[ANPPOM-Lista] [etnomusicologiabr] Transformações e apropriações do funk carioca

Carlos Palombini cpalombini em gmail.com
Qui Jul 4 13:22:54 BRT 2013


Olá, Hugo

De fato, Anitta e Naldo são os primeiros nomes que me teriam ocorrido para
ilustrar o tema. São dois casos extremos. Não há nem poderia haver, para a
escuta, uma barreira intransponível de classes. E Anitta e Naldo são apenas
os casos extremos mais recentes. Eu poderia citar, antes, o MC Mazinho, ou
Claudinho e Buchecha. Não conheço o passado de Anitta ou de Naldo no funk,
mas sei que os de Mazinho e de Claudinho e Buchecha estão intimamente
associados a suas comunidades de origem. Embora eu não tenha me detido
muito nas carreiras da dupla ou de Mazinho, posso dizer que a temática e as
letras do último não são do tipo que cause problemas de classe, embora a
sonoridade geral, a estética, tenham sido (não sei como é seu som agora).
Marcinho tornou-se conhecido em meados dos anos 1990 com o "Rap do
solitário":

http://youtu.be/XXwTogJ_cZE

Não é difícil imaginar que esse tipo de funk (o melody) seja facilmente
empacotável para presente a ser entregue na Barra, por exemplo. O melody é
um subgênero que não me atrai nem um pouco.

Claudinho e Buchecha surgiram na mesma época com uma temática menos
interclasse. A música que os lançou foi o "Rap do Salgueiro":

http://youtu.be/DOaqQ8OaEzg

Eles tornaram-se pop, o que foi facilitado por certo bel-letrismo e por uma
vocalidade mais melódica. Mas continuaram interessantes.

http://youtu.be/QET3qyLBRSk

É difícil dizer o que os funkeiros "de raiz", isto é, das comunidades ou
favelas do Rio, pensem de Anitta e Naldo. Por daliferentes razões:
primeiro, porque não existe um gosto ou uma estética padronizada entre "o
grupo", e me parece muito provável que tanto Anitta quanto Naldo
correspondam ao anseio de muita gente por uma certa higienização,
moralização ou respeitabilidade do gênero, que pode se traduzir em maior ou
menor convencionalismo sonoro. Depois, porque a "amostragem" do "grupo" com
a qual convivo é substantivamente seletiva. Ela inclui sobretudo os
funkeiros que eu chamaria de radicais, aqueles que frequentam os bailes de
comunidades sujeitas ao Comando Vermelho, que embora não necessariamente
ligados ao comércio de substâncias ilícitas dizem "ser Comando", e odeiam a
polícia, seja porque estão sujeitos à violência de Estado, seja porque tem
amigos ou parentes que foram encarcerados ou mortos por ela. Arriscando uma
generalização, eu diria que, para esses, Anitta é "gostosa" e Naldo,
"oportunista". Aliás, ele foi bastante ridicularizado quando apareceu na
janela do hotel Fasano para a multidão ao lado de Will Smith no dia 11 de
fevereiro, no Rio:

http://youtu.be/_QVwheaX3Hg

E foi ridicularizado ainda quando supostamente teve sua entrada impedida no
camarote da Brahma onde procurava Will Smith no sambódromo.

Diferente é o caso da MC Sabrina, muito mais velha que Anitta, que tem um
passado no Proibidão e hoje cultiva uma imagem pop sem deixar completamente
de lado os aspectos menos palatáveis de sua arte:

http://youtu.be/2oxzfCBiPN0

De fato, ler a história do samba à luz da história do funk, em outras
palavras, uma crítica historiográfica, é um dos objetivos de minha pesquisa.

Afora isso, a situação é realmente revoltante. Conheço um jovem DJ de 17
anos que está impedido de trabalhar porque os bailes estão proibidos na
comunidade em que vive (o Jacarezinho), enquanto proibidões se ouvem
livremente em boates da Zona Sul.

