[ANPPOM-Lista] avaliação qualitativa

Carlos Palombini cpalombini em gmail.com
Ter Maio 14 17:18:12 BRT 2013


2013/5/12 Damián Keller <musicoyargentino em gmail.com>

Obrigado pelo link para o trabalho do grupo de cognição social da UnB.
>

Não por isso.


> Sobre os comentários de Vitor Haase, eles foram separados do contexto.
>

É evidente.


> Ele está argumentado explicitamente a favor da aplicação do método
> científico e faz uma crítica aguda à postura anticientífica na
> universidade brasileira:
>

Meu objetivo não era comentar, endossar ou contestar o texto dele, portanto
não vou entrar na discussão do que ele disse ou não disse.


> VH:
> > O resultado deste processo, na minha avaliação, é uma hegemonia de
> atitudes anticientíficas nas universidades brasileiras atuais. O ambiente
> entre professores e alunos é majoritariamente hostil à pesquisa científica,
> à testagem de hipótese e à busca de neutralidade no conhecimento
> científico. Todo um castelo de construções teóricas foi construído,
> procurando argumentar que não existe neutralidade na pesquisa, que
> interesses econômicos e de dominação são os motivos verdadeiros subjacentes
> à pesquisa, que a ciência é um aparelho ideológico do estado, um
> instrumento de dominação e hegemonia e etc.
>

Vitor, que eu conheço de meus anos de colégio jesuíta em Porto Alegre, fala
de dentro de sua própria área de pesquisa. Na Musicologia, é diferente.
Essa pretensa neutralidade necessita prementemente ser desconstruída. Não
posso deixar de concordar com ele e apoiá-lo: já vi, em outra lista, a
neuropsicologia ser "desconstruída" por uma antropologia *pret-à-porter*.
Chamo isso "infantilismo científico".


> > A crítica ideológica é o caminho do menor esforço. Não há necessidade de
> ralar, de malhar, de estudar epistemologia, estatística, de aprender
> neuroanatomia, epidemiologia clinica, matemática, programação de
> computadores, controle de variáveis etc. Basta se apossar de um referencial
> teórico mínimo e sair por aí “interpretando”.
>

Há críticas ideológicas e criíticas ideológicas. A propriamente dita tem
seus próprios métodos, alguns derivados da linguística. O esforço é muito
claro quando se mede o caminho que leva, em Roland Barthes por exemplo, de *
Mitologias* a *Elementos de semiologia*, e deste, a *Sistema da moda*.
Aquela da qual Vitor fala é a que dispara expletivos a torto e a direito:
"indústria cultural", "essencialismo", "neopositivismo" etc.


O resumo desse enfoque está neste parágrafo:
> > Na tradição hermenêutica, que caracteriza o existencialismo/humanismo,
> psicanálise e psicossociologia, o objetivo da psicologia é construir um
> referencial interpretativo que auxilie na atribuição de sentido psicológico
> à experiência subjetiva humana. Se caracterizarmos a ciência pelo método
> hipotético-dedutivo-experimental, então estas disciplinas não são ciência.
> Seu conhecimento é de outro tipo. Mais relacionado com a sabedoria. Eu
> gosto de pensar assim: a perspectiva hermenêutica trata a experiência
> subjetiva como variável independente, quase lhe atribuindo um estatuto de
> fator explicativo causal. Já na perspectiva científico-natural, a
> subjetividade é concebida como uma variável dependente, ou seja, algo que
> precisa ser explicado em função de fatores genéticos, da estrutura
> anátomo-funcional do cérebro, das experiências de aprendizagem etc.
>

Vitor não é ignorante, portanto, repare que ele usa o condicional: "se
caracterizarmos a ciência pelo método hipotético-dedutivo-experimental".


> Os exemplos que VH menciona, justamente apoiam a ideia de que as
> ciências humanas precisam de métodos quantitativos:
>
> > Nos países de língua alemã, p. ex., o curriculum de graduação em
> psicologia pode compreende até uma dúzia de disciplinas relacionadas a
> métodos quantitativos, tais como estatística, programação, psicometria,
> metodologia experimental. O aluno sai do curso de graduação com uma base
> matemática e metodológica que foge ao alcance da imaginação dos nossos
> estudantes e professores. A psicologia é concebida como uma ciência e os
> seus conceitos e métodos precisam ser validados através do teste de
> hipóteses.
>

Você generaliza muito rapidamente: ele está falando de psicologia, e não de
ciências humanas. Se você quiser utilizar o exemplo para apoiar a dita
ideia, faça-o. Mas a ideia, conquanto tacitamente "apoiada", não está de
modo algum defendida nem justificada.


> Sinceramente, ao ler os argumentos de Vitor Hasse ou de Sidarta
> Ribeiro ou de Suzana Herculano-Houzel (pesquisadores da área de
> humanas) não vejo nenhum apoio para a exclusão do método científico.
> Inclusive, eles são altamente críticos das posturas que excluem o
> método científico como ferramenta de conhecimento e sugerem (como no
> parágrafo acima) que os métodos inferenciais podem conviver com outros
> métodos.
>

Sua resposta não é uma resposta, na medida em que você me contesta pelo que
eu não disse. Coloquei dois textos lado a lado: o meu e um excerto do
artigo de Vitor. Colocar textos lado a lado é um método científico, não no
sentido que Vitor propõe para o adjetivo neste texto. Esse método tem uma
tradição mais que centenária, e está relacionado com diversos
procedimentos: a crítica literária, o estruturalismo, *la pensée sauvage*,
a música concreta, o hip-hop, o remix, a montagem cinematográfica etc. Ele
prescinde inteiramente de estatística. Não é por isso que deixa de ser
científico. Reduzir o "científico" à ciência experimental no campo da
musicologia é mais uma demonstração do que chamei de infantilismo
científico. Ela merece e necessita, sim, de uma crítica ideológica. Quando
mais não seja porque sua caricatura prolifera na chamada "pesquisa em
música" hoje no Brasil.

Ambos os textos, lado a lado, o excerto do Vitor e o meu, tinham o objetivo
de indicar dois eventos muito diferentes, relacionando-os enquanto
associados ao problema da qualidade da pesquisa em música no Brasil. Esse
problema não é estatístico.

cp
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