[ANPPOM-Lista] punição tardia

Carlos Palombini cpalombini em gmail.com
Qui Fev 13 13:41:21 BRST 2014


O engenheiro químico Denis Lima Guerra, protagonista do maior caso de
fraude científica que já envolveu pesquisadores
brasileiros<http://revistapiaui.estadao.com.br/edicao-60/anais-da-ciencia/os-alquimistas>,
foi demitido em janeiro da Universidade Federal do Mato Grosso, onde era
professor. Guerra era objeto de um processo administrativo que se arrastava
há mais de dois anos. A comissão de inquérito responsável pelo caso
recomendou a exoneração do pesquisador, decisão acatada pela reitoria.

A exoneração de Guerra foi publicada em 13 de
janeiro<http://www.portaldatransparencia.gov.br/expulsoes/detalheServidor?codigoPunicao=14677>no
*Diário
Oficial da União*, com base em quatro fundamentos legais: valer-se do cargo
para tirar proveito pessoal, improbidade administrativa, faltar com
lealdade à instituição que servia e desrespeito às normas legais e
regulamentares.

Tentei falar com Guerra sem sucesso para comentar a notícia. Em seu currículo
Lattes<http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K4777802J5>,
atualizado pela última vez há uma semana, ele ainda não comunicou seu
desligamento da UFMT.

Em 2011, Guerra teve onze artigos de sua autoria anulados (*retracted*)
pela Elsevier, maior editora científica do mundo. Ele e seus coautores
foram acusados de forjar dados obtidos por ressonância magnética nuclear
usados nos artigos. Comissões independentes de especialistas montadas pela
Elsevier, pela UFMT e pela Unicamp investigaram o caso e entenderam que
houve, sim, falsificação de dados.

Nunca antes um caso de má conduta atribuída a pesquisadores brasileiros
havia envolvido um número tão grande de artigos - até hoje, continua sendo
o maior episódio de fraude em série revelado no país. O caso foi relatado
na reportagem "Os
alquimistas"<http://revistapiaui.estadao.com.br/edicao-60/anais-da-ciencia/os-alquimistas>,
publicado na *piauí *60, de setembro de 2011.

A acusação de fraude envolveu também o químico Claudio Airoldi, decano do
Instituto de Química da Unicamp. Orientador de Guerra em seu doutorado,
Airoldi foi coautor dos onze trabalhos com dados forjados. Quando estive
com ele em seu laboratório em 2011, ele contou que sequer havia lido os
trabalhos antes da publicação, confirmando o que me dissera Guerra.

A Unicamp foi mais ligeira para julgar o caso: em outubro de 2011, puniu
Airoldi com 45 dias de
suspensão<http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ciencia/fe0110201102.htm>.
O atraso do processo administrativo da UFMT se deveu em parte a medidas
protelatórias tomadas pelos advogados de Guerra. "A Comissão Processante
solicitou inúmeras prorrogações, considerando a complexidade dos fatos, e a
realização de análises periciais, documentais e testemunhais, com 14
testemunhas", esclareceu, por e-mail, a reitora da UFMT, Maria Lúcia
Cavalli Neder. "A UFMT zela pela qualidade e credibilidade de suas
produções científicas e lamenta que esse caso tenha ocorrido, sobretudo em
um momento de expansão de sua graduação, pós-graduação e pesquisa",
acrescentou a reitora.

Este não é o primeiro caso no Brasil de demissão de um pesquisador
vinculado a uma instituição pública de pesquisa em decorrência de má
conduta científica. Em fevereiro de 2011, a USP exonerou o biólogo
Andreimar Martins
Soares<http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff2002201101.htm>,
acusado de plagiar imagens de um artigo de pesquisadores da UFRJ.

O caso de fraude protagonizado por Guerra motivou a criação pelo CNPq de
uma Comissão de Integridade na Atividade Científica para investigar
denúncias de má conduta. O médico e biofísico Paulo Sérgio Lacerda Beirão,
professor da UFMG que comandou a comissão por dois anos e meio, lembrou que
o episódio surpreendeu muito a comunidade. "Preferíamos achar que esse tipo
de problema não existia, até que a realidade mostrou que era diferente."

Sonia Vasconcellos, pesquisadora da UFRJ que estuda a ética na ciência,
lembrou que a notícia chega num momento em que o Brasil está no foco do
interesse dos estudiosos da área. "Estamos sendo vistos como um país que
está levando a sério a questão da integridade em pesquisa", afirmou,
acrescentando que o Rio sediará a 4ª Conferência Mundial sobre Integridade
em Pesquisa em 2015.

*(foto: Riccardo Cuppini - CC 2.0 BY-NC-ND)*

Atualização: Este post foi atualizado às 19:45 de 12/02/14 para incluir as
declarações da reitora da UFMT.

*Leia também:*
Os alquimistas<http://revistapiaui.estadao.com.br/edicao-60/anais-da-ciencia/os-alquimistas>
Homenagem de mau
gosto<http://revistapiaui.estadao.com.br/blogs/questoes-da-ciencia/geral/homenagem-de-mau-gosto>
Má conduta em foco<http://revistapiaui.estadao.com.br/blogs/questoes-da-ciencia/geral/ma-conduta-em-foco>
Vida após a fraude<http://revistapiaui.estadao.com.br/blogs/questoes-da-ciencia/geral/vida-apos-a-fraude>
http://revistapiaui.estadao.com.br/blogs/questoes-da-ciencia/geral/punicao-tardia

-- 
carlos palombini
professor de musicologia ufmg
proibidao.org
ufmg.academia.edu/CarlosPalombini
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