Abraço,

Carlos






2013/7/4 Hugo Leonardo Ribeiro <hugoleo75 em gmail.com>

> **
>
>
> Prezado Palombini,
>
> Por acaso minha filha de quatro anos começou a cantar no carro uma música
> que eu nunca tinha ouvido. Meu filho de seis disse que suas amigas também
> cantam essa música. Ambos aprenderam a letra com os colegas de sala de
> aula. Procuramos na internet e descobrimos que é a música "Sohw das
> poderosas" da cantora Anita. Após ler um pouco sobre ela, me veio à cabeça
> essa questão da apropriação do funk por outras classes sociais, tal como
> essa cantora bem disse em sua entrevista no link abaixo que acontecera com
> o samba no passado:
>
> "Ainda de acordo com a cantora, o funk enfrenta, atualmente, o mesmo
> caminho que o samba trilhou. 'São ritmos vindos de comunidades carentes. Se
> observarmos a história do samba, veremos que a luta dos músicos também foi
> grande. Mas eles venceram! O funk está no mesmo caminho. Hoje, as festas
> regadas ao batidão não estão restritas às comunidades. O funk chegou à
> novela das nove. Isso é muito legal', comenta, fazendo referência à forma,
> cada vez mais clara, com que a dramaturgia brasileira explora esse
> universo."
> Acredito que ela está certa, de certa forma. Nisso aparecem cantores como
> o tal do Naldo, que parece fazer algo semelhante à Anitta, ou seja, um funk
> mais bem empacotado, com toda uma preocupação com a afinação do cantor
> (talvez através de autotune, ou não), vídeos bem produzidos, e shows em
> locais outros que não os bailes funks.
>
> Ou seja, estaremos vivendo um "embranquecimento" do funk para classe média
> curtir sem se sentir "pobre"?
>
> Mas o que eu gostaria de saber é se você tem ideia de como as comunidades
> das favelas enxergam esse processo de apropriação e transformação de suas
> práticas musicais.
>
> Será que o Sandroni pode fazer um paralelo entre esse processo atual e seu
> livro "Feitiço Decente"?
>
> Um abraço,
>
> Hugo Ribeiro
>
>
> http://www.ofluminense.com.br/editorias/cultura-e-lazer/funk-na-veia-ritmo-que-ja-e-%E2%80%9Cquarentao%E2%80%9D-parece-incansavel-na-arte-da-renov
>
> p.s. Foi engraçado meu filho de seis anos criticando a irmã, ao dizer que
> ela não devia cantar aquela música pois, se não era uma música que nós
> pais, os adultos, ouviam no carro, então não era uma música boa... E agora
> José? Preconceitos já se formando...
>
>
>
>  __._,_.___
>
> <hugoleo75 em gmail.com?subject=Res%3A%20Transforma%E7%F5es%20e%20apropria%E7%F5es%20do%20funk%20carioca>| através
> de email<etnomusicologiabr em yahoogrupos.com.br?subject=Res%3A%20Transforma%E7%F5es%20e%20apropria%E7%F5es%20do%20funk%20carioca>| Responder
> através da web<http://br.groups.yahoo.com/group/etnomusicologiabr/post;_ylc=X3oDMTJxY2NkbWcxBF9TAzk3NDkwNDM3BGdycElkAzE3OTEyNjM1BGdycHNwSWQDMjEzNzExMTE2OQRtc2dJZAM3ODI3BHNlYwNmdHIEc2xrA3JwbHkEc3RpbWUDMTM3Mjk0OTk3NA--?act=reply&messageNum=7827>| Adicionar
> um novo tópico<http://br.groups.yahoo.com/group/etnomusicologiabr/post;_ylc=X3oDMTJmcGYzZ2Q4BF9TAzk3NDkwNDM3BGdycElkAzE3OTEyNjM1BGdycHNwSWQDMjEzNzExMTE2OQRzZWMDZnRyBHNsawNudHBjBHN0aW1lAzEzNzI5NDk5NzQ->
> Mensagens neste tópico<http://br.groups.yahoo.com/group/etnomusicologiabr/message/7827;_ylc=X3oDMTM1MnJodGdpBF9TAzk3NDkwNDM3BGdycElkAzE3OTEyNjM1BGdycHNwSWQDMjEzNzExMTE2OQRtc2dJZAM3ODI3BHNlYwNmdHIEc2xrA3Z0cGMEc3RpbWUDMTM3Mjk0OTk3NAR0cGNJZAM3ODI3>(
> 1)
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>    2
>
>  Visite seu Grupo<http://br.groups.yahoo.com/group/etnomusicologiabr;_ylc=X3oDMTJmczJrY2RkBF9TAzk3NDkwNDM3BGdycElkAzE3OTEyNjM1BGdycHNwSWQDMjEzNzExMTE2OQRzZWMDdnRsBHNsawN2Z2hwBHN0aW1lAzEzNzI5NDk5NzQ->
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carlos palombini
pesquisador visitante, centro de letras e artes, unirio
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