguns que hoje se destacam no panorama da música brasileira como Pedro Kroeger e Sérgio Kafegian.Pelo visto temos diversas experiências no Brasil.Fora do Brasil uma experiência surpreendente é o trabalho do grupo L'Itineraire, que realizaram diversas obras coletivas nos anos 80.

AbsSilvio Ferraz
On Mar 18, 2012, at 11:55 AM, Valério Fiel da Costa wrote:
Caro Daniel.
Se estiver interessado em composição coletiva "formal", estamos programando para a ANPPOM um painel sobre a experiência de composição coletiva desenvolvida ano passado aqui em João Pessoa pelo COMPOMUS. Trata-se da "Cantata Bruta", obra para orquestra, coro, solistas, narradores e eletrônica composta por 6 membros do núcleo. Tal prática, muito bem sucedida, motivou mais duas experiências de grande porte, envolvendo vários compositores, programadas para este ano.

chamada aqui:http://www.paraiba.com.br/colunista/edileide-vilaca/52137-cantata-bruta-em-comemoracao-aos-70-anos-de-w-j-solha

Algumas críticas aqui:http://www.portal100fronteiras.com.br/noticias.php?id=10505http://www.portal100fronteiras.com.br/noticias.php?id=10503

Abç
VFC

Em 17 de março de 2012 15:20, Daniel Puig <danielpuig em me.com> escreveu:

olá, daniel!
no campo da educação musical você encontra bastante coisa, se interessar. procure nos livros de Robert Murray Schafer, Brian Dennis, George Self e John Paynter. nos textos e livros de Keith Swanwick você pode achar algum aparato teórico que ajude, embora os questionamentos dele sejam voltados para a idade escolar. também em "Minds on Music: composition for creative and critical thinking" de Michele Kaschub e Janice Smith.

vários textos na área da música contemporânea, ligados principalmente à improvisação, você vai encontrar questionamentos que interessem. no momento não me lembro de nenhum que aborde unicamente o assunto "composição em grupo", mas tenho certeza que outros colegas de lista poderão completar as informações.

abraço,
puig

Em 16/03/2012, às 15:10, Daniel Lemos escreveu:


Olá,

Gostaria de saber se vocês conhecem referências 
bibliográficas sobre prática de Composição em grupo. Não tenho tido 
sucesso nas pesquisas até agora. Muito obrigado pela atenção.

Cordialmente

Daniel Lemos
Curso de Música/DEART - musica.ufma.brufma.academia.edu/dlemos - audioarte.blogspot.com

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