[ANPPOM-Lista] sobre pianos e toca-discos

Carlos Palombini cpalombini em gmail.com
Sáb Nov 30 21:15:45 BRST 2013


*Um discurso verdadeiramente progressista de ampliação ao acesso à cultura
deve necessariamente alojar sob o mesmo teto pianos de cauda e turntables.
É preciso que seja proporcionado indistintamente o contato com toda a arte
produzida até então e inserir a todos no diálogo com linguagens
contemporâneas. Para tanto, é preciso que esteja à mão do novo artista o
ensino que até hoje lhe foi negado e os instrumentos para que possa
ressignificar e criticar a sua realidade da maneira que lhe parecer
apropriado. Seja através de uma composição eletroacústica ou de uma rima
proibidona.*

http://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Cultura/Sobre-pianos-e-turntables/39/29689
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29/11/2013 - Copyleft Sobre pianos e turntables O funk entre a gestão
pública de cultura e o mofo da academia
<http://www.cartamaior.com.br/includes/controller.cfm?cm_conteudo_id=29689>
Na academia, muito se fala sobre as implicações sociais do funk. Pouco se
fala da estética e dinamismo criativo emergidos de um movimento complexo.
Andrei Reina (*)[image: Catraca Livre]

















Desde a conturbada gestão de Ana de Hollanda à frente do Ministério da
Cultura, a gestão pública na área tem sido debatida cada vez mais. Embora
louvável, esse aumento em quantidade nem sempre vem acompanhado de
qualidade. No que diz respeito à música, um dos tópicos mais polêmicos gira
em torno do funk carioca. Tirando os que se prestam ao preconceito puro e
simples, é possível observar duas tendências ao olhar o fenômeno que
costumam prevalecer.

Há quem trate o gênero em um tom patriarcal e inflija um olhar maniqueísta
sobre os artistas dali oriundos, contrapondo-os entre politizados e
alienados. Existiria, de um lado, o artista preocupado com sua comunidade
e, de outro, aquele cuja atenção se dirige exclusivamente para sua ascensão
social. Logo, é um olhar violento que retira de um movimento complexo
apenas o que lhe apraz.

A outra revela seu germe no distanciamento e contamina parte da academia -
sublinhado pelo fato da maioria dos estudos sobre o funk pertencer às
prateleiras de Antropologia. Ou seja, uma ciência fundada na questão da
alteridade teve de tentar dar conta do fenômeno. Com isso, pouco se fala da
estética e dinamismo criativo dali emergidos, e sim de suas implicações
sociais.

Não é preciso muito para notar o quanto essas visões são limitadas, mas há
exemplos ainda mais escatológicos dentro do progressismo. No dia 16 de
setembro, em debate promovido pelo Programa de Educação Tutorial do
Departamento de Filosofia da FFLCH-USP, o professor Vladimir Safatle
afirmou categoricamente que “o funk não deu em nada”. Embora ele defendesse
que a divisão entre culturas popular e erudita não fosse mais suficiente -
o que parece bastante razoável -, suas falas revelavam grande ignorância
sobre manifestações tidas como populares.

Um ponto consensual entre aqueles preocupados com a gestão pública da
cultura é a necessidade urgente da universalização do acesso ao ensino e
produção artística. Isto se daria, por exemplo, com multiplicação de
centros culturais pela cidade, que levassem para além do centro ensino de
longo prazo e aprofundado de história e fruição das artes, bem como
oferecesse meios para produção de novo conteúdo.

Quando a crítica à precariedade dos aparelhos culturais do Estado vem
acompanhada de distanciamento, desconhecimento e preconceito em relação a
fenômenos populares como o funk, ela se torna imediatamente surda e ecoa em
um ou outro gabinete mofado. Enquanto se discute o que é arte ou o que
seria sub-serviço à indústria cultural hoje, tanto não são construídos
conservatórios como são reprimidos bailes funk. Como em vários casos em que
a consequência do sectarismo na esquerda grita, quem ganha com a falta de
unidade é justamente a estrutura que se tenta combater.

Um discurso verdadeiramente progressista de ampliação ao acesso à cultura
deve necessariamente alojar sob o mesmo teto pianos de cauda e turntables.
É preciso que seja proporcionado indistintamente o contato com toda a arte
produzida até então e inserir a todos no diálogo com linguagens
contemporâneas. Para tanto, é preciso que esteja à mão do novo artista o
ensino que até hoje lhe foi negado e os instrumentos para que possa
ressignificar e criticar a sua realidade da maneira que lhe parecer
apropriado. Seja através de uma composição eletroacústica ou de uma rima
proibidona.

(*) Andrei Reina é estudante de Ciências Sociais na Faculdade de Filosofia,
Ciências e Letras da USP.

-- 
carlos palombini
professor de musicologia ufmg
proibidao.org
ufmg.academia.edu/CarlosPalombini
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