[ANPPOM-Lista] Fotógrafo francês traça a ‘geografia noturna’ dos bailes funk no Rio

luciano cesar lucianocesar78 em yahoo.com.br
Qui Nov 8 13:31:38 BRST 2012



Prezados senhores da lista, 

A ligeireza com
que tratei o assunto a que se refere o título desta mensagem facilitou julgamentos – esses sim, ad hominem – a minha pessoa, diretamente. Não reclamo da
divergência de opiniões, mas me senti ofendido e humilhado por ser associado a
uma lente de olhar “curioso”, “preconceituoso”, “elitista” do senso “comum”, “devoto e escravo dos ditames
senhoriais” e por ter minha opinião sendo classificada
como irrelevante, apesar de ter merecido a atenção dos senhores a partir de
julgamentos que atingem a minha pessoa e não a opinião que emito a respeito de
um gênero musical. Mas não recebi nenhum argumento.

Há dois pontos
que levantei em meu comentário que, pela leveza até irresponsável do meu
tratamento, foram ignorados. Primeiro, a questão de se o funk é (entre muitas
coisas diferentes que caracterizam o objeto social) um gênero musical legítimo como
representação das classes populares associadas a ele, ou licença, dada pela
classe dominante, para manutenção de estruturas sociais desiguais e
estratificadas. O segundo ponto é, no caso de se considerar o funk como
manutenção de estruturas estratificadas de poder, se o olhar estrangeiro
laudatório não facilitaria a celebração dessa manutenção dominante. As questões
são claras, e podem ser perfeitamente discutidas sem juízo do interlocutor e a
partir de uma argumentação científica. Pode ser que frequentar e fotografar bailes
realmente qualifique um fotógrafo a se dizer conhecedor “por dentro e de perto”,
como afirma o sr. Rafael Marin. Mas trabalhar em projetos sociais – como é o
meu caso – talvez também ajude a alimentar um olhar mais aproximado sobre a
representatividade que os moradores de comunidades de periferia efetivamente conferem
a esse gênero musical.

Não entendo como
a crítica feita a partir desses dois pontos (estratificação de estruturas de
poder e apologia a uma cultura isolada, uma reforçando a outra) seja a de uma “mentalidade
colonizada”, até porque não aleguei em momento nenhum, comparação com qualquer
manifestação cultural de “elite”. Sequer falei da relação de belo-não belo. Esse
preconceito, provavelmente, está na cabeça de quem leu. A defesa que faço - em
minha vida privada e acadêmica - da política das cotas, por exemplo, leva em
conta exatamente a intenção de desestratificar essas estruturas de poder exercido
através da cultura. A meu ver, a apologia da cultura das classes subjugadas tem
esse efeito ambíguo: por um lado celebra a vida cultural de uma comunidade, mas
por outro, oculta a negação do livre acesso de outras expressões culturais a
uma parcela desfavorecida da população num movimento de dominação implícita. 

Isso não é fruto
de uma pesquisa científica, mas uma opinião (embasada) a que tenho direito, com
toda a probabilidade de ser refutada por convencimento da parte de pesquisadores
comprometidos com a questão. O que eu não gostaria é de me ver enredado em
ofensas pessoais por defender tal opinião, mesmo que tenha que discutir e reconhecer
o erro de meu ponto de vista.

Embaso essa discussão
não só em minha opinião mas, entre outras experiências, na ação pública do escritor,
cantor e artista Ferrez (http://ferrez.blogspot.com.br/p/autor.html), a quem
tive oportunidade de ouvir renegando os bailes funk como representativos da
cultura de periferia (palestra dada ao programa Guri Santa Marcelina em
08/02/2012). Não sei se Ferrez concordaria com minha mensagem, mas com certeza
discutiria a questão em outros termos. Sou levado a pensar que talvez ele
discutisse a questão e não a minha pessoa. E talvez, mesmo que concordasse
comigo do ponto de vista da crítica, apreciaria a qualidade artística das fotos,
como eu também apreciei.

No entanto, o sr Carlos Palombini e o sr. Rafael Marin responderam como se se
quisessem pareceristas de um artigo acadêmico ao que deveria ter sido a
expressão livre de uma opinião. Ou seja, cientificizaram o rechaçamento de
minha pessoa, de minha capacidade de raciocínio (“O restante do raciocínio, se
é correto empregar este termo aqui”), rejeitaram minha experiência possível e
subestimaram minha capacidade de compreender argumentos contrários que,
acredito sinceramente, os senhores são perfeitamente capazes de proferir. Nesses
“pareceres”, um verniz cientificista deslocado trouxe a luz uma leitura rasa
que atribui à minha pessoa posições que absolutamente não defendo, além de me
acusarem de ignorante sem sequer conhecer a experiência que tenho como
professor de projetos sociais. Nenhum dos dois me conhece pessoalmente para
justificar o seu juízo. 

Pergunto aos
senhores onde está o argumento ad hominem
na minha mensagem, já que não mencionei pessoas: o termo “francês ver”, de
minha primeira frase, alegoriza um olhar estrangeiro, tradicionalmente
deslumbrável pelo exótico com que reveste o diferente, às vezes para mostrar a
beleza, mas às vezes para negar a injustiça social imanente ao fenômeno social
que observa. Nas respostas, entretanto, faculdades cognitivas foram
mencionadas. Fui acusado, além de elitista e ignorante, também de falacioso no
“abraço” com que sempre assino minhas mensagens escritas a comunidade acadêmica
de que faço parte, que amo e defendo, mesmo discordando, exercendo minha
liberdade de expressão e confiança de que minhas opiniões possam ser acolhidas,
compreendidas e refutadas sempre que necessário.

Se falei uma
imensa bobagem, peço sinceras desculpas e me disponho a pesquisar melhor os
dados. Como acabo de dizer, manifestei uma opinião e estou realmente aberto a argumentos
que enriqueçam essa opinião, desde que haja discussão dos pontos levantados.
Mas eu, sinceramente, esperava uma reação melhor dos senhores.

 

Grato pela
atenção, 

Um abraço a quem
aceitar.            

Luciano Morais




--- Em ter, 6/11/12, Carlos Palombini <cpalombini em gmail.com> escreveu:

De: Carlos Palombini <cpalombini em gmail.com>
Assunto: Re: [ANPPOM-Lista] Fotógrafo francês traça a ‘geografia noturna’ dos bailes funk no Rio
Para: anppom-l em iar.unicamp.br
Data: Terça-feira, 6 de Novembro de 2012, 14:41

Interessante como os ataques à matéria mostram uma forte propensão ao argumentum ad hominem, isto é, atacam o oponente, e não seus argumentos. Trata-se de uma falácia lógica ou, mais precisamente, de uma irrelevância. O restante do raciocínio, se é correto empregar este termo aqui, é tautológico. Não há qualquer sombra de elaboração teórica ou de experiência reveladora do que quer que não seja preconceito de classe, isto é, ignorância. Agradeço a gentileza dos "abraços", que não posso aceitar, por falaciosos.


cp

Mensagem de Rafael Marin:

Ao invés de uma celebração pela etnografia fotográfica que o olhar - de 
perto e de dentro - de Vicent Rosenblatt nos traz (trabalho este que 
deveria levar, em primeiro lugar, a uma discussão acerca das pesquisas etnomusicológicas que têm como campo e objeto de pesquisa os espaços do funk carioca e suas implicações sócio-culturais), o
 que tivemos foi, lamentavelmente, um infeliz comentário que reflete um 
olhar - de fora e de longe - ingênuo (cientificamente falando), preconceituoso
 e elitista de um devoto e escravo dos ditames senhoriais que ainda 
insistem em se proclamar, através de seus porta-vozes, detentores dos 
critérios que distinguem o belo do não-belo, o artístico do 
não-artístico, o estético do não-estético, quando na verdade a única distinção que fazem é entre ciência e senso comum, entre pesquisador e curioso.Rafael Marin


2012/11/6  <lcm em usp.br>

    Cultura pra francês ver. Às "elites" interessa exatamente isso: alienação, ignorância, superficialidade  da classe popular. O funk não é uma insurreição contra nenhuma estrutura social, pelo contrário. Até defendo o o funk como expressão social e cultural de uma classe oprimida, mas a apologia e a esteticização disso me parece a mesma coisa que elogiar a pujança e a beleza das senzalas. 

Abraço, 



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